O presidente nacional do PMDB, Michel Temer, não teve 24 horas de sossego depois de ser reeleito no sábado. Um grupo minoritário, porém ruidoso, ficou insatisfeito com o recuo do colega sobre como tocar o dia a dia do partido.
Haverá choro e ranger de dentes nos bastidores do PMDB. E em algum momento essa chorumela pode se transformar em algo prático.
Nas semanas recentes, durante intensas conversas, Temer havia aquiescido e concordado em assumir de maneira completa o PMDB. É que nos útimos 10 anos, ele ficou licenciado do cargo, período no qual assumiu interinamente o vice-presidente da legenda –o senador Valdir Raupp, de Rondônia.
Agora, o trato era que Temer seria reeleito para o cargo de presidente nacional do PMDB – o que se deu ontem, sábado, 02.mar.2013 – e não se licenciaria.
Essa promessa de Temer ajudou a debelar uma incipiente tentativa de alguns descontentes que pensaram em lançar uma chapa de oposição –com pouquíssimas chances de ganhar, mas com potencial enorme para tornar público o que todos já sabem: o racha histórico crescente dentro da legenda.
Mostrar um partido dividido era o que Michel Temer menos desejava neste início de 2013. Ele tem sido ameaçado por boatos quase diários de que alas do PT (sob o comando de Luiz Inácio Lula da Silva) pretendem tirá-lo da cadeira de vice na chapa presidencial de 2014 ao lado de Dilma Rousseff. O ideal no sábado era demonstrar um partido unificado ao seu lado.
Deu certo. Mas só até o final do dia.
Quando muitos já estavam a caminho do aeroporto para viajar de volta aos seus Estados, Michel Temer deu uma entrevista. Recuou em público da posição que havia assumido em privado: disse que iria sim se licenciar do cargo de presidente do PMDB e passar o dia a dia do partido para o senador Valdir Raupp (RO).
“Eu vou manter o mesmo sistema que eu vinha mantendo com o presidente Raupp”, afirmou Temer.
Quem conhece Michel Temer sabia que ele estava incomodado em assumir o papel de multipresidente –presidente do PMDB, vice-presidente da República e eventual comandante do Planalto quando Dilma Rousseff se ausentasse do país.
De fato, apesar de ser legal, essa situação produziria um despautério político. Haveria constrangimentos incontornáveis. Exceto com Ulysses Guimarães (nos anos 80), o Brasil nunca mais teve um presidente de partido no comando do país.
Temer ruminou em silêncio e vagou por esse labirinto na semana passada. “Assumo ou não o PMDB formalmente e viro um multipresidente causando um constrangimento político para mim e para o governo?”. Ou a outra opção: “Digo que vou de novo me licenciar e me arrisco a ter uma oposição explícita contra mim na frente da presidente Dilma durante a convenção do partido?”.
Na dúvida, Temer parece ter seguido o ensinamento lusitano atribuído a d. João 6º: “Se não sabes o que fazer, não faças nada”. Ou seja, o líder do PMDB deixou a ala descontente de sua legenda pensar que ele assumiria integralmente o partido.
Foi uma boa estratégia. Temer foi reeleito. Os telejornais noturnos de sábado (2.mar.2013) mostraram imagens dele reeleito e nenhum sinal de dissidência entre os militantes do PMDB na frente de Dilma Rousseff (aqui o Jornal Nacional, o Jornal da Band e o Jornal da Record). Imagem é tudo –embora tenha sobrado sempre uma dúvida sobre a falta de ênfase no discurso de Dilma sobre quem será, de fato, o seu companheiro de chapa em 2014. Mas essa é outra história.
A forma melíflua com que Michel Temer tomou sua decisão provocou reações de assombro no início da noite de sábado (2.mar.2013). Quem se surpreendeu? O Blog identificou pelo menos 3 integrantes da cúpula do PMDB: o líder do partido na Câmara, deputado Eduardo Cunha (RJ), o vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal, Geddel Vieira Lima, e o ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Moreira Franco.
