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sábado, 30 de agosto de 2025

Obesidade infantil cresce no Brasil: um em cada três adolescentes de 10 a 19 anos já tem excesso de peso

“Eu vi meu filho desaparecendo”, diz o comerciante Darlan Wagner
 — Foto: Arquivo Pessoal
Uma em cada três crianças e adolescentes de 10 a 19 anos no Brasil têm excesso de peso. É o que mostra um levantamento nacional com base nos dados do Sistema Único de Saúde (SUS) no país. Via G1

A situação é alarmante, segundo especialistas ouvidos pelo g1; eles afirmam que excesso de peso nos anos iniciais da vida adulta pode aumentar o risco de doenças cardíacas, diabetes e Acidente Vascular Cerebral (AVC) – algumas das principais causas de mortes no país.

O filho de Darlan Wagner, um comerciante no Pará, é parte dessas estatísticas. O adolescente desenvolveu compulsão alimentar e chegou a pesar mais de 100 kg aos 13 anos. No ano passado, pediu aos pais como presente de aniversário a cirurgia bariátrica.]

“Eu vi meu filho desaparecendo. Aquela criança que brincava, que saía de casa, não existia mais. Tentamos ajudar, mas, quando percebemos, ele já escondia comida no quarto, comia escondido e tinha doenças de adulto, como colesterol alto e diabetes”, explica Darlan.

A obesidade nessa faixa etária já é reconhecida por instituições de saúde como um desafio global. No Brasil, neste ano, o Conselho Federal de Medicina (CFM) mudou as regras para a bariátrica e passou a permitir que adolescentes de 14 anos passassem pelo procedimento. Médicos ouvidos pelo g1 acreditam que a medida atende a uma demanda já existente. Há fila de espera pela cirurgia entre menores.

O drama se reflete no levantamento nacional que mostra que o sobrepeso entre crianças e adolescentes subiu quase 9% em dez anos, entre 2014 e 2024. A pesquisa analisou o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN), mantido pelo Ministério da Saúde via organização ImpulsoGov.

 Segundo os dados, são 2,6 milhões de crianças e adolescentes nessa faixa de idade com algum tipo de sobrepeso.

Sobrepeso: 1.542.975
Obesidade: 840.808
Obesidade grave: 237.228

Especialista em saúde pública que participou da pesquisa, Fernanda Soares diz que o quadro retrata um cenário preocupante que afeta a próxima geração de adultos no país.

“O Brasil enfrenta hoje um quadro preocupante e crescente de excesso de peso entre crianças e adolescentes. (…) Esse cenário reflete mudanças importantes nos hábitos alimentares, sedentarismo e também desigualdades regionais. A dimensão do problema, além de relacionar-se diretamente com a saúde pública, também é econômica e social: sobrecarrega o sistema de saúde, aumenta custos futuros com doenças crônicas e compromete a qualidade de vida dessa população”, explica.
O raio-x do Brasil
Os dados revelam um problema presente de Norte a Sul do país. Apesar disso, há regiões mais afetadas que outras.

A região Sul é a que teve a maior porcentagem –com 37% das crianças e adolescentes dentro do grupo de idade com algum tipo de sobrepeso em 2024.

A região Norte é a que tem o menor índice, com 27% da população entre 10 e 19 anos com algum tipo de sobrepeso.

Quando analisados os estados, as maiores altas aconteceram no Ceará, onde o número de crianças e adolescentes com sobrepeso aumentou 12%; depois, vem Rondônia, com alta de 11%, e Rio Grande do Norte com 10%.

O único estado em que não houve aumento foi Roraima, que reduziu 1% o índice em comparação com 2014.

Entre as capitais, o maior índice está em São Paulo, que tem mais de 76 mil jovens em condição de sobrepeso —seguida por Rio de Janeiro, com 64 mil e Manaus, com 43 mil.

Veja a lista de capitais:
Sobrepeso em crianças e adolescentes por capitais

CIDADE PORCENTAGEM NÚMERO
São Paulo 37,0% 76.179
Rio de Janeiro 31,1% 64.397
Manaus 28,5% 43.290
Fortaleza 37,7% 35.421
Brasília 27,9% 23.083
Porto Alegre 41,8% 19.697
Salvador 34,8% 13.777
Curitiba 42,1% 12.235
Campo Grande 34,8% 10.930
São Luís 25,1% 10.257
Goiania 32,3% 10.211
Teresina 26,9% 8.905
Cuiabá 34,0% 8.096
Belém 31,6% 7.353
Recife 37,9% 7.091
Maceio 33,7% 5.880
Belo Horizonte 35,9% 5.636
João Pessoa 32,8% 5.114
Porto Velho 30,0% 5.046
Vitória 32,3% 5.041
Natal 36,4% 4.927
Boa Vista 28,6% 4.357
Paulmas 26,8% 4.262
Macapá 31,2% 4.165
Aracaju 33,4% 3.753
Rio Branco 30,1% 3.498
Florianópolis 36,5% 2.771
Fonte: ImpulsoGov

Por que isso está acontecendo?
 A pesquisa mostra que a alta é motivada pelo alto consumo de ultraprocessados, de bebidas adoçadas e embutidos –alimentos assinalados como parte importante da dieta pela maioria daqueles que foram identificados com sobrepeso.

