Fádua Pinheiro Barcelos é professora de história e trabalha como gerente no condomínio de 800 apartamentos onde mora. Sua jornada é de 10 horas por dia. Com isso, ela consegue rendimentos de R$ 2,3 mil. Ecônomica, tem um pequeno apartamento quitado no Bairro Tupi, na Região Norte de Belo Horizonte. E também um carro 1.0, ano 2012, que comprou em 48 vezes de R$ 486. Mesmo assim, pelos critérios de classificação de classes sociais no país, Fádua é quase rica. Mas a classificação, que reflete as estatísticas do governo e do mercado, não condiz com a realidade cotidiana dos brasileiros.
“Não me considero rica. Me considero doida por trabalhar 10 horas por dia para ganhar tão pouco”, afirma Fádua Barcelos. A nova proposta da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), da Presidência da República, para a determinação das classes sociais no país põe a professora no seleto grupo que fica entre a baixa classe alta e a alta classe alta brasileira, formada por pessoas que ganham individualmente entre R$ 1.503 e R$ 4.687. Pelos critérios do Instituto Data Popular, especializado nos novos consumidores brasileiros, a professora também faz parte da classe alta, quando a renda individual é levada em conta.
O professor de Economia da Unicamp e ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) Márcio Pochmann diz que a defasagem entre a estatística e a prática pode ser explicada pela forma como os dados são coletados nas pesquisas. De acordo com ele, de maneira geral os levantamentos realizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para retratar a renda no Brasil levam em conta apenas o rendimento vinculado ao trabalho de modo geral, o que representa somente 46% da renda nacional.
“Essas pesquisas não conseguem obter informações plenas relativas a ganhos financeiros, renda com aluguéis, títulos financeiros, renda empresarial. Esse tipo de informação não entra nas pesquisas. Existe uma subinformação sobre a renda no Brasil”, sustenta. De acordo com ele, as consultorias que atuam no setor privado usam o critério de renda familiar ou per capita e, com base na remuneração dos indivíduos, estabelecem o que denominam de classes sociais. “Identificar um determinado nível de renda ajuda as empresas a entender a qual tipo de mercado seus produtos atendem. Essas classificações mercadológicas são importantes para o setor privado”, observa.
Encaixe perfeito
O problema é que as referências acabaram sendo apropropriadas por instituições ligadas ao governo, como o próprio Ipea e a Fundação Getulio Vargas (FGV), que a partir de informações colhidas pelo IBGE fazem a sua própria classificação de classe econômica e social, definindo quanto ganham ricos, pobres e remediados no país.
Para definir melhor o perfil do consumidor, a Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa (Abep) criou o Critério de Classificação Econômica Brasil (CCEB), usado pelos institutos de pesquisa que são seus associados. Além da remuneração, esse critério está baseado num sistema de pontos que leva em conta a posse de itens ou contratação de serviços (TV, rádio, banheiro, automóvel, empregada mensalista, máquina de lavar etc.) e o grau de instrução do chefe da família. De acordo com o CCEB, uma família da classe A tem renda média bruta de R$ 9.263. Já uma família da classe B1 tem renda mensal de R$ 5.241, a da B2 ganha R$ 2.674, da C1 R$ 1.685, a C2 R$ 1.147 e da D/E, R$ 776.
A classificação atual já não é aceita por parte dos pesquisadores brasileiros, que instauraram um debate sobre o assunto no país. “As pesquisas baseadas na renda do brasileiro apontam para um nível de rendimento muito baixo. Antes havia trabalhadores que eram pobres e que agora, por várias razões, como a expansão do emprego e do salário mínimo, tiveram a renda melhorada. Houve um alargamento das classes sociais, mas esses trabalhadores não mudaram de classe social por isso”, defende Pochmann.
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