por Reynaldo Turollo Jr. | Folhapress
Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que comanda o inquérito aberto pelo presidente da corte, Dias Toffoli, para apurar fake news e ameaças contra os integrantes do tribunal, respondeu às críticas de membros do Ministério Público à investigação.
“No direito, a gente fala que é o ‘jus sperniandi’, o direito de espernear. Podem espernear à vontade, podem criticar à vontade. Quem interpreta o regimento do Supremo é o Supremo. O regimento autoriza, o regimento foi recepcionado com força de lei e nós vamos prosseguir a investigação”, disse Moraes, na tarde desta terça-feira (19).
Moraes foi designado por Toffoli para presidir a investigação. O ministro disse que solicitou à Polícia Federal e à Polícia Civil de São Paulo um delegado de cada corporação para auxiliá-lo nas diligências que irá determinar, “principalmente [sobre] a questão dessa rede de robôs, de WhatsApp, Twitter, essa rede que alguém paga, alguém financia por algum motivo”.
“[O objetivo dessa rede] na verdade, é a desestabilização de uma instituição republicana. O que vem se pretendendo é desestabilizar o Supremo Tribunal Federal”, afirmou.
Antes de ingressar no STF, Moraes foi ministro da Justiça e secretário da Segurança Pública de São Paulo.
Ele afirmou que terá o auxílio dos setores de inteligência da Polícia Militar e da Polícia Civil paulistas, com os quais já teve duas reuniões, porque as corporações têm expertise em crimes cibernéticos e porque há suspeitas de que os maiores esquemas de financiamento de informações ofensivas ao Supremo estejam em São Paulo.
Segundo Moraes, uma vez encontrados suspeitos, os casos serão remetidos às instâncias responsáveis pelo julgamento, com a aplicação de eventuais punições. O STF só julga pessoas com prerrogativa de foro especial, como deputados, senadores e ministros de Estado.
O inquérito foi aberto por Toffoli de ofício (sem provocação de outro órgão) na última quinta-feira (14). O procedimento é incomum, mas, segundo o tribunal, há precedentes. Um precedente é um inquérito aberto no ano passado pela Segunda Turma, também de ofício, para apurar o uso de algemas na transferência do ex-governador Sergio Cabral (MDB-RJ) do Rio para o Paraná.
Conforme a portaria que abriu a atual investigação, assinada por Toffoli, a iniciativa se baseou no artigo 43 do regimento interno do STF, que diz que, “ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do Tribunal, o presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro ministro”.
Foi dada uma interpretação ao texto do regimento de que os ministros representam o próprio tribunal e, portanto, um ataque a eles é um ataque ao Supremo.
No dia seguinte ao anúncio do inquérito, que já vinha sendo alvo de questionamentos de procuradores nas redes sociais, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu a Moraes informações sobre o objeto da apuração e sugeriu que a corte extrapolou suas atribuições, porque o órgão que julga não pode ser o mesmo que investiga.
“A atuação do Poder Judiciário, consistente em instaurar inquérito de ofício e proceder à investigação, tem potencial de afetar sua necessária imparcialidade para decidir sobre a materialidade e a autoria das infrações que investigou, comprometendo requisitos básico do Estado Democrático de Direito”, disse Dodge.
Entre possíveis alvos do inquérito estão procuradores que teriam incentivado a população a se voltar contra decisões do Supremo —entre eles, dois membros da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol e Diogo Castor.
Aos jornalistas, nesta terça (19), Moraes disse que não poderia dar mais detalhes sobre o objeto da investigação porque ela é sigilosa. “As informações que posso dar no momento são administrativas: tanto a Polícia Federal vai designar um delegado, foi pedido hoje, e também pedi à Polícia Civil de São Paulo um delegado especializado na questão da internet”, informou.
“Vai ser possível verificar se são ataques esparsos [ou não]. Há ataques que pregam dar um tiro na cabeça de ministro do Supremo, ‘vamos à sessão para matar os ministros’. Veja, eu tenho suficientemente experiência na área, não são essas acusações covardes que acabam virando crime, mas é —e isso é comprovado tanto pela ciência médica como pela criminal— esse volume que acaba incentivando pessoas perturbadas a eventualmente falar ‘É isso mesmo’, e aí é uma facada, um tiro”, explicou.
“A gente não pode permitir, num país democrático, que, porque você não gosta de uma decisão, você prega o fechamento de uma instituição republicana, você prega a morte de ministros, de familiares. Isso extrapola a liberdade de expressão.”
O inquérito aberto de ofício por Toffoli também gerou críticas internas, entre colegas do STF. O ministro Marco Aurélio afirmou nesta terça que o presidente do tribunal deveria ter pedido ao Ministério Público Federal que abrisse a investigação.
O magistrado disse que, em sua opinião, mesmo agora que o inquérito está aberto esse deveria ser encaminhado à Procuradoria. Segundo Marco Aurélio, havia uma expectativa de que Toffoli levasse o caso ao plenário para deliberação dos ministros, o que não aconteceu.
“[No plenário] eu me posicionaria contra, porque, sempre quando me defronto com quadro que sinaliza prática delituosa, o que eu faço? Eu aciono o Estado acusador. E o Supremo não é o Estado acusador, é o Estado julgador. Não deliberamos nada, muito menos a designação do relator”, disse.
Para o ministro Marco Aurélio, há uma “desavença indesejável” entre o Supremo e o Ministério Público.
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