Pai e mãe da vítima, que hoje vivem separados da filha, lembram que o site demorou três meses para embaçar a imagem. Foto: NANDO CHIAPPETTA/DP/ D. A PRESS
Mais de um ano sem ir à escola, uma mudança forçada de endereço e um trauma difícil de superar. Os pais da criança de nove anos que teve a imagem exposta pelo Google Street View enquanto trocava de roupa dentro de casa, em Jaboatão, contaram ao Diario detalhes sobre o pesadelo em que a vida da menina e do resto da família se transformou desde outubro de 2012, quando a publicação da imagem foi percebida. A criança, que na época em que foi fotografada tinha apenas sete anos, deixou de ir às aulas, passou a morar com parentes e está recebendo tratamento psicológico. Sair de casa virou um pesadelo. As lembranças de colegas de classe apontando para ela, rindo e dizendo que ela está “famosa” e “nua”, atormentam os seus pensamentos, segundo os pais. Na semana passada, o juiz Rogério Lins e Silva, da 2ª Vara Cível da Capital, condenou o Google Brasil Internet a pagar indenização de R$ 25 mil por danos morais. A família irá recorrer da decisão por acreditar que o valor deveria ser superior.
O pai da menina, um fiscal de loja de 41 anos, contou que a imagem foi captada em fevereiro de 2012. Oito meses depois, já podia ser vista na internet. Foi quando começaram as chacotas na escola e na rua onde a criança vivia. “Fizemos a reclamação ao Google, mas eles não retiraram a imagem. Tivemos que procurar o Conselho Tutelar, um advogado e a Justiça para que o problema fosse resolvido”. Somente em janeiro do ano seguinte a fotografia foi embaçada pela empresa. “Minha mulher precisou sair do trabalho para cuidar dela. Foi um trauma muito grande”.
Trecho da carta em que a questão é classificada como um "probleminha"
A sentença do juiz foi publicada na última sexta-feira no Diário de Justiça Eletrônico. O Google tem 15 dias, a partir da notificação, para recorrer da decisão. No Tribunal de Justiça de Pernambuco, a empresa ainda é ré de pelo menos dez processos. Na época em que foi acionado para retirar a imagem, o Google Brasil alegou que qualquer pessoa viria a menina se passasse pela rua naquele momento. Também informou que o usuário pode solicitar que rostos e placas de veículos sejam borrados. O Diario tentou contato com a empresa, mas os e-mails enviados não foram respondidos.
O advogado Manoel Ferreira Morais, que defende a criança, pontuou que “os danos causados foram grandes, por isso há necessidade de indenização com valor mais alto”. Segundo ele, os R$ 25 mil não dão sequer para o tratamento psicológico adequado da menina. “A família não tem condições financeiras. Vou pedir ao Tribunal de Justiça uma sentença mais justa”, finalizou Morais.
Entrevista >> pai da menina
Como o senhor soube que a imagem da sua filha trocando de roupa estava exposta na internet?
Em outubro de 2012, um vizinho mostrou a foto. Os coleguinhas dela também viram. Ela ficou muito traumatizada, sem querer ir para a rua, porque diziam que ela estava famosa por aparecer nua. Minha mulher teve que sair do trabalho para cuidar dela, sem contar o tratamento psicológico. Fizemos uma reclamação ao Google, mas eles demoraram muito para que a foto fosse embaçada. Isso só aconteceu porque a Justiça determinou por carta precatória. Eles iam ter que pagar uma multa de R$ 10 mil por dia.
O senhor considera que o valor de R$ 25 mil de indenização por danos morais é baixo em relação ao trauma sofrido por sua filha?
Não tem dinheiro que pague o trauma, mas foi muito pouco o valor da indenização. Ela só tinha sete anos quando isso aconteceu. Na rua todo mundo sabe que é a minha filha que estava exposta na imagem da internet. Ela não quer mais voltar para casa. Está morando na casa de parentes. Também deixou a escola por não aguentar as brincadeiras dos colegas. Vamos recorrer da decisão da Justiça para aumentar o valor.
Ao longo desse tempo, representantes do Google Brasil Internet chegaram a procurá-lo para dar assistência à criança?
Eles só mandaram uma carta pedindo desculpas pela fatalidade. No fim do ano, mandaram brindes, como canecas. Mas nunca entraram em contato para perguntar se minha filha precisava de ajuda.