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sexta-feira, 19 de dezembro de 2025

Consumo de Cannabis entre meninas triplica em 10 anos e chega a 7,9%, diz Unifesp

Por Luísa Monte | Folhapress
Foto: Divulgação / PF
Uma pesquisa divulgada pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) mostra que o consumo de Cannabis aumentou na última década no país. O crescimento é especialmente expressivo entre meninas de 14 a 17 anos: o consumo entre elas triplicou.

O Terceiro Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad 3) investigou o uso de substâncias psicoativas, com foco na Cannabis, que domina o mercado. A coleta foi realizada em 2023 com 16.608 participantes de 300 municípios, em seus domicílios, por meio de autopreenchimento sigiloso. Os dados foram comparados ao levantamento de 2012.

Neste ano, 6,3% da população acima de 14 anos havia consumido Cannabis ao menos uma vez. Em 2023, o índice subiu para 15,8%, o equivalente a 28 milhões de pessoas. Entre adolescentes, pela primeira vez, houve uma inversão entre gêneros: o consumo caiu entre meninos (de 7,3% em 2012 para 4,6% em 2023) e aumentou entre meninas (de 2,1% em 2012 para 7,9% em 2023).

A inversão é inédita na série histórica e não se repete com outras drogas, afirma Clarice Madruga, professora de psiquiatria da Unifesp e coordenadora do levantamento. Segundo ela, não há uma explicação definitiva, mas é possível que o fenômeno esteja ligado a mudanças nos hábitos de lazer dos meninos.

"O consumo de vape e a participação em jogos de aposta aumentaram significativamente entre eles. É possível que estejam migrando para práticas mais associadas ao perfil dessa geração", diz a psicóloga.

Marta Machado, secretária Nacional de Políticas sobre Drogas, levanta a hipótese de haver uma redução da percepção de risco e uma mudança na atitude social em relação à Cannabis. "O fenômeno é observado globalmente e apontado em estudos e nos relatórios recentes do World Drug Report [Levantamento Global sobre Drogas]", diz.

Outro fator relevante são as mudanças no perfil de saúde mental de adolescentes, especialmente entre meninas, com aumento de sintomas de ansiedade e depressão, intensificados no período da pandemia de Covid-19, acrescenta Machado. Somamos a isso a maior exposição digital e à influência da internet, diz a secretária.

O THC, principal composto psicoativo da Cannabis, tem impacto maior no cérebro em desenvolvimento e aumenta o risco de problemas de saúde mental. Em adolescentes, a Cannabis pode ter efeito estimulante, desencadeando ansiedade, ataques de pânico, quadros psicóticos induzidos por drogas e esquizofrenia.

"O cérebro ainda está em crescimento, e a substância pode alterar sua formação, criando predisposições que antes não existiam", afirma a pesquisadora.

Cerca de 90% dos usuários de Cannabis no Brasil ainda consomem a substância em formatos fumados tradicionais, com o prensado permanecendo como a forma mais comum. Produtos alternativos começam a ganhar espaço, mas seguem minoritários: aproximadamente 10% dos usuários recorrem a comestíveis e cerca de 4% utilizam vaporizadores.

Cerca de 2 milhões de brasileiros preencheram os critérios para dependência de Cannabis, o equivalente a 1,2% da população de 2023 —proporção que se manteve estável em relação a 2012. Com o aumento do número absoluto de usuários, o estudo aponta uma diluição do risco: embora a taxa de dependência não tenha crescido, há mais pessoas vulneráveis ao transtorno.

A pesquisa destaca a emergência de canabinoides sintéticos ("drogas K"), referido por 5,4% dos usuários (11,6% entre usuários adolescentes). "A diversificação ilustra a crescente complexidade do mercado de drogas, com riscos adicionais relacionados à potência", diz a pesquisa.

O consumo de outras drogas ilícitas também subiu. A experimentação de substâncias sintéticas e psicodélicas aumentou na última década: o uso de ecstasy passou de 0,76% para 2,20%; o de alucinógenos, de 1,0% para 2,1%; e o de estimulantes sintéticos (ATS), de 2,7% para 4,6%.

O intervalo de dez anos entre uma edição e outra impõe limitações ao estudo e à análise das políticas de combate e redução de danos, diz Madruga. Ela defende maior regularidade em levantamentos epidemiológicos, acompanhados de estudos toxicológicos.

Apesar disso, os achados reforçam a necessidade de políticas de prevenção voltadas aos jovens, especialmente às meninas. A psiquiatra afirma que essas ações devem considerar a cultura local e ser implementadas principalmente no ensino fundamental 2 (6º ao 9º ano), fase crucial para retardar ou evitar a experimentação.

Um ponto central é adiar o início do consumo de álcool: começar a beber cedo aumenta a vulnerabilidade a outras drogas, não como porta de entrada, mas por elevar riscos ligados à impulsividade e à dificuldade de recusar ofertas.

Madruga ressalta que políticas sem comprovação científica podem ser ineficazes e até ampliar o consumo. Ela cita o programa #Tamojunto, da Senad (Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas), voltado a estudantes do 8º ano, com aulas, oficinas para pais e atividades focadas no desenvolvimento de habilidades sociais para resistir à pressão do uso.

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