Karina Yamamoto**Do UOL, em São Paulo **Wilson Mahana/Divulgação
Andy de Santis acredita que mais que educação financeira, é preciso ensinar para a sustentabilidade
A escola deve ensinar além das disciplinas tradicionais, como
português, matemática e ciências? Na opinião da autora Andy de Santis,
39, a resposta é sim.
Para ela, o assunto -- dinheiro e como
gastá-lo -- é uma boa oportunidade de trabalhar conceitos de diversas
matérias, além de possibilitar o desenvolvimento de algumas competências
e habilidades bastante úteis para a vida do futuro adulto.
Com
o livro "Lições de Valor", editado pela Moderna, ela propõe um roteiro
pedagógico em 12 módulos que pretende provocar reflexões sobre educação
financeira, sustentabilidade e valores não apenas entre os estudantes,
mas também entre os pais e os professores.
O UOL conversou sobre dinheiro, recursos e valores com ela. Abaixo, trechos desta conversa.
UOL - O que é educação financeira?
Andy de Santis - Se
você olhar pela ENEF (Estratégia Nacional de Educação Financeira), a
ideia está mais ligada ao processo de apoiar as pessoas a conhecer
melhor produtos e serviços financeiros e para tomar decisões financeiras
[como de consumo, poupança, crédito] mais adequadas. No meu ponto de
vista, ela não se limita apenas a entender números, planilhas, produtos
financeiros. Tem mais a ver com nossos valores, o que é importante para
nós, sonhos, plano de vida a até como escutamos a palavra "não".
UOL - Por que ensinar educação financeira na escola?
Andy de Santis - Uma
das razões é que a escola pode ser o caminho para chegar na família. Às
vezes, nem a própria família se deu conta [de como gasta seu dinheiro,
de como faz suas escolhas], trata tudo como descartável [e desperdiça
recursos]. A criança [o aluno] funciona como um multiplicador [dessa
consciência financeira], como aconteceu com a preocupação com o meio
ambiente.
Um segundo ponto é que somos todos aprendizes nesse
tema. Com as mudanças econômicas [das duas últimas décadas], as famílias
ainda não teriam criado repertório para educar seus filhos [para
aumento do crédito e, consequentemente, do consumo, por exemplo]. Há
pouco tempo começamos a fazer planejamento de longo prazo.
Na
época da hiperinflação, dinheiro era como gelo -- era preciso gastar
rápido, ou derretia nas mãos --, e os planos econômicos traziam
insegurança -- lembra de quando sequestraram a poupança? Não era um bom
cenário para pensar em planejar a longo prazo. Apesar das mudanças na
economia, mais estável e segura, ainda temos muito a aprender sobre como
usar o dinheiro e o crédito.
UOL - Por que trabalhar com alunos do fundamental 2?
Andy de Santis -É
uma etapa em que as crianças estão se tornando adolescentes. Começam a
ter acesso a dinheiro e têm alguma autonomia para gastá-lo. Também é uma
idade em que a família começa a ter alguma dificuldade em dialogar
[sobre os gastos deles].
Dá para trabalhar com os menores
também. Mas de outra maneira. Para mim, é mais adequado exercitar com
eles os conceitos de limites e de espera -- que são as essências por
trás dos conceitos de poupança e escolhas -- sem ter que falar
necessariamente em dinheiro. É uma educação para a vida, aprender a se
policiar, esperar, limitar, priorizar, escolher...
UOL - Qual seria o primeiro passo para se educar nessa área?
Andy de Santis - O
primeiro passo, antes até de olhar para a planilha [de gastos e
ganhos], é preciso entender os valores pessoais e familiares. Quais são
suas prioridades? Depois, é importante destacar quais são os sonhos e os
projetos. Onde queremos estar hoje, daqui a seis meses, um ano, dez
anos? Criar uma visão de curto, médio e longo prazo -- e até definir o
que são esses prazos porque cada um tem sua visão. O importante é
construir a visão de onde quero, queremos estar.
Aí, então, olho
para a fotografia financeira [uma lista dos ganhos e dos gastos].
Então, avalio. Por exemplo, se priorizo saúde, mas estou gastando muito
com alimentos não-saudáveis, não há coerência. Estou desperdiçando
energia na conquista dos meus objetivos. Outro exemplo é gastar com
academia e com cigarro.
A ideia do livro é mostrar o bom uso dos
recursos como um todo: tempo, dinheiro, trabalho, rede de relações. A
pergunta é: Como você está alinhando os recursos na direção dos seus
valores e dos seus sonhos?
O dinheiro entra nesse processo. Toda a decisão que tomamos passa pelo dinheiro.
UOL - Vivemos com pressa e você comenta sobre o tempo. Poderia falar um pouco mais?
Andy de Santis - Nossa
atual visão do 'fast" [rápido] gera uma relação imediatista com o
tempo. Precisamos entender -- e ensinar -- que os processos levam tempo.
Se aos 20 anos, eu soubesse quanto dinheiro juntaria até a
aposentadoria se poupasse R$ 100 por mês, hoje estaria em uma situação
financeira melhor. O tempo é um forte aliado de quem quer poupar, fazer
reserva.
UOL - Na sua opinião, qual é a importância do dinheiro?
Andy de Santis - É
um viabilizador, uma energia de concretização. Dinheiro é um meio, não
um fim em si mesmo. Para que você quer esse dinheiro? Tem que se
perguntar. Até porque se não souber, ninguém consegue guardar dinheiro
nessa sociedade em que a gente vive. A gente vive sendo assediado [para
consumir e gastar].
O importante é o significado que dou para ele.
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