A ex-gerente da Petrobras Venina Velosa da Fonseca diz que informou
pessoalmente à presidente da empresa, Graça Foster, sobre
irregularidades em contratos de diversos setores da companhia. Em
entrevista exclusiva ao Fantástico, exibida na noite desde domingo (21),
Venina contou que “percebeu que havia irregularidades” em 2008 e que,
desde então, reportou problemas aos superiores, entre eles o
gerente-executivo, diretores e a atual presidente. A documentação com as
denúncias da gerente, que está afastada, foi entregue ao Ministério
Público, que investiga o escândalo de corrupção na Petrobras e que
resultou na Operação Lava Jato. A ex-gerente diz que "vai
até o fim" nas denúncias e afirma que outros funcionários da empresa
possuem conhecimento das irregularidades. Ela fez um apelo para que os
colegas sigam seu exemplo e também denunciem o que sabem sobre o esquema
de corrupção na estatal. Venina relata que as
irregularidades na área de comunicação eram de conhecimento da então
diretoria e que pagamentos por serviços não-prestados, contratos
aparentemente superfaturados e negociações em que eram solicitadas
comissões para as pessoas envolvidas eram formas de realizar o desvio. Segundo Venina, havia o "esquartejamento" de projetos para dificultar a fiscalização.
'Estive com Graça Foster'
"Num
primeiro momento, em 2008, como gerente-executiva, eu informei ao então
diretor Paulo Roberto Costa, informei a outros diretores como a Graça
Foster, e em outro momento, como gerente-geral, eu informei aos meus
gerentes-executivos, José Raimundo Brandão Pereira e o Abílio [Paulo
Pinheiro Ramos], que era meu atual gerente-executivo. Informei ao
diretor [José Carlos] Cosenza (...) Informei ao presidente [José Sérgio]
Gabrielli. Informei a todas a pessoas que eu achava que podiam fazer
alguma coisa para combater aquele processo que estava se instalando
dentro da empresa", afirmou. Na época, Graça Foster, atual presidente da
companhia, era diretora de gás e energia. Ela assumiu o atual cargo em
fevereiro de 2012. "Eu estive com a presidente [Graça Foster]
pessoalmente quando ela era diretora de Gás e Energia. Naquele momento,
nós discutimos o assunto. Foi passado uma documentação pra ela sobre
processo de denúncia na area de comunicação. Depois disso, a gente (...)
Ela teve acesso a essas irregularidades nas reuniões da
diretoria-executiva. ", declarou Venina Velosa. Paulo Roberto Costa, que
chefiou a diretoria de Abastecimento de 2004 a 2012, assinou um acordo
de delação premiada para contar o que sabe em troca de uma possível
redução de pena. Atualmente, cumpre prisão domiciliar.
Encontro com Paulo Roberto Costa
Venina
lembra que, ao relatar o problema ao atual delator do esquema, Paulo
Roberto Costa, foi acusada de “querer derrubar o governo”. “Esse evento
aconteceu quando eu fui apresentar o problema que ocorreu na área de
comunicação, que eu cheguei na sala dele e falei, olha aqui tem só
amostra do que tá acontecendo na área. Eram vários contratos de pequenos
serviços onde nos não tínhamos conhecimento do tipo de serviço. Mas
mostrava esquartejamento do contrato. Aí naquele momento, eu falei: eu
nunca soube, tô sabendo isso agora e acho que é muito sério e temos que
tomar atitude. Aí ele pediu que eu procurasse gerente responsável e
pedisse pra que ele parasse”, relembra ela. “Ai eu falei: ele já fez,
não tem como eu chegar agora e falar vamos esquecer o que aconteceu e
vamos trabalhar diferente. Existe um fato concreto que tinha que ser
apurado e investigado. Ai nesse momento ele ficou muito irritado. A
gente tava sentado na mesa da sala dele, ele apontou pro retrato do
Lula, apontou pra direção da sala do Gabrielli e perguntou: você quer
derrubar todo mundo? Ai eu fiquei assustada e disse: olha eu tenho duas
filhas, eu tenho que colocar cabeça na cama e dormir e no outro dia eu
tenho que olhar nos olhos dela e não sentir vergonha”.
Favorecimento do ex-marido
Venina
rebateu uma denúncia de que teria beneficiado o ex-marido com um
contrato feito na empresa. Ela relata que os contratos do ex-marido com a
estatal eram de 2004 e de 2006 e que a condição que apresentou para
assumir o relacionamento, em 2007, foi que o contrato fosse
descontinuado. "Foi anterior ao casamento e, no momento
que a gente assumiu a relação, a condição foi: vamos interromper porque
tem condições de ética dentro da Petrobras e minha que eu não posso
continuar. E isso foi com parecer jurídico", afirma.
