Doenças gastrointestinais custam R$ 140 milhões anuais ao SUS

Augusto Pio - Estado de Minas

O Brasil registra quase 400 mil internações por diarreia todo ano, sendo 35% são crianças menores de 5 anos, segundo dados do Ministério da Saúde do ano passado. Cerca de 14% das internações (54.339 pessoas) ocorreram nas 100 cidades avaliadas na pesquisa “Ranking do saneamento 2012”, feita pelo Instituto Trata Brasil, que verificou o abastecimento de água, lançamento e tratamento de esgoto e acesso à água potável dos municípios com base nos dados oficiais do governo brasileiro divulgados pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento 2010 (Snis). No mundo, são aproximadamente 4,6 bilhões de casos de diarreia por ano. O estudo, compilado em 2012, contemplou os 100 maiores municípios brasileiros em população, no período de 2008 a 2011.

Os gastos do Sistema Único de Saúde (SUS) com as doenças gastrointestinais mostram o porquê de se acender um alerta para a questão: além de um número elevado de pessoas doentes, os custos com o tratamento das doenças chegam à casa dos R$ 140 milhões anualmente. E não é só isso: por ano, 217 mil trabalhadores precisam se afastar de suas atividades devido a problemas gastrointestinais. A cada afastamento perdem-se 17 horas de trabalho. Considerando o valor médio da hora de trabalho no país, de R$ 5,70, e apenas os afastamentos provocados pela falta de saneamento básico, os custos chegam a R$ 238 milhões por ano em horas-pagas e não trabalhadas.

No período analisado, as 10 cidades com o maior número de internações por diarreia foram Ananindeua (PA), Belford Roxo (RJ), Anápolis (GO), Belém (PA), Várzea Grande (MT), Vitória da Conquista (BA), Campina Grande (PB), Santarém (PA), João Pessoa (PB) e Maceió (AL). Entre as que apresentaram os melhores índices estão duas mineiras, Montes Claros e Betim; Taubaté, Praia Grande, São Bernardo do Campo, Bauru, Suzano e Campinas, no interior paulista; Rio de Janeiro (RJ); e Caxias do Sul (RS). Montes Claros e Betim ocuparam, respectivamente, o 9º e o 10º lugares, com média de 17,2 e 19,6 internações para cada 100 mil habitantes, respectivamente. Belo Horizonte tem média de 42,5 internações para cada 100 mil habitantes e foi classificada em 54º lugar no ranking da taxa de internação hospitalar por diarreia.

“Os resultados reforçam que as crianças são mesmo a parcela mais vulnerável quando a cidade não avança em saneamento básico, sofrendo com as diarreias”, ressalta Édison Carlos, presidente executivo do Instituto Trata Brasil, organização da sociedade civil de interesse público, cujo objetivo é coordenar uma ampla mobilização nacional para que o país possa atingir a universalização do acesso à coleta e ao tratamento de esgoto. A Organização Mundial da Saúde (OMS) destaca que 88% das mortes por diarreia no mundo são causadas pelo saneamento inadequado, sendo a maioria de crianças. Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a diarreia é a segunda maior causa de mortes em crianças menores de 5 anos.

De acordo com a pediatra, especialista em imunização e professora do Departamento Materno-Infantil da Universidade Federal de Juiz de Fora Elisabeth Campos Andrade, as causas de uma diarreia podem ser infecciosas e não infecciosas. “Entre as infecciosas temos as de origem viral, por exemplo, por rotavírus, adenovírus, enterovírus, e as bacterianas, que podem ser causadas por Escherichia coli, Salmonella e Shigella. Alguns parasitas do trato gastrointestinal, como giardia e ameba também podem causar diarreia”, diz.

Higiene básica

O principal cuidado que o paciente num quadro de diarreia deve ter é com a hidratação via oral. “É ideal manter também uma alimentação apropriada para cada idade. Nos lactentes, é importante aumentar a frequência do aleitamento materno ou da mamadeira – fórmulas especiais não são necessárias. Para crianças maiores e adultos, são recomendadas refeições frequentes e leves distribuídas ao longo do dia”, acrescenta Elisabeth. A médica explica que a prevenção das diarreias deve ser feita por meio do adequado saneamento básico e da higiene pessoal, principalmente com a lavagem das mãos antes do preparo dos alimentos, uso de água tratada para cozer a comida, além de destinar adequadamente os resíduos.

“Consideramos diarreia a alteração repentina do hábito intestinal, com a ocorrência de três ou mais evacuações com fezes de consistência amolecida ou aquosa dentro de 24 horas. Dividimos em diarreia aguda, cuja duração é menor que 14 dias; e diarreia persistente, aquela com duração maior que 14 dias.” O clínico geral Breno Figueiredo Gomes explica que a diarreia não é uma doença e sim um sintoma comum a várias doenças.

“Outra classificação seria a diarreia invasiva ou disenteria (caracterizada por sangue nas fezes) e a osmótica (basicamente aquosa)”, acrescenta Gomes, ressaltando que a principal causa da diarreia é a contaminação da água e dos alimentos. “Aproximadamente 2,4 bilhões de pessoas não têm saneamento básico. A diarreia está entre as cinco maiores causas de morte no mundo. Ela pode evoluir para choque séptico, insuficiência renal, artrite e síndromes neurológicas. Caso não seja controlada com medidas relativamente simples, pode levar a pessoa à morte”, alerta. Em média, uma pessoa pode ter um caso de disenteriaao ano.

Reidratação

O tratamento das doenças gastrointestinais se dá por hidratação oral ou venosa. “Em alguns poucos casos pode ser necessário o uso de antibióticos. Felizmente, as diarreias agudas, na sua imensa maioria, são autolimitadas, ou seja, curam-se sozinhas apenas com a reidratação adequada com água ou até mesmo soro caseiro. Geralmente, elas são de curta duração (no máximo cinco dias, em média três)”, acrescenta Gomes.