Nove em cada dez deputados estaduais e federais que disputam eleição este ano estão em campanha sem ter se licenciado do mandato. No total, são 258 políticos que concorrem aos cargos de prefeito ou vice — 87 da Câmara dos Deputados e 179 das Assembleias Legislativas —, sem abandonar o contracheque parlamentar. O grupo representa 88% do total de deputados que estão em campanha eleitoral. Ou seja, apenas 37 se afastaram das tarefas legislativas para tentar cargo no Executivo. Embora a lei permita a parlamentares fazer campanha no exercício do mandato, levantamento do GLOBO constatou que a legalidade tem sido usada em muitos casos para mascarar condutas condenáveis.
Foi constatado, país afora, que parlamentares cumprem agenda de candidato nos horários em que deveriam estar trabalhando no Legislativo, já que não pediram afastamento. A prática é criticada por analistas políticos e até por colegas fora da campanha.
No Piauí, por exemplo, deputados faziam corpo a corpo com eleitores ou davam entrevistas como candidatos na hora da sessão plenária na Assembleia Legislativa. No Amazonas, um deputado pedia votos a mais de 600 quilômetros do Legislativo enquanto uma das sessões acontecia. Em São Paulo, um deputado fez visita a um bairro da cidade onde é candidato e faltou à única reunião semanal da Comissão de Educação, da qual é membro.
A principal razão para o baixo número de licenças durante o período eleitoral — somente 12% solicitaram afastamento até agora — é salarial. As regras variam de estado para estado. No geral, o afastamento não é remunerado pelas assembleias; portanto, afastar-se da cadeira de parlamentar para disputar uma prefeitura significa, no caso dos deputados estaduais, cerca de R$ 20 mil a menos no contracheque.
Menos trabalho, mesmo salário
Muitas assembleias encontraram soluções caseiras para permitir ao deputado fazer campanha mesmo no exercício do mandato. Uma delas é a redução dos dias de trabalho durante a eleição, mas sem cortes no contracheque. O Senado, onde cinco dos 81 parlamentares são candidatos, instituiu o expediente da “semana do esforço concentrado”. Fora desse período, os senadores ficam liberados para atuarem nas eleições.
Em Rondônia, os deputados estaduais decidiram cortar uma das três sessões semanais do plenário. Desde agosto, os parlamentares não precisam aparecer na Casa às quintas-feiras. Em Sergipe, a mesma proposta está sendo discutida. No Paraná, os deputados aprovaram na semana passada uma espécie de recesso branco para a primeira semana de setembro, quando se dedicarão à campanha eleitoral. Em Santa Catarina, há sessões no Legislativo uma semana por mês, em agosto e setembro. Os deputados dizem que anteciparam o trabalho do segundo semestre no primeiro para dar mais tempo para se dedicarem às candidaturas.
Santa Catarina, Paraná e Sergipe estão entre as 18 Assembleias Legislativas do país onde 100% dos deputados candidatos estão fazendo campanha no cargo. Um em cada cinco deputados eleitos em 2010 concorre nesta eleição.
Em Pernambuco, missões autorizadas
Já Pernambuco encontrou uma saída para evitar que as faltas reduzam o salário dos deputados. Trata-se da “missão autorizada”, nome dado para atribuições legislativas que justificam a ausência do parlamentar em plenário, normalmente para marcar presença em eventos oficiais. Exame na lista de frequência em agosto mostrou que foram 296 ausências com essa justificativa nos primeiros 28 dias do mês. Apesar da efervescência da campanha, não foi registrada falta por motivo eleitoral.
No maior legislativo estadual do país, São Paulo, não houve uma decisão institucional para proporcionar aos deputados mais tempo para a campanha. Ela acontece de maneira velada. Em agosto, das 14 sessões ordinárias realizadas por lá, mais da metade (8) foi encerrada antes do término do que os legisladores chamam de grande expediente — quando começam, de fato, discussões de projetos e votações. Cinco delas duraram apenas uma hora, e os deputados presentes foram liberados.
Em minas, média de 70% de faltas
Em Minas Gerais, os 15 deputados candidatos faltaram, em média, a sete de cada dez sessões ordinárias em julho e agosto. Apesar de o regimento da Casa prever o pagamento do salário proporcional ao comparecimento às sessões e à participação nas votações, nenhum parlamentar sofreu desconto.
— Infelizmente, a visão da maioria dos parlamentares é carreirista e de pouco espírito público no Brasil. Pedir licença nesses casos seria uma questão de bom senso para deixar as coisas claras. O exercício do mandato e uma candidatura têm naturezas muito distintas — disse o diretor do Instituto Ágora em Defesa do Eleitor e da Democracia, Gilberto de Palma.
A dificuldade para conciliar as agendas de deputado e candidato, sem prejuízo de uma delas, é a principal justificativa de quem opta por se afastar do mandato temporariamente.
— No meu caso, se mostraram atividades incompatíveis. Se você quer ganhar a eleição, tem que fazer uma agenda extensa de compromissos, tem campanha o dia inteiro. Não acho certo ir na hora do almoço assinar o ponto na Assembleia e sair para fazer campanha — disse o deputado estadual licenciado Donisete Braga (PT), candidato a prefeito em Mauá (SP).
O deputado estadual em Minas Gerais Paulo Guedes (PT), que disputa a prefeitura de Montes Claros, discorda:
— Dá para conciliar as duas atividades. Tenho ido a Belo Horizonte nas terças e quartas-feiras. É lógico que fica um pouco prejudicado o trabalho na Assembleia em todas as eleições. Mas a gente conta com apoio da equipe do gabinete e se concentra no mais importante — afirma Guedes.
Em Mauá (SP), João Paulo Rillo (PT), que disputa a prefeitura, optou por corpo a corpo com eleitores a ir em sessões de plenário e reuniões da Comissão de Educação. O coordenador da campanha, Carlos Aparecido da Silva, negou que ele tenha feito eventos no horário de trabalho. Mas fotos publicadas no site dele mostram o deputado em caminhada pelo bairro Cidadania, às 16h30m, no dia 15. Ele só pediu licença terça-feira passada.
Em Mato Grosso, o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral denunciou ao Ministério Público casos suspeitos de candidatos que estariam usando servidores de seus gabinetes para trabalhar na campanha. Seis dos 24 deputados estaduais disputam o pleito municipal este ano. De http://oglobo.globo.com/
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