Projetos de lei como o PLS 580/2015 podem soar bem aos ouvidos da parcela da sociedade que, ao fim e ao cabo, defende mais a vingança do Estado do que a ressocialização do criminoso
Editorial, Estadão
A maioria dos membros da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado sucumbiu à sedução do aplauso popular e ignorou flagrantemente a Constituição. O colegiado aprovou o Projeto de Lei (PLS) 580/2015, de autoria do ex-senador Waldemir Moka (MDB-MS), que obriga presos a ressarcirem o Estado pelos gastos gerados por sua detenção. Nos casos em que os detentos não tenham meios para arcar com as despesas – a esmagadora maioria, é razoável inferir –, a dívida terá de ser paga com trabalho, por meio de um desconto de até 25% dos rendimentos do apenado. O projeto prevê ainda que, em caso de inadimplência, os presos serão cobrados nos mesmos moldes das ações de cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública.
O texto aprovado foi um substitutivo apresentado pela senadora Soraya Thronicke (PSL-MS), que incluiu alterações que dizem respeito aos presos provisórios e condições de ressarcimento em caso de absolvição ao final do processo. A parlamentar afirma que mais de 46 mil pessoas se manifestaram favoravelmente ao PLS 580/2015 no portal de consultas públicas do Senado, o e-Cidadania. Apenas cerca de 1.400 se opuseram. “Não podemos ignorar que, por essa amostra, 97% da população brasileira quer que todo preso arque com seus custos (de reclusão). Eu escuto a voz do povo e, como sua representante neste Parlamento, não posso ser contrária a este projeto”, disse a senadora.
Há sérios problemas nesta declaração. O primeiro, e mais evidente, é a falta de clareza da senadora sobre a natureza do cargo que ocupa. Segundo, a parlamentar toma como uma fiel representação da vontade da maioria do povo brasileiro uma consulta feita por meio da internet sem qualquer metodologia definida. Por fim, e não menos importante, Soraya Thronicke pressupõe que a “voz do povo” esteja sempre correta.