por Fernando Duarte
Um governo militar democraticamente eleito. Nem de longe isso é 1964, cujo marco de 55 anos do golpe foi neste 31 de março de 2019. Estamos falando do governo de Jair Bolsonaro, capitão reformado do Exército brasileiro e eleito em outubro do ano passado para a Presidência da República. Desde a reabertura democrática, esse é o primeiro governo com militares em papéis-chaves. Isso quer dizer que vivemos à sombra de uma nova ditadura? Todos queremos crer que não.
Como o poder central e algumas figuras do entorno não aparentam equilíbrio emocional suficiente, têm sido os militares que sinalizam algum tipo de estabilidade a um governo que, em 90 dias, criou crises sobre crises e provocou tensões políticas desnecessárias. A postura não é apenas dos subordinados a Bolsonaro. O mesmo acontece com o vice, Hamilton Mourão, cuja verborragia pré-eleitoral parece contida por um exercício bem feito de media training.
Existe um esforço hercúleo para manter o otimismo de que não haverá outro rompimento institucional no Palácio do Planalto. Sob o espectro da falta de governabilidade, o Congresso Nacional encontrou justificativas ideais para o impeachment de dois presidentes da República em menos de 30 anos. Bolsonaro, que esteve na Câmara dos Deputados por quase esse tempo, votou para afastar Fernando Collor e Dilma Rousseff e deve saber como funcionam os bastidores para que o morador da Alvorada seja deposto. Torcemos para que não venha a acontecer novamente e, por quatro anos, tenhamos um único governante no Brasil.
Agora, sob o prisma de um governo instável e cuja postura adequada está ancorada nos militares, é impossível não pensar nas chances de que o “militarismo” consiga reunir forças suficientes para se tornar efetivamente um ente menos abstrato e parte integrante da cena política brasileira. As consequências disso são difíceis de vislumbrar, mesmo que, em um curto prazo, se perceba um governo cada vez menos civil.
Enquanto Bolsonaro faz a cortina de fumaça em torno da “comemoração” do 31 de março, os medos de um período de exceção que durou 21 anos voltam à tona – e não apenas entre aqueles que viveram o horror dos anos de chumbo, mas também de quem reconhece que a história existe e que uma borracha não pode apagar crimes cometidos como um passe de mágica.
Neste momento, percebemos então um certo conflito. Parte daqueles que se assustam com um governo com muitos militares é obrigada a agradecer por esses mesmos detentores de patentes permitirem algum tipo de calmaria em um ambiente de eterna tempestade alimentada pelo presidente da República.
O dia 1º de abril de 1964 não pode voltar a acontecer jamais. Mesmo que, em devaneios absurdos, Bolsonaro acredite que o país nunca viveu uma ditadura. “Pai, afasta de mim esse cálice”.
Este texto integra o comentário desta segunda-feira (1º) para a RBN Digital, veiculado às 7h e às 12h30, e para as rádios Excelsior, Irecê Líder FM, Clube FM e RB FM.
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