Luiz Flávio Gomes, jurista e diretor-presidente do Instituto Avante Brasil
Criado em 1940 na gestão do presidente Getúlio Vargas, o Código Penal brasileiro já foi alterado 156 vezes. O professor e jurista Luiz Flávio Gomes, diretor-presidente do Instituto Avante Brasil, realizou um levantamento de todas as mudanças já realizadas no texto principal em seus 75 anos de vigência. Os resultados serão publicados no livro "O Populismo Penal Legislativo", que deverá ser lançado em maio.
O objetivo do jurista com a obra é comprovar que apesar da grande quantidade de ajustes, o país não avançou no combate à criminalidade; na verdade, segundo ele, os índices só cresceram ainda mais.
"Dessas mudanças, 75% resultaram em leis mais duras e severas, e mesmo assim nenhum crime no Brasil diminuiu a médio ou longo prazo", diz Gomes. "Dos anos 80 para cá a criminalidade foi explodindo. Em 1980, segundo o Datasus [do Ministério da Saúde] havia 11 assassinatos para cada 100 mil brasileiros. Em 2012, já eram 29 para cada 100 mil. O índice triplicou."
No site da Presidência da República é possível ver a versão atual do Código, bem como vários trechos "riscados" que deixaram de valer, além de acréscimos nos anos seguintes.
Os trechos mais alterados, de acordo com Gomes, foram os chamados crimes patrimoniais, como furto, roubo e extorsão; e os crimes contra a vida, como homicídios. Os que sofreram menos mudanças foram os crimes cometidos por colarinho branco, que não tiveram endurecimento expressivo das penas.
Na visão do jurista, o fenômeno do Código Penal é explicado por uma vontade política de responder aos anseios imediatos da população, mas sem implementar mudanças mais profundas em outras esferas do combate ao crime.
"Desde a década de 80, a população se mostrou cada vez mais insegura e impotente, querendo a certeza do castigo. O legislador dá a resposta, aprovando novas leis, e com isso vai enganando a população. A mudança da lei não muda a realidade nem traz a certeza do castigo, pois a situação exige mais policiais, investigação e justiça. Tudo isso ainda é muito precário", defende.
Outro reflexo desse problema veio nos anos 90, quando os juízes passaram a endurecer a aplicação das leis.
"Aí nos temos o oportunismo judicial. A consequência foi a explosão carcerária. Em 1990, eram 90 mil, hoje são 711 mil detentos no país. O massacre do Carandiruocorreu em 1992, quando presos foram maltratados e a polícia causou as mortes deles. Aí veio o nascimento da facção criminosa PCC [Primeiro Comando da Capital], que nasceu para proteger os presos."
Daí em diante, os juízes endureceram a aplicação das leis, sendo um fator importante para a superlotação carcerária. "Isso encheu as cadeias com pessoas das classes econômicas mais pobres, mas hoje começam a prender os de classes mais altas, como ocorreu com os empreiteiros na Operação Lava Jato. A meu ver, crimes econômicos devem ser combatidos levando os culpados à falência, não precisamos prendê-los".
Para Gomes, a discussão na Câmara sobre a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos seria mais uma tentativa política de "tapar o sol com a peneira".
"Se for aprovada, teremos a mudança número 157 no Código Penal, mas vai acontecer com ela o que houve com as outras 156: não vai mudar nada. É um caminho equivocado", disse.
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