Por Joana Cunha | Folhapress
Foto: Reprodução
O TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região) concedeu habeas corpus, nesta terça-feira (20), para revogar o mandado de prisão emitido contra Miguel Gutierrez, ex-CEO da Americanas, na esteira do escândalo contábil na varejista.
Gutierrez, que também tem cidadania espanhola e atualmente mora na Espanha, foi alvo do mandado de prisão no dia 27 de junho, no âmbito da operação Disclosure da Polícia Federal, que também cumpriu mandados de busca e apreensão contra outros ex-executivos da companhia.
Outra ex-diretora da Americanas, Anna Saicali, também havia sido alvo de um mandado de prisão, depois revogado pela Justiça em troca de sua apresentação às autoridades. Ela estava em Portugal, chegou em São Paulo no início de julho e se apresentou à Polícia Federal, na delegacia especial do Aeroporto Internacional de Guarulhos.
O ex-CEO chegou a entrar na difusão vermelha da Interpol e ser preso em Madri por cerca de um dia em junho, mas foi solto e entregou o passaporte às autoridades espanholas. Com o habeas corpus, que foi concedido por unanimidade, será enviado um ofício à representação regional da Interpol no Rio de Janeiro para a retirada do nome de Gutierrez da difusão vermelha.
Ao pedir a prisão preventiva do ex-CEO, em junho, a Polícia Federal afirmou que o executivo se desfez de bens, entre eles imóveis e veículos, e enviou valores a offshores sediadas em paraísos fiscais.
Procurada pela reportagem, a defesa de Gutierrez não quis se manifestar. Em manifestações anteriores, sua defesa afirmou que Gutierrez "reitera que jamais participou ou teve conhecimento de qualquer fraude e que vem colaborando com as autoridades, prestando os esclarecimentos devidos nos foros próprios".
Em julho, o MPF (Ministério Público Federal) também pediu a extradição do executivo. Os procuradores justificaram que a medida é necessária já que, caso negada a extradição, abre-se a possibilidade do executivo ser processado e julgado na Espanha.
Para especialistas ouvidos pela reportagem, no entanto, a chance do ex-CEO ser extraditado é pequena. Gutierrez tem cidadania espanhola, o que diminui a possibilidade de a Justiça espanhola aceitar o pedido. O fator "reciprocidade" é levado em conta nesses casos -e, como o Brasil não extradita cidadãos brasileiros, ainda que condenados em outros países, dificilmente a Espanha aceitaria tomar essa atitude.
Além do inquérito pelos crimes de uso de informação privilegiada, manipulação de mercado e associação criminosa, Gutierrez é alvo de investigação sobre lavagem de dinheiro. O executivo teve uma carreira de quase 30 anos na companhia, é carioca e engenheiro, formado pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Apesar de integrar o alto escalão da Americanas, Gutierrez era conhecido como um 'sujeito oculto' na varejista. Com o mercado, por exemplo, seu contato era restrito às teleconferências de resultados que companhias de capital aberto realizam trimestralmente.
O rombo nas contas da Americanas foi revelado em janeiro de 2023, quando a empresa anunciou ao mercado que havia encontrado inconsistências contábeis bilionárias, o que levou a varejista a entrar em um processo de recuperação judicial.
A fraude contábil que levou ao pedido de recuperação foi confirmada, em junho deste ano, pela investigação de um comitê independente. A Polícia Federal, que também está conduzindo investigação, aponta que a fraude pode chegar a R$ 25,3 bilhões.
Na última semana, o balanço corporativo da empresa apontou prejuízo de R$ 2,3 bilhões em 2023. Os dados indicam sucessivos prejuízos na companhia. No primeiro semestre de 2024, a perda foi de R$ 1,412 bilhão, ante R$ 3,203 bilhões registrados no mesmo período do ano passado.
A perda em 2022 também foi atualizada, de prejuízo de R$ 12,9 bilhões para R$ 13,2 bilhões. O balanço também apontou redução no número de lojas. Eram 1.023 unidades convencionais em 2022, 991 em 2023 e 972 no fim do primeiro semestre de 2024. No modelo express, eram 780 em 2022, 687 em 2023 e 650 na primeira metade deste ano.
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