Debora Ghelman - Foto: Divulgação
Ministra diz que sonha com tempo de afastamento maior; especialista em Direito de Família afirma: 'apesar da boa intenção, é um retrocesso quando falamos em era da igualdade de gêneros'
Em uma entrevista conjunta ao portal UOL e Folha de S. Paulo no último dia 29, Damares Alves, ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos mencionou que mulheres deveriam ter direito a licença maternidade pelo período de um ano.
"Defendo mais tempo da mãe com a criança em casa, o pai também. Agora essa é a realidade no Brasil? Não é. Podemos lutar por isso? Podemos. Vamos ter resistência? Muita. [...] Na Hungria, são três anos de licença maternidade. No primeiro ano, a mulher ganha 110% do salário. Segundo ano, 80%. No terceiro, 50%. Se quiser voltar ao trabalho no segundo ou terceiro ano, 60%." disse a ministra.
Porém, após a matéria ser publicada, Damares escreveu em seu Twitter que sabe que este tipo de licença maternidade não é viável para o Brasil e avisou empresários que se trata de um 'desejo apenas':
"Calma, empresários. Este é apenas um desejo. Sabemos que a realidade brasileira é bem diferente, mas não custa sonhar. Este governo trabalha para criar o ambiente que favoreça a implementação desse tipo de medida favorável à família, sem pressionar e inviabilizar negócios.''
Atualmente o benefício da licença maternidade assegura 4 meses de afastamento para a mulher, este período pode ser estendido até 6 meses, dependendo do empregador. Ainda é possível que os dias de férias sejam incorporados à licença caso a mulher esteja há mais de um ano na empresa.
Debora Ghelman, advogada especializada em Direito Humanizado nas áreas de Família e Sucessões, diz que a sugestão da ministra na teoria é um lindo projeto, pois objetiva fortalecer os laços afetivos entre a mãe e seu filho, porém, na prática dificilmente irá funcionar.
"Primeiro, será um desestímulo para as empresas contratarem as mulheres que estejam na idade biológica para se tornarem mães. Segundo, poderá ocorrer demissão em massa destas mulheres. Terceiro, provavelmente seus salários se tornarão ainda mais baixos em comparação aos dos homens, uma vez que ficará caro para as empresas contratarem mulheres" explica a especialista.
Damares também opinou sobre a licença paternidade, benefício que concede aos pais apenas cinco dias de afastamento do trabalho, podendo este prazo ser estendido a até 20 dias, dependendo da empresa. "Se a gente pudesse ter para os pais [a licença paternidade] dois ou três meses seria ótimo. Mas olha o problema que a gente vai ter ainda no Brasil para chegar a esse objetivo. A indústria vai reagir, o comércio vai reagir, mas a Hungria conseguiu", disse a ministra.
Debora sugere que os moldes da licença paternidade poderiam ser inspirados em outro país europeu, a Suécia: "No modelo sueco, a licença é compartilhada entre homens e mulheres. 90 dias para cada um e os outros 300 dias são convencionados entre o casal. Se a nossa legislação evoluiu no sentido de defender a igualdade de gêneros, porque não estender essa licença para os pais? Isso está de acordo com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Além de permitir que os pais aprofundem seus vínculos afetivos com seus filhos permitirá que a mulheres retornem em paz ao mercado de trabalho sem aquela culpa de abandonar seu filho"
A deputada estadual eleita em São Paulo, Janaina Paschoal usou também o Twitter para se manifestar sobre a proposta de Damares: " Creio que tal modificação findaria por prejudicar as próprias mulheres, que deixariam de ser contratadas. Fatalmente, o prejuízo à carreira das mulheres implicaria prejuízo às próprias crianças, pois muitos lares são sustentados, exclusivamente, por mulheres. Podemos até pensar em estímulos para que mulheres com filhos pequenos possam trabalhar meio período. Mas licenças obrigatórias mais longas prejudicarão as mulheres e, por conseguinte, as famílias", escreveu Janaina.
Para Debora, a legislação brasileira e os tribunais estão incentivando cada vez mais a independência financeira da mulher e seu ingresso no mercado de trabalho: "Por isso, as pensões alimentícias entre os cônjuges estão sendo cada vez mais raras e as mulheres também têm que contribuir com as pensões dos filhos menores e incapazes. Logo, esse projeto, apesar da boa intenção, é um retrocesso quando falamos em era da igualdade de gêneros", finaliza a advogada.
*Debora Ghelman é advogada especializada em Direito Humanizado nas áreas de Família e Sucessões, atuando na mediação de conflitos familiares a partir da Teoria dos Jogos.
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