 Entre os alimentos citados estão macarrão instantâneo, biscoito recheado e salgadinho.

A médica endocrinologista Maria Fernanda Barca, membro da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade (Abeso), explica que a alimentação das crianças e adolescentes é um reflexo dos maus hábitos dos adultos.

“A gente tem mais oferta de ultraprocessados. Os alimentos ultra calóricos estão super acessíveis para as crianças e adolescentes em casa. O reflexo disso é uma infância e adolescência com sobrepeso”, explica.

A médica ainda reforça que essa mudança de hábito veio associada a uma vida mais sedentária – o que também é mostrado na pesquisa. Os índices apontam que, entre as crianças e adolescentes com sobrepeso, a maioria passa tempo considerável em frente às telas e se alimentam diante delas.

“As crianças e adolescentes têm uma alimentação de pior qualidade e somado a isso estão mais sedentárias. Isso se reflete na pesquisa quando olhamos os índices nas grandes cidades, por exemplo, em que se caminha menos. A soma desses fatores cria esse cenário no país”, explica.

Qual o risco disso para o futuro?
Fernanda Soares, especialista em saúde pública que participou da pesquisa pela ImpulsoGov, explica que o sobrepeso nessa idade pode causar uma série de problemas na vida adulta.

“O excesso de peso na infância e adolescência traz riscos imediatos e de longo prazo, com impactos diretos tanto para a saúde individual quanto coletiva. Do ponto de vista clínico, aumenta a probabilidade de desenvolver precocemente doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes tipo 2, hipertensão arterial, dislipidemias e doenças cardiovasculares, além de complicações respiratórias e distúrbios do sono”, explica.
Além disso, a especialista reforça que essa alta precisa ter a atenção das autoridades, uma vez que pode pressionar os sistemas públicos de saúde no futuro.

A endocrinologista Maria Fernanda Barca endossa a urgência de mudança, que inclui políticas públicas que combatam esse cenário.

“A obesidade está ligada às doenças que mais matam. Estamos vendo essas doenças aparecerem cada vez mais cedo e isso é grave para a geração futura, para o que vamos ter de futuro no país e até mesmo para o nosso sistema de saúde”, explica.

Bariátrica ainda na adolescência
Darlan Wagner, comerciante de Santa Maria do Pará, relembra que os primeiros sinais de que havia algo errado com o filho foram silenciosos. O menino passava horas em frente à televisão ou ao celular, sempre comendo. O hábito parecia inofensivo, mas abriu espaço para que a alimentação se tornasse cada vez mais descontrolada.

Segundo ele, o jovem não tinha mais controle do que comia, já que estava sempre distraído. Enquanto os pais estavam ocupados com o dia a dia, não percebiam o que acontecia.

“Quando nos demos por nós, vimos que ele estava ganhando muito peso muito rapidamente. A culpa disso foi nossa, a culpa é de nós, pais, que permitimos que isso aconteça. Parece normal e inofensivo, mas abriu espaço para que o meu filho, uma criança, desenvolvesse compulsão e chegasse a uma situação em que não se reconhecia mais”, explica.

Aos 11 anos, o menino já tinha obesidade. Dois anos depois, a situação se agravou: ele não queria mais aparecer em fotos, evitava sair de casa, já não tinha mais interesse pela escola e começou a se isolar.

Darlan afirma que a mãe e ele tentaram intervir ajustando a alimentação do filho, mas descobriram que o problema era maior: ele escondia comida no quarto, comia escondido à noite e o caso era já de compulsão alimentar.

Aos 13 anos, ele pesava mais de 100 kg, tinha colesterol alto e enfrentava limitações físicas, diabetes e outras doenças.

“Nós tentamos, mas não conseguimos sozinhos. Foi um processo, até que ele me pediu de presente de aniversário a cirurgia bariátrica. Aquilo me despedaçou por dentro. Mas enfrentamos isso juntos e conseguimos devolver a ele qualidade de vida”, explica.
Hoje, o menino passa por acompanhamento médico, psicológico e nutricional.

A médica endocrinologista Maria Fernanda Barca, que atende crianças em seu consultório, explica que, para evitar cenários como esse, é necessário envolver um tratamento multidisciplinar que inclua os pais.

“É preciso que os pais repensem a alimentação da casa e que eles evitem esses cenários que podem acabar levando as crianças a um quadro de obesidade. Que eles estimulem a atividade física e que olhem esse ponto como essencial quando falamos na saúde das nossas crianças”, diz.

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