por Italo Nogueira | Folhapress
Espécie de bandeira e mantra do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) em sua campanha, o "excludente de ilicitude" para policiais que matam supostos bandidos em confronto já existe na prática, segundo diferentes pesquisas feitas nos últimos anos no Brasil.
Especialistas apontam que a proposta do candidato do PSL não é uma solução, mas sim um problema já existente.
As circunstâncias das mortes provocadas por policiais são pouco investigadas e pouco têm fiscalização, apontam estudos.
Algumas associações policiais, contudo, apoiam a bandeira a fim de reduzir a insegurança jurídica que afirmam sentir em sua atuação.
O deputado Jair Bolsonaro propôs, no ano passado, um projeto de lei para deixar expresso nos códigos de processo Penal e Militar que policiais não podem ser presos em flagrante caso matem civis em supostos confrontos.
Segundo o texto apresentado à Câmara dos Deputados, caso haja indícios de que a morte causada pelo policial não ocorreu em legítima defesa, como alegado inicialmente, o caso será investigado "nas fases posteriores da persecução penal".
O Código Penal já prevê a legítima defesa e o cumprimento do dever legal como motivos para a exclusão da ilicitude de um homicídio, que deve ser avalizada pela Justiça.
Especialistas e policiais afirmam que prisões em flagrante nestas condições são raras no país. Pesquisas apontam também que a apuração posterior às mortes são praticamente inexistentes, fazendo valer na maioria dos casos a versão do policial envolvido no confronto, sem corroboração de perícia ou de testemunhas de fora da corporação.
Também são raros os casos em que a Justiça dá a palavra final sobre a morte provocada por um agente do Estado.
Pesquisa da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) apontou que, de 510 boletins de ocorrências sobre homicídios em decorrência da ação policial de 2005, apenas 19 foram levados à Justiça, sendo 16 pedidos de arquivamentos e três denúncias --casos em que se identificou irregularidades dos policiais.
"O que se verificou é que há uma completa falta de verificação das condições em que se deram essas mortes", afirmou o pesquisador Michel Misse, responsável pelo estudo da UFRJ.
Em São Paulo, estudo da Ufscar (Universidade Federal de São Carlos) apontou que 94% dos inquéritos abertos entre 2009 e 2011 sobre essas ocorrências foram concluídas sem indiciamento dos policiais.
"É muito ruim para a imagem das polícias não ter essa investigação, do ponto de vista da confiança da população", afirmou a socióloga Jacqueline Sinhoretto, que coordenou a pesquisa da Ufscar.
Desde 1996, mortes de civis provocadas por policiais devem ser investigadas pela Justiça comum, com inquérito conduzido pela Polícia Civil e acompanhamento do Ministério Público.
Caso se verifique que a conduta dos agentes foi correta, a Promotoria deve enviar o caso ao juiz competente sugerindo a absolvição sumária. Se for identificada irregularidade, a denúncia é feita para análise do Tribunal do Júri.
Contudo, o controle externo da polícia pelo Ministério Público é a atividade pior avaliada por membros do próprio órgão. Pesquisa do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania apontou que 42,4% dos promotores ou procuradores entrevistados avaliam como ruim ou péssima a execução dessa atividade, e 34,9%, como regular.
De acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 5.159 pessoas foram mortas por agentes de segurança no país. As polícias de Rio e São Paulo foram responsáveis por 40% desses casos.
Em diferentes discursos, Bolsonaro já afirmou que a atual legislação faz com que policiais se retraiam no confronto com bandidos, gerando mortes de agentes.
"O que falta ao policial militar é uma retaguarda jurídica para bem trabalhar. Muitos morrem porque não atiram, porque se atirar vão para a cadeia", afirmou.
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