Minas 247 - Logo depois que a edição da revista Veja foi divulgada, as primeiras manifestações vistas, ouvidas e lidas na mídia foram de condenação ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Como se sabe, ele foi acusado por Veja de ter chantageado o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. No domingo e na segunda-feira, logo depois de inaugurada a polêmica, a opinião corrente era que Lula teria cometido falha gravíssima que poderia ter gerado uma crise institucional. A oposição passou a pedir seu depoimento na CPI do Cachoeira.
Aos poucos, porém, a gangorra da opinião pública - ou da mídia, como se queira - começou a mudar. Jornalistas influentes e gente ligada ao mundo das leis passaram a questionar o ministro do Supremo. O portal Uol chegou a pôr em dúvidas as declarações de Gilmar em entrevista à TV Globo. Divulgou um laudo de perícia feito em cima da frequência de voz do ministro, apontando trechos “fraudulentos e suspeitos”.
Nesta quinta-feira, por exemplo, o experiente jornalista Jânio de Freitas tocou num assunto delicado mesmo para quem defende Gilmar Mendes no caso: “O encontro, no escritório de Nelson Jobim, foi em 26 de abril. Por que só passado um mês Gilmar Mendes quis dar à "Veja" sua versão do que Lula lhe teria dito?”, questiona o jornalista em sua coluna na Folha de S. Paulo.
A pergunta procede. Se Lula não cometeu chantagem, não há denúncia, apenas a manifestação pessoal de um cidadão em conversa privada. Se há chantagem, e se isso é grave, por que Gilmar Mendes demorou um mês para percebê-la? O PSOL, que antes havia se unido ao PSDB, DEM e PPS pedindo investigação da conduta de Lula, protocolou representação que questiona a conduta de Mendes. O servidor público Cícero Batista Araújo Rôla, que é filiado ao PT e secretário-geral da CUT no Distrito Federal, registrou pedido de impeachment do ministro na presidência do Senado.
Os aliados de Lula, no início da semana ainda paralisados com a notícia - muitos criticaram, à boca pequena, o fato de o ex-presidente encontrar-se com um desafeto do PT, e no escritório de outro desafeto, o ex-ministro Nelson Jobim -, aos poucos partiram para o ataque. A presidenta Dilma Rousseff, durante entrega do Prêmio Objetivos do Milênio Brasil, fez uma homenagem ao seu antecessor: “As pessoas nos lugares certos e na hora certa mudam processos e transformam a realidade”, afirmou a presidenta, propondo a homenagem. A plateia aplaudiu de pé e cantou, em coro, “Olé, olá… Lula, Lula”.
Até um ministro do Supremo entrou na polêmica. Mais do que isso: defendeu Lula e criticou o colega de STF. Marco Aurélio Mello, o segundo mais antigo dos 11 ministros, considerou “legítimo” e “normal” que Lula manifetasse sua opinião sobre a data mais conveniente para o julgamento do mensalão. "Primeiro, porque é um leigo na área do direito. Segundo, porque integra o PT. Portanto, se o processo envolve pessoas ligadas ao PT, obviamente, se ocorrer uma condenação, repercutirá nas eleições municipais".
Opinião parecida com a manifestada dias antes pelo jurista e professor da USP Dalmo Dallari. Em entrevista ao 247, Dallari, antigo desafeto de Gilmar Mendes, afirmou: “Ainda que Lula tenha feito referências ao mensalão, é duvidoso se isso teria tanta implicação jurídica, pois parece ter sido numa conversa informal, feita na casa de um amigo comum dos dois”.
A Embaixada da Venezuela no Brasil entrou em campo condenando Gilmar Mendes. Ela respondia à manchete do jornal O Globo, com fala do ministro do Supremo, segundo a qual o “Brasil não é a Venezuela de Chávez, onde o mandatário, quando contrariado, manda até prender juiz”.
Na boca de um político ou jornalista, a frase não teria nada demais. Mas saída de um membro da mais alta corte do Judiciário do Brasil, que mantém relações diplomáticas com o país citado? A embaixada venezuelana divulgou nota: “Recorrer à desinformação para envolver a Venezuela em debates que dizem respeito apenas aos brasileiros é uma atitude indecorosa – ainda mais partindo de um ministro da mais alta corte da nação irmã – e não reflete a parceria histórica entre Brasil e Venezuela”, disse o embaixador no Brasil, Maximilien Arveláiz.
Até o assumidamente conservador jornal O Estado de S. Paulo, geralmente hostil a Lula, passou a condenar a atitude de Gilmar. Em editorial, também classificou como “tardia” a denúncia do ministro, e ainda faz uma crítica indireta ao suposto uso, por parte de Gilmar Mendes, de avião particular cedido pelo senador Demóstenes Torres (DEM): “Certa vez, ao apoiar a divulgação individualizada dos salários do funcionalismo, o atual titular do STF, Carlos Ayres Britto, observou: ‘É o preço que se paga pela opção por uma carreira pública no seio de um Estado republicano’. No caso da magistratura, a conta inclui a recusa a convites que outros cidadãos podem aceitar com naturalidade.”
Para quem ainda duvida da mudança em curso na opinião pública basta ler os novos “gritos” do blogueiro da revista Veja, Reinaldo Azevedo. Defensor maior das teses da oposição ao governo petista - mais até do que os próprios membros do PSDB e do DEM -, ele agora afirma: “Está em curso uma operação para tentar desestabilizar Mendes e forçá-lo a se declarar impedido de julgar o mensalão”. Reinaldo vai além: “Trata-se de uma ação ampla, que encontra eco até mesmo dentro do tribunal”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário