RIO - Criado há 16 anos para ajudar na investigação de crimes, o Programa de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas (Provita), do governo federal, atravessa uma crise. O atraso no repasse, a falta de dinheiro para pagar despesas básicas e a burocracia são alguns dos problemas enfrentados por pessoas que estão sob proteção e dependem desse benefício para não morrer. Diante das dificuldades, o número de vítimas protegidas no país caiu nos últimos quatro anos.
São 737 brasileiros, entre testemunhas e acompanhantes, assistidas atualmente pelo Provita. Todos peças-chave em processos criminais na Justiça envolvendo, principalmente, assassinatos praticados pelo tráfico de drogas e pelas milícias. Em 2010, o total de participantes era de 1.038, segundo a Secretaria Nacional de Direitos Humanos. Nos anos seguintes, a redução foi constante: em 2011, caiu para 897; em 2012, para 830; e em 2013, para 701 protegidos.
Com orçamento anual de R$ 13 milhões (verba apenas da União), o programa tem convênios firmados com os governos de apenas 11 estados (Acre, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Rio Grande do Sul e São Paulo), além do Distrito Federal, dos quais recebe contrapartidas.
Para fazer parte do programa de proteção, a testemunha precisa ter colaborado em investigação policial ou processo criminal. A decisão de aceitar ou não a vítima no Provita é tomada por um conselho deliberativo formado por representantes do Judiciário, do Estado e da sociedade civil. O procurador Leonardo Cardoso de Freitas, do Ministério Público Federal do Rio, reconhece a falta de recursos.
— No caso do Rio, por conta da demanda, precisaríamos de mais dinheiro. Podemos melhorar. Precisamos expandir (o programa) para termos uma política de segurança pública e direitos humanos mais eficaz — disse Freitas, presidente do conselho deliberativo no estado.
Em 2010, o Rio registrou 113 pessoas protegidas, incluindo testemunhas vindas de outros estados. Em 2014, foram apenas 67. Recentemente, o governo do estado rompeu a parceria com o Provita. Em nota, alegou a “necessidade de revisão do modelo de financiamento do projeto, já que a forma atual não comporta as especificidades da proteção integral”. Agora, o atendimento é feito diretamente por uma ONG paga pelo governo federal. Mas a previsão é que ainda este ano o convênio seja retomado.
— Estamos tentando, novamente, a parceria com o governo do Rio. É fundamental para conseguirmos maior estabilidade em termos de repasse de verbas — afirmou Freitas.
Sobre a diminuição dos atendimentos no Rio, o procurador alegou, por meio de nota, que houve uma “significativa redução nas provisões dos convênios celebrados ao longo dos anos”.
O diretor da Divisão de Homicídios do Rio, Rivaldo Barbosa, criticou o atual modelo do Provita. Segundo Barbosa, a polícia deveria ter autonomia para incluir a testemunha no programa de proteção, sem passar, inicialmente, pela avaliação do conselho.
— Se a polícia pode prender um acusado e, só depois, o juiz decidir pela continuação ou não da prisão, por que a polícia não pode incluir a testemunha diretamente (no Provita) e o conselho analisar posteriormente a permanência ou não dela no programa? O modelo atual é descabido. Do jeito que o programa é hoje, a polícia perde a oportunidade de a testemunha falar. Muitas desistem de contar o que sabem por causa do tempo de espera para entrar (no Provita) — contou Barbosa.
Em Minas Gerais, por exemplo, o Provita pôs sob proteção 44 pessoas no ano passado, bem menos do que as 121 incluídas em 2010. Outro estado que registrou queda foi o Pará: de 73 protegidos há quatros anos para 50 em 2014.
MUDANÇA DE NOME
Caso seja incluída no programa, a testemunha sofre com mudanças drásticas na vida, como troca de endereço e até a ida para outro estado. Em situações mais graves, há possibilidade de a testemunha mudar o nome para não correr riscos. Se isso ocorrer, a vítima pode ter a identidade original de volta quando as ameaças terminarem. O prazo de permanência no Provita é de dois anos, podendo ser prorrogado pelo mesmo período.
Além disso, despesas como aluguel, água, luz, alimentação e auxílio médico-odontológico são custeadas pelo Provita, incluindo ajuda de custo de até dois salários mínimos. Com os atrasos nos repasses de dinheiro, muitas testemunhas desistem do programa.
Procurada pelo GLOBO, a ministra Ideli Salvatti, da Secretaria de Direitos Humanos (SDH), não quis dar entrevista. A coordenadora nacional do Provita, Heloiza Egas, também não quis comentar o assunto.
Em nota, a SDH informou que, entre outras medidas, “implementará, a partir de 2015, a formalização de convênios por período superior a quatro anos, evitando-se assim a repetição anual dos trâmites administrativos para celebração dos convênios, que demanda tempo e esforço da União e dos estados”. De acordo com a secretaria, os estados onde não há parcerias com o governo federal não são prejudicados porque técnicos do Provita atuam diretamente na execução do programa. http://oglobo.globo.com
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