Há certos consensos nas sociedades que nunca se sabe se são apenas firmados no imaginário popular ou se eles existem de fato.
No Brasil, há anos todos aceitam que as grandes empreiteiras são as únicas capazes de realizar as grandes obras estatais e um saco sem fundo do dinheiro público. Era meio subentendido e camuflado. Elas bancam as campanhas eleitorais mais interessantes e recebem o pagamento com obras.
Com a deflagração da Operação Lava Jato da Polícia Federal, uma entidade com letra maiúscula, como deveriam ser todas, essa condição se escancarou. Tanto é assim, que alguns envolvidos confirmam pagamento de propinas, sempre na condição de coitados, vítimas desse sistema de gestão pública inteiramente corrompida.
Tanto que o advogado Mário de Oliveira Filho afirmou que, se não houver algum “acerto”, não se coloca um paralelepípedo em qualquer cidade brasileira. Neste contexto a palavra acerto faz parte do conceito abstrato de que falei no início. Cada um que dê o significado do acerto de que falou o advogado.
A ilicitude é tão parte da gestão pública que os agentes públicos que deveriam se empenhar na punição passaram a ser ferrenhos defensores das empreiteiras. O argumento absurdo e descabido é que o Brasil para, se os corruptores ou corrompidos forem punidos, nos termos da legislação que regem o processo licitatório brasileiro.
A revista Veja desta semana traz declaração do presidente do Tribunal de Contas da União de que avisou várias vezes ao Planalto, portanto, ao governo federal, e que ele é favorável a que os responsáveis sejam punidos, mas não que as empresa sejam declaradas inidôneas. Só faltava ele dizer que não era favorável à punição de culpados!
A pergunta parece ter sido mal formulada, talvez para embutir uma resposta duvidosa. Perguntaram se as empresas deveriam ser declaradas inidôneas imediatamente. Ora, não consigo vislumbrar na lei nenhuma menção à declaração de inidoneidade sem direito à defesa e, se houvesse, seria inconstitucional.
Chocante mesmo foi a declaração de que as grandes empreiteiras não podem parar de trabalhar. Essa defesa poderia vir de qualquer outro setor, jamais do presidente do órgão fiscalizador. Se comprovada a corrupção não resta outra saída à administração pública a não ser a declaração de inidoneidade. E essa medida não é ato de vontade do ente público. É ato vinculado, obrigatório. Também comete ilicitude quem declina da obrigação de praticar determinado ato.
Segunda a mesma revista, o procurador-geral da República estaria trabalhando para que as empreiteiras “encampem a tese de cartel e livrem o governo de qualquer participação”... Talvez o mundo do direito desconheça essa atribuição do procurador-geral, tanto de orientador de grandes empreiteiras, quanto de defensor prévio de qualquer governo. Ou essa notícia está mal colocada ou merece melhor esclarecimento desse papel pela Procuradoria Geral da República.
Pedro Cardoso da Costa – Interlagos/SP
Bacharel em direito
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