Vênia máxima, eleição de Ana Arraes para o TCU é uma vergonha! Tribunal vira palco de ambições pessoais e sai rebaixado. Campos substitui o nepotismo pelo “matrismo”
A deputada Ana Arraes (PSB-PE), mãe do governador Eduardo Campos, (PSB) foi eleita nesta quarta-feira para a vaga que estava aberta no Tribunal de Contas da União. No momento em que o país discute “transparência” e em que o tema chega a ser motivo de encontro de chefes de estado, o resultado chega a ser vergonhoso. Qual é a especial qualificação de Ana para o cargo? Ora, ela é mãe de Campos. Já se conhecia o “nepotismo”. Está inaugurado no Brasil o “matrismo”, para continuar na origem italiana da palavra. Uma piada!
O TCU é um órgão de assessoramento do Legislativo e de vigilância dos gastos públicos. Ana é deputada, é verdade. Mas o seu cabo eleitoral foi um governador de estado, também seu filho, que não poupou esforços e, indiretamente, dinheiro público para elegê-la. A coisa beirou o acinte. Na sessão de ontem da Comissão de Finanças e Tributação, estavam presentes o vice-governador de Pernambuco, João Lyra; o secretário da Casa Civil do Estado, Tadeu Alencar, e Luciano Vazquez, presidente do Laboratório Farmacêutico do Estado de Pernambuco, empresa de economia mista, vinculada à Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco. UMA DAS FUNÇÕES DO TCU É ZELAR PELA CORRETA APLICAÇÃO DO DINHEIRO PÚBLICO, REITERO.
Marquês de Sade, é verdade e não piada, gostava de uma orgia com ordem, com método, com ciência.
Eduardo Campos resolveu fazer da candidatura da mãe uma espécie de teste de seu prestígio nacional e de sua capacidade de articulação. A vaga no TCU se tornou um objeto de troca de mercadorias políticas. Contou com o apoio de Lula, claro, porque, o petista o quer como um aliado. Mas, como o governador está por aí, como um rapaz “casador” para 2014, cumpria ampliar o leque de alianças. Com Aécio Neves, o troca-troca passou pela candidatura à Prefeitura de Belo Horizonte. Aparentemente, os tucanos de Minas cederam tudo, até as penas — se foi acordo bom-de-bico, o tempo dirá: o PSDB abre mão, mais uma vez, de ter candidato próprio à Prefeitura da Capital (ficará 24 anos longe do cargo! Partido forte é assim!), mesmo que fique fora de uma eventual aliança formal entre PSB e PT. E ainda deu apoio à mãe de Campos. O que levou em troca? Por enquanto, os ternos olhos azuis. Vamos ver depois. O governador, que tem um acordo operacional, ou algo assim, com Gilberto Kassab também contou com o apoio do prefeito. Certamente isso garantiu votos do PSD, em formação, para a sua mãe.
Um órgão de assessoramento do Parlamento e de vigilância do bom uso do dinheiro público se tornou mero palco do exercício de poder de um líder regional com aspirações à liderança nacional. Outros políticos que estão se deslocando em campo tentando imaginar onde estará a bola em 2014 também se apresentaram. Ora, fosse pela liderança natural entre seus pares, fosse pelos serviços relevantes prestados ao Congresso e ao país, fosse pela formulação de políticas públicas conseqüentes — ou seja, contassem os critérios técnicos —, é evidente que Aldo Rebelo (PCdoB-SP) deveria ter sido o eleito. Embora o Planalto não fosse hostil à sua candidatura, várias máquinas acabaram convergindo para Ana Arraes. Ela obteve 222 votos; Aldo ficou com 149. Houve ainda quatro outros candidatos.
Uma eleição em colégio tão pequeno, em que o pior vence o melhor em razão do apadrinhamento, é necessariamente ruim para o país. Indicações para o TCU sempre são políticas; não há novidade nisso. A disputa por uma vaga no tribunal como parte de uma disputa eleitoral vindoura, no entanto, é coisa inédita. A instituição sai, como tem sido hábito, rebaixada do embate.
Campos alimenta pretensões presidenciais. A esta altura, não duvido que haja gente admirada com a sua capacidade de articulação. É o tipo de “competência” que faz bem ao “competente” e que condena o país. Sou um homem conservador, ortodoxo mesmo: entre o melhor e o pior, acho que o melhor tem de vencer. “Ah, Reinaldo, na democracia nem sempre é assim”. Eu sei! Ocorre que, no caso, não foi a democracia que fez a diferença, mas a sua aplicação pervertida. Quais outras instituições serão objeto da manipulação desses “novos líderes” em busca de espaço? Ademais, constate-se: o que houve de novo nessa disputa pelo TCU é tão velho como o Brasil.*Por Reinaldo Azevedo