TJ-SP decidiu que atuação da GCM para acordar e revistar moradores de rua é ilegal
Rovena Rosa/Agência Brasil
A atuação da Guarda Civil Metropolitana ao sair às ruas para abordar e revistar moradores em situação de rua, incluindo os que estão dormindo, sem qualquer sinal de participação em crime, é ilegal. Alex Tajra / Repórter da revista Consultor Jurídico
A posição é da 16ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, que absolveu uma mulher que morava nas ruas do centro da capital paulista e fora condenada a 10 meses e 24 dias de detenção por desacato e lesão corporal. Ela foi detida em dezembro de 2019, durante o que se chamou de “operação Natal” — ação da GCM para acordar e revistar pessoas em situação da rua na capital durante as comemorações da data.
Durante uma dessas abordagens, a mulher revistada pelos guardas deu um soco em um dos agentes e xingou um deles de “viado, biscate e filhos da puta”, conforme consta nos autos. Segundo a polícia, ela confessou, mas, em juízo, a mulher declarou que apenas se defendeu das agressões dos guardas.
O Ministério Público de São Paulo pediu então sua condenação, que foi acatada pela primeira instância. A Defensoria Pública de São Paulo recorreu, alegando que atuação ilegal da GCM e que a lesão corporal foi causada em sede de legítima defesa contra agentes do Estado. O MP-SP manteve sua posição para condenação.
A 16ª Câmara mandou o juízo de piso dar outra sentença tendo em vista os argumentos da Defensoria, mas mantendo a condenação.
O desembargador Otávio de Almeida Toledo, relator da apelação, foi incisivo: “Duas conclusões relevantes atestam a flagrante ilegalidade da atuação dos guardas civis: a primeira, que não havia fundada razão para suspeita da prática de crime; e a segunda, que não é aceitável, até em termos de preservação da dignidade humana, que agentes estatais que sequer eram policiais! — fossem destacados, específica e expressamente, para incomodar pessoas miseráveis em situação de rua.”
Conforme o depoimento dos guardas, que foi contraditório, a “operação serve para acordar e retirar moradores de rua dormindo no local” e que a “retirada” se dava “acordando os indivíduos verificando se estava tudo ‘ok’, se não tinham drogas”. No caso em si, no entanto, não houve registro de apreensão de drogas, nem de denúncia por tráfico.
Segundo Toledo, é inaceitável que guardas sejam destacados para abordar e revistar arbitrariamente pessoas em situação de rua “apenas para liberarem as ruas do centro para as compras da época do Natal”.
“A manifestação não violenta de discordância a ato manifestamente ilegal de autoridade pública não pode encetar represália criminal.”
“Dessa forma, a resposta ao caso concreto é simples: não é lícita a atuação de guardas municipais quando saem em missão de abordar e revistar moradores de rua, mormente quando surpreendidos dormindo e sem qualquer sinal de que poderiam estar praticando crimes”, sentenciou o magistrado.
Toledo foi seguido pelos desembargadores Guilherme de Souza Nucci e Leme Garcia.
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Processo 1523479-33.2019.8.26.0114
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