Os três só souberam que Temer havia desistido de se manter no cargo de presidente do PMDB por meio de conversas com jornalistas. “O compromisso era ele não se licenciar. Eu não sabia. É muito ruim se for isso mesmo”, declarou, ainda incrédulo, o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha, no final do dia e já fora do recinto da convenção.
O resumo da ópera é simples. Para uma parcela do PMDB houve ambiguidade de comportamento por parte de Michel Temer. Ele havia dito uma coisa para alguns aliados e fez outra na prática (prometeu que ficaria no comando do PMDB, mas declarou depois que vai se licenciar e passar o partido para o vice, Valdir Raupp)
Por que alguns peemedebistas queriam Temer no comando diário do partido? Por duas razões principais.
A primeira e mais pública é que não faz sentido um partido que é o segundo mais importante na aliança que governa o Brasil ser tocado por um presidente interino. A partir de agora, como se sabe, será necessário negociar acordos para formar palanques em 26 Estados e no Distrito Federal. Michel Temer, como presidente nacional do PMDB, segundo essa argumentação, teria mais poder para fazer as melhores negociações a favor do partido.
A segunda razão, essa mais oculta, é que uma ala do PMDB está irritada com o avanço e o poder do grupo de senadores da legenda –Renan Calheiros (AL) à frente, recém-eleito presidente do Senado. Renan fez uma campanha velada (para alguns até bem explícita) contra as eleições do presidente da Câmara, Henrique Alves (RN), e do líder dos deputados, Eduardo Cunha (RJ). Por essa razão, o time do PMDB na Câmara decidiu impor como vendeta a destituição do senador Valdir Raupp do cargo de presidente interino da legenda.
E agora, o mais importante: haverá consequências?
Possivelmente nenhuma. No curto prazo.
Michel Temer também pode vir a público e dizer que foi mal entendido. Pode declarar que vai assumir mais as tarefas políticas do PMDB, mas sem controlar a burocracia do dia a dia.
Vai ficar tudo o dito pelo não dito, um desfecho típico do PMDB. A ambiguidade é uma marca registrada do partido. Uma praxe acadêmica interna.
Mas os sinais estão emitidos.
Michel Temer tem o controle do partido, mas de uma forma um pouco mais precária do que o normal.
O Palácio do Planalto sabe disso. E gosta. O PT adora. Nada como ter um aliado enfraquecido internamente.
Tudo o que Dilma Rousseff, o PT e Lula querem é repetir a mega-aliança de 2010, que tinha dez legendas (e obter um tempo gigantesco na propaganda de rádio e TV). Nessa lógica, o PMDB é mais do que desejado. Só que a presença de Temer como candidato a vice só é um contrapeso que os petistas engoliram como um preço a pagar na época em que o peemedebista tinha, de fato, o comando mais robusto da sigla.
Se o PMDB fraquejar com Temer, o partido pode por obra de seus caciques regionais até ficar na aliança dilmista. Mas a garantia de Temer na cadeira de vice tende a sofrer ataques especulativos diários. Ainda mais agora, que ele usou sua astúcia e ambiguidade para engambelar alguns colegas da legenda.
Por fim, conclui-se:
1) a tendência natural continua sendo o PMDB se entregar de novo ao PT na campanha presidencial para reeleger Dilma Rousseff;
2) mesmo com o ruído provocado agora, Michel Temer tem se mostrado mais habilidoso do que seus adversários dentro da legenda. Ele não chega a ser um Frank Underwood de House of Cards, mas se não for ele, quem comandaria o PMDB?;
3) quem está feliz vendo de fora essa trapalhada peemedebista é o PT e também, certamente, o PSB e Eduardo Campos, o eterno “plano B” de Lula para a vaga de vice de Dilma. Fonte: Josias de Souza
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