Há exatos quatro anos, o estudante paulista Rubens Lima foi surpreendido com a ligação de um desconhecido. "Do nada, e de repente, me ligou uma pessoa que se identificou como sendo um assessor de projetos internacionais do governo. Durante o contato, ele disse que eu tinha ganhado uma bolsa de estudos na Espanha por ter tido uma das maiores notas no Enem [Exame Nacional do Ensino Médio]", lembra ele. O contato foi feito na mesma semana que o estudante - que na época tinha 18 anos - começara as aulas no curso de Engenharia Química em uma faculdade particular de São Paulo. Ele havia sido selecionado como bolsista do Programa Universidade para Todos (ProUni). Mas depois da tal ligação misteriosa, seus planos mudaram por completo. Lima fez parte do primeiro grupo de alunos que foram convocados, de forma sigilosa, para participarem de um projeto piloto do Ministério da Educação (MEC), o ProUni Internacional. A iniciativa, pioneira no País, banca todo o ciclo de quatro anos de estudos de graduação no exterior. Lá fora, os alunos selecionados ganham bolsas integrais para estudarem na Universidade de Salamanca, uma das mais antigas e prestigiadas da Espanha. O programa Ciência sem Fronteiras (CsF) - outra iniciativa do MEC, que vem apresentando uma série de problemas em sua condução -, banca geralmente apenas um ano de bolsa em universidades do exterior. Além dessa primeira chamada - feita em 2010 e que contou com a participação de Lima e de outros nove estudantes -, outras três seleções foram realizadas pelo governo nos anos subsequentes. Nenhuma das convocações contou com a abertura de edital público de seleção. Todo o contato foi feito diretamente com os estudantes que tiveram as melhores pontuações no Enem. Ademais de ter uma boa nota no exame, todos os alunos contatados pelo governo deveriam ser estudantes de baixa renda e terem se inscrito no ProUni regular - o programa de bolsas de estudo nas instituições particulares. Assim, tendo em mãos a lista dos alunos com maior nota no Enem, foram selecionados para o "programa secreto" do MEC aqueles que tinham recém ingressado em alguma instituição particular pelo ProUni em cursos considerados como estratégicos pelo governo. Na primeira turma, por exemplo, fazem parte alunos das áreas de Engenharia Química e Matemática. Nos demais grupos, foram selecionados estudantes dos cursos de Estatística e Física, por exemplo. Também há alunos de Comunicação Social e Educação entre os selecionados do ProUni Internacional. Depois de quatro anos de criação, o programa do MEC deu um novo passo. O ProUni Internacional saiu do anonimato e resolveu se abrir para o público em geral. A expectativa é que, até 2018, sejam oferecidas 80 vagas. O quantitativo é o dobro do que foi ofertado até então, quando foram selecionados 10 candidatos por ano, entre os anos de 2010 e 2013. A abertura coincide com a formatura da primeira turma - eles viajaram em 2010 e acabaram o curso agora no último semestre. Dos 10 selecionados, três desistiram do programa, o restante conseguiu chegar até o último ano. Rubens Lima foi um dos que participaram da cerimônia de formatura. "Minha família está muito feliz e bastante orgulhosa de mim, formar-se em engenharia em uma universidade já é um orgulho, e quando o curso é feito no exterior, com tudo pago, a comemoração é ainda maior", diz. Agora, com a abertura do novo ciclo do programa, que vai oferecer mais 80 vagas até 2018, as regras são diferentes. Para ganhar uma bolsa, o candidato não precisa estar vinculado ao ProUni. Ele necessita, no entanto, atender aos requisitos solicitados pelo programa. O candidato ao ProUni Internacional deve ter cursado o ensino médio em escola pública ou ter sido bolsista em instituição privada e ter uma renda familiar mensal per capita que não exceda o valor de até um salário-mínimo e meio. É preciso, também, ter uma nota mínima de 600 pontos no Enem e não ser portador de diploma de curso superior. Os professores da rede pública de ensino, interessados nos cursos de licenciatura e pedagogia, também podem participar do ProUni Internacional. A vantagem que esse público têm é que, nesse caso, podem participar quaisquer que sejam os candidatos, independente da renda que recebem. Como a convocatória de 2014 já foi encerrada, a próxima seleção deve se aberta no início de 2015. Para acompanhar a nova abertura da convocatória e se inscrever, o aluno deve acompanhar o site da Fundação Capes - a agência de fomento do MEC - na internet. O paraibano Paulo Filipe Vasconcelos, de 22 anos, foi um dos selecionados na primeira chamada pública aberta ao público neste ano. Natural de Campina Grande, Vasconcelos já viajou para a Espanha no final do primeiro semestre. Lá, teve que fazer o vestibular espanhol e aprender o idioma antes de começar o curso de Filosofia em Salamanca, previsto para iniciar em setembro. "Faço parte de um tipo de aluno que, mesmo sendo de baixa renda, sempre luta muito para melhorar de vida por meio dos estudos. Durante toda minha trajetória escolar, sempre consegui bolsas de estudos em escolas particulares", fala Vasconcelos. Mesmo participando do primeiro processo que contou com um edital público, o estudante acredita que essa primeira edição aberta do ProUni Internacional foi pouco divulgada. A apresentação de candidaturas ocorreu em março e o resultado dos selecionados saiu em abril. “Descobri apenas no último dia, acabei me inscrevendo de última hora. Mas foi difícil convencer a minha mãe, já que ela pensava que se tratava de tráfico de pessoas, de tão bom que o programa é", diz Vasconcelos. A brincadeira que o estudante faz com o receio da mãe têm razão de ser. Ao elogiar o programa, Vasconcelos cita as vantagens às quais os candidatos ao ProUni Internacional têm ao serem selecionados. "Para os primeiros 12 meses, a Capes paga uma bolsa mensal de 870 euros [mais de R$ 2,5 mil], o que dá para viver muito bem. Depois, o Santander dá um auxílio mensal de 730 euros [mais de 2 mil reais]", comenta Filipe. Ele também diz que os cursos de língua e de cultura são ofertados de forma gratuita antes do início do curso na universidade. As passagens aéreas também são bancadas pelo programa, além de seguro saúde e auxílio instalação, no valor de mais de R$ 4 mil. Além disso, os estudantes têm direito a uma viagem por ano ao Brasil, nos período de férias escolares da Universidade de Salamanca. Da vida boa que agora tem na Europa, Vasconcelos sente falta apenas de um determinado item que não foi contemplado pela bolsa. "O cuscuz! O daqui é diferente, é meio branco. Prefiro o de lá [do Nordeste]", brinca o aluno. Consultada, a Capes informou que, por enquanto, não há perspectiva para a extensão do programa ProUni Internacional para outros países. Sobre o sigilo no processo de seleção dos primeiros grupos, o Governo Federal informa, por meio do Ministério da Educação, que "de 2010 a 2013, o MEC realizou a seleção desses estudantes do ProUni Internacional, com base na classificação deles no Enem e levando em conta os critérios de seleção do ProUni [regular]. A partir de 2014, a seleção continuou obedecendo aos mesmos critérios, mas passou a ser feita via Capes".
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