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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Cuba, uma ilha e duas realidades

Quando Raul Castro assumiu o lugar do irmão Fidel no comando de Cuba, em fevereiro de 2008, depois que o ditador teve de se afastar da rotina do poder por motivos médicos, a maioria dos analistas esperava uma continuidade do velho e anacrônico modo de governar dos Castro, com a centralização, a burocracia e a falta de abertura. No entanto, ao constatar que os rebeldes que fizeram a Revolução de 1959 envelheceram — ou morreram — e que era preciso renovar o Partido Comunista e o bureau político, Raul começou a promover lentas alterações na roupagem do regime, sem, porém, ainda atingir a alma do sistema.

Num país onde o governo é o Big Brother e o único empregador, Raul anunciou a demissão de 500 mil funcionários públicos e a permissão para que os cubanos possam comprar e vender imóveis — com restrições — trocar de veículos, constituir pequenos comércios particulares e vender alimentos nas cidades, tornando-os legalizados.

Para fazer a economia girar, o governo passou a conceder empréstimos bancários para trabalhadores autônomos e pequenos agricultores. Antes da mudança na legislação, os cubanos só podiam adquirir casas do governo ou, no máximo, trocar de imóveis entre particulares. No setor automotivo, embora os carrões das décadas de 50 e 60 ainda desfilem nas ruas de Cuba, o negócio procura ganhar velocidade.

O comércio também foi impulsionado pelo governo. O trabalho privado foi permitido pela primeira vez depois do colapso da antiga União Soviética, em 1991. Como Cuba dependia muito do antigo império comunista, a queda da União Sovética afetou a economia cubana, deixando ainda mais em dificuldade os habitantes da ilha.
Turismo, fonte de oportunidadesPorém, apesar das boas intenções governamentais, falta muito para que o cidadão comum desfrute de toda a propaganda oficial. Apesar da abertura prometida, as mudanças são lentas por um motivo significativo: a população não tem dinheiro para aproveitar as pretensas oportunidades.

Juan Carlos Xavier, de 45 anos, utiliza seu Fusca para ganhar a vida como taxista. Antes, trabalhava também com táxi, mas como empregado do governo. Pelas ruas de Havana, é comum ver veículos mais novos trafegando como táxis, mas a grande maioria como propriedade do governo central.

Há dois anos, Xavier aproveitou a economia que havia feito fazendo bicos aqui e acolá e comprou o Fusca branco, ano 1974, motor 1300, que roda 10 km por litro de gasolina — litro esse que custa cerca de US$ 1,50, o que é muito caro para os minguados padrões locais.

"É muito melhor trabalhar por conta porque, assim, eu posso ganhar mais", afirma ele, que pagou cerca de US$ 5 mil pelo Fusca.

Comprar um carro não é para qualquer um, embora o governo queira que o negócio siga adiante. Um veículo popular, usado, com uns cinco anos de uso sai por cerca de US$ 10 mil, uma pequena fortuna que poucos têm. Adquirir um imóvel também não é para qualquer um. O governo tem prometido conceder empréstimos bancários, mas o sistema ainda é lento.

Havana tem recebido cada vez mais turistas, o que faz a economia se aquecer. Pelas ruas, nos lugares históricos, como a Praça da Independência, ou mesmo em Havana Velha, às vezes vê-se muito mais turista do que cubanos. Ônibus repletos de espanhóis, argentinos, franceses, italianos, japoneses e, sim, brasileiros, desfilam pela cidade, levando homens de bermuda e mulheres de vestidos floridos com suas máquinas fotográficas para cima e para baixo.

Os cubanos procuram aproveitar o momento e, sobretudo, o dinheiro dos turistas. Num restaurante que funciona numa casa de família, conhecido como Comedor, o intérprete diz a um casal de ingleses que o sonho dele era mudar-se para o Canadá. Seu sorriso se abre com franqueza quando é apresentado ao casal da mesa ao lado, por acaso, canadenses. O direito de ir e vir livremente, por enquanto, ainda é só um sonho.

Se por um lado o governo afrouxa a corda para que a economia possa se beneficiar de novos ares e ganhar vida e ritmo, por outro, aperta o nó contra os dissidentes. Em 2010, o preso político Orlando Zapata morreu por causa de uma greve de fome contra o regime. Há dez dias, foi a vez de Wilman Villar Mendoza. Ele se recusou a comer por 50 dias, como forma de protesto contra as condições carcerárias, e não resistiu. O governo cubano acusou Estados Unidos, Espanha e outros países de explorarem — e até incentivarem — a morte do opositor. E, desde então, o regime voltou a endurecer.

Elizardo Sánchez, da Comissão de Direitos Humanos e Reconciliação Nacional, reconhece que a economia está mudando, mas os direitos individuais continuam restritos:

"A economia está mudando, mas não os direitos civis. O governo não tem feito reformas estruturais. O país precisa urgentemente de reformas nas leis, em aspectos econômicos e políticos e nos direitos humanos porque Cuba submete a maioria do povo à pior situação em toda América Latina", diz Sánchez.
E ele vai além.
"O governo de Cuba continua criminalizando as pessoas por causa dos direitos políticos e civis. Esse é um tema que o governo cubano deveria aceitar a cooperação do Brasil, porque no Brasil os direitos civis não são penalizados", concluiu.
Brasil de olho no comércio
A blogueira Yoani Sánchez, uma das vozes mais conhecidas da oposição, também concorda que há mudanças na área econômica, mas, na opinião dela, ainda muito pequenas. Yoani, que recebeu um visto da Embaixada do Brasil em Havana para poder ir à Bahia no mês que vem para o lançamento de um documentário — se o governo cubano permitir sua saída — afirma que, na questão da compra e venda de imóveis, falta muita informação aos cidadãos.

"A compra e venda de casas melhorou, mas é difícil saber onde e como pode-se encontrar imóveis disponíveis porque não há imobiliária, nem anúncio em classificados nos jornais. Isso limita o conhecimento que a população tem das oportunidades".

Para ela, os cubanos ainda preferem alugar suas casas para estrangeiros passarem uma temporada do que vendê-las entre eles mesmos. Yoani avalia que falta estímulo, por parte do governo, para aumentar a produção, impossibilitando que a maioria da população tenha acesso aos produtos.

"A maioria está frustrada porque as reformas não atingiram o bolso ou a vida das pessoas. A maioria das pessoas não consegue viver com o salário; precisa de ajuda do governo ou atua no mercado negro para conseguir um ganho extra".

O Brasil, que desde o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vem se aproximando ainda mais de Cuba, tem um olhar estratégico para a ilha.

Integrantes do governo de Dilma Rousseff acreditam que o embargo comercial imposto pelos Estados Unidos na década de 60 está prestes a acabar. E com isso, o Brasil poderá ganhar espaço comercialmente, quando as transações comerciais com a ilha se restabelecerem. Por isso, Dilma faz questão de fazer afagos no governo ditatorial de Cuba. Da Agência O Globo

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