Wlamir Silva*Professor e historiador
Nosso título é uma frase atribuída a D. Pedro I no processo de Independência do Brasil. O pensamento, no entanto era corrente à época. Sobre o Príncipe brasileiro pesavam o persistente Absolutismo e o Liberalismo do início do século XIX, cheio de críticas aos excessos da Revolução Francesa e de desconfianças do “povo”. Ideias presentes no despotismo do primeiro Imperador e em muitas cabeças de então.
O exemplo dado acima é antigo, mas a questão varou décadas e décadas no país. Com a influência marxista, e a leitura por meio das classes sociais, discutiu-se quais elas eram e como elas comporiam o “povo” e o “nacional” capaz da revolução. Com o golpe de 1964 passou-se a discutir, sob o conceito de Populismo, se tínhamos “classes”, ou apenas “massas”, se o “povo” e o “nacional” eram mitos que escondiam nossas contradições...
A ideia é, mutatis mutandis, atual. E tanto no trato do passado como no presente alimenta um mal-estar quanto à existência, ou importância, de um povo ou nação. Alguns fatos nos chamam a atenção para tal angústia em nossos dias. Em especial na “disputa” pelo “povo” e, ao mesmo tempo, de sua valoração. É o caso da atual polêmica sobre a diminuição da maioridade penal. Pelo fato de 80 a 90% da população ser favorável à diminuição da idade de 18 para 16 anos.
Incomoda que o povo – pelas porcentagens, evidentemente irredutível a setores de “classe média” ou “ricos” – tenha posição tão “conservadora” ou “reacionária”. Tal incômodo não nasceu agora. Um referendo acerca da proibição do comércio de armas de fogo e munição realizado em 2005, com quase dois terços da população rejeitando a lei, foi significativo. A rejeição a “Lei do desarmamento” chocou os que consideravam a ideia obviamente progressista e sepultou o interesse em consultar tal “povo”, tão inconfiável, para decidir qualquer outra coisa...
A decepção de 2005 causou um mal explicado horror à “reacionária” opinião popular. Em especial porque a proposta do referendo se apoiava em pesquisas de opinião que faziam, aparentemente, do projeto de Lei uma “barbada”... Pouco tempo de discussão pública evidenciou a vacuidade da Lei diante da realidade social e, como observaram os mais argutos, a rejeição da “bondade” mostrou uma catarse cívica
[1] e a pouca receptividade da população às “bem intencionadas” engenharias sociais que contornam as contradições reais.