Convocação a demais funcionários
Venina
lembra que, durante todo o processo da comunicação das irregularidades,
foi assediada" e “pressionada” por assistentes da diretoria e da
presidência que falavam: "tem muita gente envolvida, você não pode
tratar essa questão dessa forma”. Em seguida, recebeu ameaças por
telefone. Ela também nega ter participado de “esquemas” na estatal. “Eu
vou até o fim, sim. Eu não posso falar que eu não tenho, porque no
momento que você denuncia, ao invés de você ver respostas pras
denúncias, você vê simplesmente a empresa tentando o tempo todo falar:
você não é competente, você fez um monte de coisa errada, o tempo todo
as pessoas tendo que responder, mostrando documentos, que aquilo não é
verdade. É uma máquina que passa por cima da gente”, diz. Venina convoca
também os funcionários da Petrobras a terem a mesma atitude. “Eu tenho
medo? Eu tenho. Mas eu não vou parar. Eu espero que os empregados da
Petrobras, porque eu tenho certeza que não foi só eu que presenciei, eu
espero que os empregados da Petrobras criem coragem e comecem a reagir.
Nós temos que fazer isso para poder realmente fazer a nossa empresa ser
de volta o que era. A gente tem que ter orgulho, os brasileiros têm que
sentir orgulho dessa empresa. Eu vou até o fim e estou convidando vocês
pra virem também”.
Petrobras diz que tomou todas as providências
A
Petrobras voltou a declarar que tomou todas as providências para
elucidar os fatos citados por Venina Velosa da Fonseca. Segundo a
empresa, não procede a afirmação de que não houve apuração sobre as
irregularidades apontadas por Venina porque todas foram encaminhadas às
autoridades competentes. A Petrobras também repetiu que, possivelmente, a
funcionária trouxe a público as denúncias porque foi responsabilizada
por uma comissão interna. A empresa reafirmou que Graça Foster e José
Carlos Cosenza não sabiam de irregularidades e que a presidente da
Petrobras só foi informada dessas irregularidades, por Venina da
Fonsenca, no dia 20 do mês passado. O ex-presidente da Petrobras, Sergio
Gabrielli, afirmou que nunca foi informado diretamente por Venina da
Fonseca sobre a existência de corrupção na empresa.
A defesa de Paulo
Roberto Costa declarou que praticamente todos os aspectos investigados
pelo Ministério Público Federal foram mencionados na delação premiada do
ex-diretor e que não há como comentar incidentes específicos. O
ex-presidente Lula não quis se pronunciar. E os demais citados na
reportagem não foram encontrados. E em entrevista publicada neste
domingo por jornais da América Latina, a presidente Dilma Rousseff afirmou que o Brasil não vive crise de corrupção.
Entenda as denúncias de Venina
Há nove dias, uma reportagem do jornal "Valor Econômico" mostrou
que a ex-gerente alertou diversas vezes sobre a ocorrência de
irregularidades em contratos da Petrobras antes mesmo de a Polícia
Federal (PF) deflagrar em março a Operação Lava Jato. Antiga subordinada
do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, ela foi transferida
para a Ásia após denunciar o esquema de corrupção e, posteriormente, foi
afastada. O jornal relatou que, apesar das advertências,
a direção da empresa não agiu para conter os desvios bilionários e
ainda destituiu de seus cargos os executivos que tentaram barrar o
esquema de corrupção. A Petrobras afirmou, na terça-feira (16), que a ex-gerente só enviou em novembro deste ano,
à presidente da estatal, Maria das Graças Foster, e-mail alertando
sobre irregularidades na refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, e nas
áreas de Comunicação do Abastecimento e à área de comercialização de
combustível de navio (bunker). "Os temas
supracitados foram apenas levados ao conhecimento da Presidente através
de email recente, de 20/11/2014, quando a empregada já havia sido
destituída de sua função gerencial. Nesta data, as irregularidades na
Comunicação do Abastecimento e na RNEST já haviam sido objeto de
averiguação em Comissões Internas de Apuração, bem como as
irregularidades da área de comercialização de combustível de navio
(bunker) em Grupos de Trabalho", diz a Petrobras em nota. Ainda
segundo a estatal, Graça Foster respondeu a Venina no dia seguinte,
"informando que estava encaminhando o assunto ao Diretor José Carlos
Cosenza e ao Jurídico da Petrobras para averiguação e adoção das medidas
cabíveis".
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