A Procuradoria-Geral da República (PGR) apontou em denúncia que o governador afastado Wilson Witzel (PSC) recebeu R$ 980 mil arrecadados por dois operadores do presidente do PSC, Pastor Everaldo, quando ainda era juiz federal. O repasse seria uma forma de garantir que Witzel ‘se mantivesse’ por cerca de dois anos caso perdesse a eleição, pois deixaria a magistratura para disputar as eleições.
As informações foram narradas por Edson Torres, apontado como um dos operadores de Everaldo, em depoimento colhido na Operação Tris in Idem, deflagrada no dia 28 de agosto e que levou ao afastamento de Witzel. Trechos da oitiva foram incluídos na denúncia apresentada pela PGR nesta segunda, 14, contra Witzel por organização criminosa, segundo o Estado de São Paulo.
Witzel e Pastor Everaldo são apontados como integrantes do ‘núcleo político’ da organização voltada para desvios de recursos públicos do Estado. O presidente do PSC teve a prisão preventiva decretada no último dia 5 e o governador foi afastado do cargo.
Segundo a Procuradoria, o avanço da Lava Jato no Rio levou ‘velhos atores’ a se mobilizarem para ‘voltar ao poder no Estado do Rio’ e que Witzel havia sido escolhido, ainda em 2017, ‘para dar novo rosto ao grupo político’.
O relato de Edson Torres descreve que naquele ano, quando Witzel ainda era juiz, ele teria se encontrado com Pastor Everaldo na sede do PSC no Rio e informado do desejo de ser candidato ao governo do Estado.
Após a reunião, Torres e Everaldo ‘conversaram a necessidade de dar um conforto e segurança financeira para o então juiz federal, caso ele pedisse demissão e se perdesse a eleição não teria a garantia dos vencimentos enquanto Juiz, por um período de tempo até ele se estabelecer’.
Inicialmente, poucos empresários endossaram uma campanha de Witzel, incluindo Mário Peixoto, que viria a ser preso pela Lava Jato por desvios na área da saúde na gestão do ex-juiz. Um dos que aceitaram a proposta de apoiar Witzel foi Victor Hugo, apontado como operador financeiro de Pastor Everaldo.
“O grupo então acertou que se seria feita uma arrecadação de R$ 1 milhão entre o declarante e Victor Hugo, na realidade R$ 980 mil efetivamente arrecadados. Esse ajuste foi feito entre o declarante (Edson Torres), Victor Hugo e Everaldo e que esses pagamentos foram feitos em favor de Wilson Witzel por cerca de quatro meses até a sua desincompatibilização”, apontou Edson Torres, em depoimento à PGR.
Os valores seriam pagos em parcelas de R$ 150 mil por mês, entregues ao Pastor Everaldo, ao ex-secretário Lucas Tristão e, na última ocasião, ao próprio Wilson Witzel, em abril de 2018, quando ele ainda era juiz.
“O declarante abriu a pasta, retirou os maços de dinheiro de R$ 50 mil e entregou ao Pastor Everaldo, que repassou a Witzel, que colocou em uma bolsa que estava levando”, afirmou Edson Torres à PGR. “Não foi negociado naquela época a participação de cada empresário em contratos porque isso não precisava ser negociado, já estava implícito no acordo de lançamento da candidatura”.
Segundo a PGR, o valor próximo a R$ 1 milhão foi estimado por Edson Torres como ‘suficiente’ para que Witzel ‘se mantivesse’ por cerca de dois anos caso perdesse as eleições após abandonar a magistratura.
Apesar de inicialmente ter uma campanha com menos de 1% das intenções de voto, o ex-juiz subiu nas pesquisas em 2018 ao colar sua imagem à do presidente Jair Bolsonaro. Com isso, empresários passaram a apoiar Witzel, incluindo Mário Peixoto, por meio de Lucas Tristão, segundo o relato de Edson Torres.
Após vitória de Witzel, o grupo ‘fatiou as secretarias e estatais com o escopo de ter retorno econômico’, apontou a PGR. Isso incluiu as indicações de Hélio Cabral para a presidência da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae) e Edmar Santos para a Secretaria de Saúde.
Segundo a Procuradoria, enquanto cabia a Everaldo comandar o orçamento das pastas, suas contratações, distribuição de cargos e até pagamentos a prestadores de serviço e repasses a municípios, Witzel direcionava recursos públicos para receber propinas, que eram lavadas por meio do escritório de advocacia da primeira-dama, Helena. Ambos foram denunciados como membros do ‘núcleo político’ da organização criminosa.
As propinas eram distribuídas na seguinte proporção: 30% para Edmar Santos, 20% para Witzel, 20% para Pastor Everaldo, 15% para Edson Torres e outros 15% para Victor Hugo.
Em nota, Witzel classificou as acusações como ‘mentiras’ e negou participação em irregularidades. “Todo o meu patrimônio se resume à minha casa, no Grajaú, não tendo qualquer sinal exterior de riqueza que minimamente possa corroborar essa mentira”, afirmou.
"Mais uma vez, trata-se de um vazamento de processo sigiloso para me atingir politicamente. Reafirmo minha idoneidade e desafio quem quer que seja a comprovar um centavo que não esteja declarado no meu Imposto de Renda, fruto do meu trabalho e compatível com a minha realidade financeira. Todo o meu patrimônio se resume à minha casa, no Grajaú, não tendo qualquer sinal exterior de riqueza que minimamente possa corroborar essa mentira. O único dinheiro ilícito encontrado, até agora, estava com o ex-secretário Edmar Santos”, disse.
Já a defesa do Pastor Everaldo esclareceu que "ainda não teve acesso à íntegra da investigação e da delação que embasaram sua prisão, ocorrida há 20 dias. A defesa informa que a nova de denúncia não está juntada aos autos processo e que não comentará trechos de processo que corre em segredo de Justiça. O Pastor Everaldo, que sempre esteve à disposição das autoridades, reitera sua confiança na Justiça e na sua libertação”.
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