A linha de raciocínio do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes em sua disputa com a Receita Federal poderia colocar a Operação Lava Jato em risco, avalia Mauro Silva, diretor de estudos da Unafisco, a associação dos auditores do Fisco. Mendes tornou público seu descontentamento com o fato de a Receita estar checando dados financeiros do ministro e de sua mulher, Guiomar. Informações da UOL.
Para o auditor, as reclamações de Gilmar sobre suposto “lavajatismo” não têm sentido. Também não batem com as afirmações do novo secretário da Receita, Marcos Cintra, que disse que a Receita não deve fazer investigação criminal.
“Se naquelas situações em que a Receita esbarrou em alguma coisa sem estar do lado do procurador (do Ministério Público), sem estar em força tarefa, esbarrou em lavagem, depois apresentou ao Ministério Público… Se isso não pode, porque não tinha autorização judicial e é prova ilícita, uma parte considerável da Lava Jato cai. Mauro Silva, diretor de estudos da Unafisco
De acordo com o procurador da Lava Jato Roberson Pozzobon, o grupo especial de fiscalização da Receita já cobrou R$ 19 bilhões em impostos e multas relacionados à operação anticorrupção desde 2015.
Silva questiona o objetivo do ministro ao criticar a Receita. “Ele está querendo a interpretação dele. Se ele é um investigado na área tributária, claro que ele quer desqualificar o trabalho. É natural tentar distorcer.”
Fazer ações de prevenção e repressão à lavagem de dinheiro é uma das funções da Receita pelo menos desde 2000, ainda no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Um decreto daquele ano afirma que o órgão deve “participar” da “repressão” a crimes, como o branqueamento de capitais. A regra foi atualizada com a redação dada pela gestão de Jair Bolsonaro (PSL). Agora, diz que o Fisco deve “planejar, coordenar e realizar” o combate à lavagem e a outros ilícitos.
O Fisco fez por conta própria um “pente fino” sobre 139 PEP (Pessoas Expostas Politicamente), como Gilmar Mendes. A motivação seria uma série de atribuições da Receita e determinações do Gafi (Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e Financiamento ao Terrorismo), que recomenda priorizar a fiscalização nas chamadas PEP.
Entre os critérios da nota técnica, está o fato de a pessoa ou empresa ter patrimônio acima de R$ 5 milhões e serem localizadas algumas inconsistências em declarações prestadas por ela ou pessoas ligadas. Esses filtros são feitos por inteligência artificial.
Depois, os auditores passam a analisar com mais cuidado os nomes que restaram da pesquisa. Ao final, será definido se haverá ou não abertura de PAF (Procedimento Administrativo Fiscal). A Receita afirmou que Gilmar Mendes não é investigado, o que leva auditores ouvidos pelo UOL a entenderem que o PAF sequer foi aberto.
“RECEITA FEDERAL DOS SONHOS”
Para Silva, a crítica do ministro deveria ser vista ao contrário, pois estaria mostrando “a Receita dos sonhos dos brasileiros”.
“A nota técnica mostra um órgão altamente técnico, usando ferramentas ultramodernas, preocupado em investigar os grandes fraudadores mesmo se forem autoridades públicas. É a Receita Federal dos sonhos do brasileiro. Claro que os poderosos estão incomodados e tentam desqualificar o trabalho.”
Um auditor com alto posto na Receita em Brasília disse que a regra para Gilmar Mendes é a mesma para qualquer cidadão. “A lei é para todos”, disse ele a um colega diante da reportagem do UOL.
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