Por Constança Rezende e Raquel Lopes | Folhapress
Foto: Luiz Silveira / Agência CNJ
O STF (Supremo Tribunal Federal) começará a julgar, nesta quinta-feira (10), a validade de uma resolução do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que determinou o fechamento de manicômios judiciários — estabelecimentos que abrigam pessoas que cometeram crimes e têm transtorno mental.
A norma afirma que pessoas consideradas inimputáveis pela Justiça —quando o réu não pode responder por seus atos— devem ser transferidas para atendimento nos Caps (Centros de Atenção Psicossocial) do SUS (Sistema Único de Saúde).
Quatro entidades entraram com ações no STF questionando a diretriz: os partidos Podemos e União Brasil, as associações Brasileira de Psiquiatria e a Nacional dos Membros do Ministério Público. Todos os processos são de relatoria do ministro Edson Fachin.
Os autores das ações argumentam que o CNJ teria extrapolado suas atribuições ao editar a norma, além de alterar a aplicação de regras previstas no Código Penal. Eles citam, como exemplo, a previsão de medida de segurança de internação e a exigência de perícia médica psiquiátrica para avaliação, o que só poderia ser feito por meio de lei federal.
Também afirmam que a resolução privaria as pessoas que precisam ser internadas em estabelecimentos médicos psiquiátricos do direito de restaurar sua saúde mental.
Eles ainda apresentaram uma nota de entidades médicas afirmando que a norma possibilitaria a soltura de pessoas sem condições de conviver em sociedade, o que representaria violação do direito à segurança pública.
Outro argumento é o de que o fim dos estabelecimentos manicomiais atingiria direitos fundamentais das pessoas presas e submetidas a medidas de segurança, contrariando os parâmetros estabelecidos pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Além disso, alegam que o número de Caps e de unidades e profissionais especializados em saúde mental seria insuficiente para atendimento da demanda atual de pacientes de saúde mental, situação que seria agravada com a implementação da resolução.
Como a Folha mostrou, gestores públicos estaduais e municipais afirmam que o SUS carece de estrutura adequada para receber estas pessoas por causa de restrições orçamentárias.
A estrutura da Raps (Rede de Atenção Psicossocial) é composta por diferentes serviços de atenção à saúde mental e hospitais gerais com leitos psiquiátricos.
O vice-presidente do Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde), Geraldo Reple Sobrinho, aponta também a falta de familiares dispostos a acolher as pessoas que saem dessas unidades e que devem ser encaminhadas aos serviços residenciais terapêuticos.
Sobrinho conta que, em São Bernardo do Campo (SP), onde é secretário municipal de Saúde, o custo de uma residência terapêutica para oito pessoas é de R$ 75 mil por mês e que muitas poderiam ser encaminhadas para moradias ou abrigos, sem precisar de toda essa estrutura, que demanda médicos e equipes 24 horas.
Ele acrescenta que o órgão tem dialogado com o CNJ para flexibilizar a resolução e que também há casos de pessoas que deveriam estar em presídios, pois representam riscos para a sociedade.
O CNJ, por sua vez, sustenta que a resolução é direcionada ao Poder Judiciário e regulamenta disposições já previstas pela Lei Antimanicomial, de 2001 e pela convenção para pessoas com deficiência.
Também afirma que a norma tem como objetivo proteger o direito fundamental à saúde das pessoas com transtorno mental ou qualquer forma de deficiência psicossocial no âmbito do processo penal e da execução da medida de segurança.
Desde fevereiro do ano passado, o CNJ tenta desativar essas instituições e encaminhar 2.276 internos para tratamento pelo SUS. Os tribunais terão até 29 de novembro deste ano para pedir a prorrogação dos prazos para implementação da resolução.
Um estudo do conselho mostrou que a maioria das pessoas internadas em manicômios judiciários é formada por homens pardos e pretos com diagnóstico de esquizofrenia e envolvidos em crimes de homicídio.
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