Por Michele Oliveira | Folhapress
Foto: Marcello Casal Jr / Agência Brasil
Um dia depois de a cúpula do G7 aprovar um empréstimo de US$ 50 bilhões para Ucrânia, para fortalecer a defesa do país contra a invasão russa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) discursou aos líderes do grupo e criticou o gasto crescente com armamentos. Disse que "está claro" que nenhuma das partes vai alcançar seus objetivos pela via militar e chamou de inoperantes as instituições de governança diante da realidade geopolítica
Convidado pela presidência italiana do G7, cujo encontro ocorre no resort de Borgo Egnazia, na região da Puglia (sul), Lula voltou a defender a realização de uma conferência internacional com a participação dos dois lados como única forma de impulsionar conversas pela paz. "Já está claro que nenhuma das partes conseguirá atingir todos os seus objetivos pela via militar. Somente uma conferência internacional que seja reconhecida pelas partes, nos moldes da proposta de Brasil e China, viabilizará a paz", afirmou.
Neste fim de semana, a Suíça sedia uma conferência para discutir uma saída do conflito, mas Lula não irá participar, com o argumento de que a ausência da Rússia nas negociações não trará resultados.
Sem citar Israel, o brasileiro criticou o andamento do conflito em Gaza, onde, segundo ele, o "legítimo direito de defesa" se transformou em "direito de vingança".
A participação de Lula foi na sessão que debateu inteligência artificial, energia, África e Mediterrâneo. Na grande mesa oval, os líderes do G7 –formado por Estados Unidos, Itália, França, Alemanha, Reino Unido, Canadá e Japão– dividiram o espaço com representantes de Turquia, Índia e Tunísia, entre outros.
Lula estava sentado entre o presidente da Argélia, Abdelmadjid Tebboune, e o canadense Justin Trudeau. Outro presente à mesa foi o argentino Javier Milei.
A grande estrela, porém, foi o papa Francisco, primeiro pontífice a participar de um G7. Em seu discurso, sobre inteligência artificial, alertou para riscos e defendeu que a ferramenta esteja a serviço das pessoas –e não o contrário. "A tecnologia nasce com um propósito e, com o seu impacto na sociedade humana, representa sempre uma forma de ordem nas relações sociais e uma disposição de poder, permitindo a uns realizar determinadas ações, enquanto a outros impede de concretizar outras."
Em referência ao tema abordado pelo papa, Lula denunciou o que considera uma concentração, na área digital, "sem precedentes" nas mãos de poucas pessoas, empresas e países. "A inteligência artificial acentua esse cenário de oportunidades, riscos e assimetrias. Seus benefícios devem ser compartilhados por todos", disse. "Interessa-nos uma IA que também tenha a cara do Sul Global, que fortaleça a diversidade cultural e linguística e que desenvolva a economia digital de nossos países."
Ao falar sobre outro tópico considerado prioritário pela presidência italiana do G7, Lula afirmou que os países africanos são parceiros indispensáveis para o enfrentamento dos desafios globais e fez referência aos fluxos imigratórios e às políticas de combate ao fenômeno.
"A força criativa da juventude [da África] não pode ser desperdiçada cruzando o Saara para se afogar no Mediterrâneo. Buscar melhores condições de vida não pode ser uma sentença de morte", disse, diante da primeira-ministra Giorgia Meloni, que já defendeu um bloqueio naval no Mediterrâneo como forma de inibir a entrada de imigrantes na Itália.
Na condição de ocupante da presidência rotativa do G20, Lula incluiu em sua fala algumas das prioridades brasileiras, como o combate a fome e a taxação de grandes fortunas, que serviria de mecanismo de combate à desigualdade. "Já passou da hora de os super-ricos pagarem sua justa contribuição em impostos. Essa concentração excessiva de poder e renda representa um risco à democracia."
Esta é a oitava participação de Lula no G7 desde 2003. Após o encerramento da sessão, a agenda do presidente incluía encontros bilaterais. Estavam previstas conversas com os presidentes Recep Tayyip Erdogan (Turquia) e Emmanuel Macron (França), o primeiro-ministro Narendra Modi (Índia), com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e com o papa. Segundo o Itamaraty, o único pedido de bilateral feito pelo Brasil foi com Francisco –todos os outros foram recebidos.
No fim do dia, os líderes, com seus acompanhantes, serão recebidos por Meloni para um jantar no resort. Antes, porém, assistirão a um espetáculo de dança e a uma apresentação do tenor Andrea Bocelli.
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