Um grupo de trabalho da ONU criticou nesta quinta-feira o "uso excessivo da privação de liberdade" como punição a crimes no Brasil e deficiências na assistência jurídica a presos pobres no país.
As críticas constam de texto divulgado ao fim de uma visita de dez dias do grupo pelo país, a convite do governo brasileiro. No documento, a equipe se disse “seriamente preocupada” com o uso da privação de liberdade no Brasil.
O governo brasileiro não se pronunciou sobre as críticas.
"O Brasil tem uma das maiores populações de prisioneiros do mundo, com mais de 550 mil pessoas na prisão. O que é mais preocupante é que cerca de 217 mil detidos aguardam julgamento em prisão preventiva."
Segundo os peritos, prender acusados ou condenados por crimes é a punição mais usada no país, embora o Brasil seja signatário de acordos internacionais que fornecem proteção contra a privação arbitrária de liberdade.
O grupo elogiou as alterações no Código de Processo Penal em 2011, que tratam a prisão preventiva como o último recurso aos que cometeram crimes com pena de prisão inferior a quatro anos.
Os especialistas consideraram positivas, ainda, mudanças na Lei de Execução Penal que reduzem sentenças de prisioneiros que busquem educação.
No entanto, a equipe observou uma "tendência preocupante" de que a privação de liberdade está sendo usada como primeiro recurso, em vez de último. O grupo alertou ainda para o aumento de 33% na proporção de indígenas presos em relação à população carcerária geral nos últimos anos.
“O grupo de trabalho também foi informado que as pessoas indígenas foram muitas vezes discriminadas tanto em relação a medidas preventivas aplicadas quanto em relação à punição imposta, o que muitas vezes envolveu uma prisão dura.”
A equipe, que visitou centros de detenção em Brasília, Campo Grande, Fortaleza, Rio de Janeiro e São Paulo, diz ter encontrado pessoas presas em razão de infrações leves, que deveriam ter sido punidas com medidas alternativas.
Os especialistas condenaram ainda as dificuldades para que brasileiros pobres tenham assistência jurídica. Segundo o grupo, boa parte da população carcerária no país não tem condições de pagar advogados, dependendo de defensores públicos.
No entanto, o documento diz que o número de defensores no país é inadequado. Há inclusive Estados – como Santa Catarina, Paraná e Goiás – onde não há nenhum defensor público.
“A sobrecarga de trabalho dos defensores públicos também é um problema crítico”, afirma o grupo, que cita casos em que profissionais lidam com até 800 casos ao mesmo tempo.
“Mesmo em Estados onde há um sistema de defensoria pública, muitas vezes as áreas rurais ou do interior não têm defensores públicos atendendo as pessoas em detenção.”
O longo período que antecede o julgamento de acusados no Brasil foi outro problema apontado pelos especialistas, que citam casos de presos que esperam por julgamento há anos.
A equipe da ONU expressou ainda preocupações com prisões de dependentes de drogas. “O grupo de trabalho está seriamente preocupado com a informação de que estas medidas também são fortemente aplicadas devido a futuros grandes eventos, como a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 que o Brasil sediará”.
Na visita, a delegação se reuniu com as autoridades do Executivo, Legislativo e Judiciário nas esferas federal e estadual e com organizações da sociedade civil.
O grupo, integrado pelo chileno Roberto Garretón e pelo ucraniano Vladimir Tochilovsky, foi acompanhado por equipe do Escritório da ONU do Alto Comissariado para os Direitos Humanos em Genebra.
A visita gerará um relatório, a ser apresentado ao Conselho de Direitos Humanos da ONU em 2014.
Contatado pela BBC Brasil, o Ministério da Justiça não comentou as críticas da delegação da ONU. BBC Brasil
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