Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP**Bacharel em direito
Inicialmente, gostaria de destacar que não acho que esses programas sejam geradores ou alimentem a violência. Essa linha de raciocínio generalizou-se, especialmente dentre aqueles que se julgam em nível superior a este tipo de programação. Nunca assistiram, mas sabem de tudo.
Ainda que criticáveis, programas policiais poderiam se utilizar de um formato menos apelativo, com maior interatividade e mais produtivo para a emissora e para a sociedade.
Como na televisão tudo é copiado, umas copiam tudo, outras plagiam algumas coisas e a maioria muda apenas a moldura, os programas possuem características comuns a todos e nem na guarnição se diferenciam.
Os apresentadores falam sempre em tom de provocação, com fisionomias de ira e palavras ofensivas aos “bandidos”. Não se atentam nem sequer que no momento do ato, por mais verídico que seja e indícios de autoria que possuam. Esses supostos “bandidos” ainda não se enquadram nesse conceito, condição que atingiriam quando da condenação.
Outro ponto controverso são os repórteres interpelando-os quando já estão sob a tutela do Estado, quando detidos em flagrante nas ruas, dentro das viaturas ou nas próprias delegacias. Não se discute a cobertura, a discussão é sobre o microfone enfiado, de forma virulenta e provocativa, na boca do “bandido”, com perguntas inquisitórias, próprias das autoridades policiais ou judiciais. E quando as respostas não lhes são agradáveis, os repórteres vociferam, com expressões de ódio e palavras ofensivas, como se tivessem esse direito ao prejulgamento.
Quando não agem assim, dos estúdios, os âncoras incentivam de forma acintosa e até com certo constrangimento os “seus” repórteres. Costumam repetir “meu” ou “nosso” repórter. Uns dizem: “vai meu filho”, outros, “chega lá” ou com outras expressões similares.
O inverso é proporcional e melancólico. Ao lado das eventuais vítimas pobres, os repórteres falam com voz empostada, sentimental, melodramática. Tratam sempre com expressões no diminutivo: as “roupinhas”, os “sapatinhos”, os “brinquedinhos”, as “comidinhas” ficaram aqui jogadas.
Outra prática recorrente são os apresentadores se voltarem contra as autoridades envolvidas exigindo explicações que não são possíveis naquele momento ou deixando-as por horas a fio com um microfone na boca, talvez de olho na subida da audiência. Talvez por receio a esses pontos ou para ter alguns minutos de fama, muitas autoridades, especialmente policiais, ficam lá no aguardo pelo tempo que a televisão necessitar.
Fica parecendo que as autoridades são funcionários exclusivos de determinado canal e não agente público. Tudo sob a batuta do direito da “sociedade” ser informada. Não se tocam que esse direito não pode interferir no direito dos agentes trabalharem tranquilos e adequadamente.
O autoritarismo e grosseria dos âncoras com relação aos colegas de trabalho fecham o ciclo das características específicas, em especial com os funcionários-técnicos. Sempre em tom áspero e de ordem seca, falam: “Sobe a tela, baixa a tela”; “abre-fecha-divide a tela”; “cadê o repórter tal”, “fala, meu filho”, “tô falando, meu filho”; “não atravessa, meu filho”. E, ainda, pedem aos repórteres para colocarem o microfone para falarem mal dos “bandidos” ao vivo. Quem e por que permitem esses abusos? E quem disse que eles têm esse direito?
É um festival de descompostura pública que, por conta da busca por mais telespectadores, nenhum diretor reprime ou exige uma conduta mais decente e respeitosa pelos ditadores dos microfones.
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