por Fernando Duarte / BN
Com a sugestão de que deputados e senadores se “autoforniquem”, o general Augusto Heleno criou mais uma crise institucional entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional. Desnecessária, como tantas outras do atual governo. Porém essa teve um quê de ironia difícil de prever em qualquer roteiro de realismo fantástico. O ministro responsável pelo Gabinete de Segurança Institucional teve um áudio comprometedor vazado em uma transmissão ao vivo do Facebook do presidente Jair Bolsonaro. Praticamente uma piada pronta.
A crítica de Augusto Heleno muito provavelmente não é completamente despropositada. Há muito tempo sabe-se que, durante um período em que o Executivo está enfraquecido, o Legislativo se aproveita bem dessa fragilidade. Definitivamente esse é um desses momentos. Sem uma base aliada, Bolsonaro é refém dos presidentes da Câmara e do Senado, que tocam as esperadas reformas estruturantes. O custo disso é que existe um parlamentarismo extraoficial e totalmente dentro da legislação. Tal condição, no entanto, não autoriza quem quer que seja a tratar o parlamento como um espaço onde achaques são naturalizados - ainda que seja verdade.
Augusto Heleno se tornou, como falou Rodrigo Maia, um “radical ideológico contra a democracia”. Não foi o primeiro excesso do ministro e, possivelmente, não deve ser o último. Dos militares sitiados no Palácio do Planalto, ele é o mais próximo do presidente e, aparentemente, o que compartilha melhor os ideais de Bolsonaro. Tanto que os flertes com o autoritarismo, tão caro a muitos militares, são frequentes em declarações do general, enquanto outros oficiais de quatro estrelas se mantêm mais distantes dessa lógica antidemocrática.
Ao ser flagrado numa conversa pouco republicana, o ministro preferiu seguir a rota de colisão com o Congresso ao invés de minimizar o arroubo. Veio a público reclamar que houve “invasão de privacidade” e que, se é para haver parlamentarismo, “mudem a Constituição”. O tom dele pareceu bem natural, infelizmente. E diante da ausência de qualquer reprimenda de outros integrantes do governo federal, parece encontrar eco também fora desse círculo mais próximo ao presidente.
Cá entre nós, entre um Legislativo forte demais, porém inserido na democracia, e um Executivo que não beba em águas da democracia, não dá para ter muita dúvida qual caminho escolher, não é mesmo? Resta saber durante quanto tempo ainda seguiremos vendo nossa jovem democracia esmorecer com lampejos de quem deveria defendê-la.
Este texto integra o comentário desta quinta-feira (20) para a RBN Digital, veiculado às 7h e às 12h30, e para as rádios Irecê Líder FM, Clube FM, RB FM, Valença FM e Alternativa FM Nazaré.
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