Goleiro Douglas relata drama aos 17 anos: 'Não entendia por que eu'
Sensação do BR-17, goleiro do Avaí já teve de enfrentar câncer no testículo
Felipe Pereira*Do UOL, em São Paulo
Douglas, o goleiro do Avaí que fechou o gol no jogo contra o Grêmio, estava careca aos 17 anos. Enquanto colegas de sua idade raspavam o cabelo por passar no vestibular, ele ficava sem cabelo por conta da quimioterapia. O tratamento foi necessário porque uma cirurgia não retirou todas as células malignas instaladas no testículo esquerdo. Houve náusea, vômito e calvície. Só não houve desespero.
"A família e amigos desacreditavam mais do que eu. Claro que teve dias que fiquei cabisbaixo, não entendia por que eu. Senti todos os efeitos colaterais - náusea, vômito, perda de cabelo - mas eu acreditava sempre. Sentia que Deus estava cuidando de mim. Foi como se eu tivesse vivido uma história de um livro. Não fiquei com rancor do que aconteceu comigo".
A doença foi diagnosticada em 2007, quando Douglas defendia o Galo Maringá. Ao invés de planos para disputar a Copa São Paulo, ele passou 10 meses em tratamento. No final, ia ao treino apenas para assistir aos companheiros. A imunidade baixa impedia esforço físico.
O goleiro diz que na época não tinha noção do tamanho do desafio que enfrentava. E ele diz que se sente bem ao contar os dias difíceis. Douglas avalia que a dificuldade moldou o homem e o profissional em que se transformou.
"Eu lembro deste momento com alegria e sempre oportunidade de testemunhar o que passei, compartilhar experiência. Uma prova de que para Deus não há impossível. Sabia apenas que não ia morrer, nem perder a carreira".
Um milagre nos braços
A doença estava curada e Douglas podia seguir a carreira. Mas o médico falou que ele deveria ficar com sequelas. "Depois que passei pelo tratamento de quimioterapia, o oncologista falou que provavelmente eu não poderia ter filho. Eu tinha probabilidade muito alta de ser estéril. Mas em 2014, quando estava no Caxias, recebi a notícia que minha mulher estava grávida e o Davi vai fazer 3 anos".
Douglas conta que escolheu o nome antes mesmo de a mulher fazer a ultrassonografia. Sabia que seria um menino. Ele diz que não tinha medo de não ser pai porque confiava em Deus. Ainda assim, contou tudo para a mulher para que soubesse do câncer no testículo.
"Toda vez que pego ele no meu colo, tô pegando um milagre nas minhas mãos. Eu sei o que passei no tratamento e as palavras que ouvi do médico".
Passagem pelo Irã
Douglas nasceu em Candelária, uma dessas pequenas cidades de colonização alemã do Rio Grande do Sul. Saiu de casa aos 15 anos para treinar em um time do interior de São Paulo que nem existe mais. Depois do câncer, ele estava sem jogar no Galo de Maringá e resolveu aceitar uma proposta do Irã.
O atleta tinha poucas informações sobre o novo lar e muitas coisas que imaginava não se confirmaram. Ele conta que a passagem pelo Irã foi cheia de surpresas boas e as impressões erradas logo se dissiparam.
"As pessoas têm a imagem de um país mais fechado para estrangeiros, um povo que não é tão pacífico, tão receptivo. E muitos associam o Irã com algum conflito. Lá dentro é super tranquilo. Diferente do Iraque e Afeganistão, que tem tropas estrangeiras, o Irã não tem disputa por poder."
Depois de defender vários clubes menores, o goleiro chegou ao Corinthians ano passado. Ficou sem espaço quando foi definido que Cássio e Walter iriam permanecer no clube. Ainda assim, ele avalia que a contratação serviu como entrada em um novo patamar na carreira.
Após uma passagem com lesões e sem oportunidades pelo Grêmio, foi emprestado ao Avaí neste ano. No último domingo, fez o jogo da vida. Defendeu pênalti, fez sete defesas difíceis e ajudou o time a sair da zona de rebaixamento.
Ele passou o dia seguinte em Candelária dando atenção aos parentes e amigos. Disse que nem teve tempo de rever os lances da partida.
Mas a prova do sucesso foi ter dado sete entrevistas e ter as defesas comentadas por todos com quem encontravam. Douglas não olhou os memes e a maioria das diversas mensagens que recebeu. Explicou que vai esperar voltar a Florianópolis e ao turbilhão que é a vida de goleiro de time de Série A. O goleiro acredita que seu momento está chegando.
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