por Ligia Formenti | Estadão Conteúdo
O Conselho Federal de Medicina (CFM) disse que vai recorrer à Justiça e a fóruns internacionais contra as más condições de atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS). Levantamento feito pela entidade, apresentado ontem ao ministro da Saúde, Ricardo Barros, mostra que quase metade (45%) das Unidades Básicas de Saúde funcionava com estrutura precária no ano passado. Os problemas vão desde falta de sanitários para deficientes à ausência de equipamentos considerados indispensáveis para o atendimento, incluindo falta de itens básicos de higiene, como pias ou sabonete líquido. Os dados do CFM foram coletados entre 2015 e junho deste ano. Em 2016, por exemplo, foram visitadas 1.122 unidades em todas as regiões do País. Desse total, 15% não tinha estetoscópio. Até mesmo termômetro estava em falta em 8% das unidades. Em 15% dos serviços, faltava toalha de mão e em 6%, pias e lavabos. Os números foram apresentados ontem, em uma clara reação à afirmação feita pelo ministro da Saúde, semana passada, de que médicos deveriam parar de fingir que trabalham. A declaração piorou ainda mais a já tensa relação entre entidades de classe e o Ministério da Saúde. Desde a semana passada, médicos de várias regiões começaram a organizar marcha para pedir mudanças na pasta. "Não são os médicos que não querem trabalhar. São os médicos que não têm estrutura para exercer a sua profissão. Por isso, estamos indo à Justiça", disse o presidente do CFM, Carlos Vital, pouco antes de ser recebido por Barros. "Não queremos retratação, mas uma solução para a saúde", afirmou Vital. Ao receber as várias caixas contidas no relatório, Barros se comprometeu a analisar o material. O ministro avisou, no entanto, que a solução dos problemas apresentados pelo grupo estaria nas mãos de Estados e municípios, que têm competência para gerir os serviços. Barros confirmou sua intenção de universalizar o controle de frequência de médicos nos postos de trabalho a partir da biometria e de estabelecer um padrão de produtividade dos profissionais. Em resposta às críticas feitas pelas associações médicas sobre seu comentário do trabalho dos médicos, Barros disse que sua fala foi tirada do contexto. "Usei uma figura de linguagem", justificou. Mesmo assim, o ministro reforçou ser uma cobrança justa exigir que o médico cumpra a jornada de trabalho prevista em contrato, algo que, em sua avaliação, é desrespeitado por grande parte dos profissionais pelo País. "São 878 notificações contra gestores dizendo que profissionais não estão cumprindo a jornada". O ministro argumenta que se os médicos estivessem presentes nas 40 mil unidades de saúde 80% dos problemas na atenção básica poderiam ser resolvidos. "Sem a presença do médico, isso não é possível". Vital reconhece que nem todos os médicos cumprem a jornada de trabalho. "Mas são exceções que confirmam a regra", disse. Ele, porém, acrescenta haver problemas sérios no cadastro de estabelecimentos, onde são reunidos dados de distribuição das unidades de saúde e de profissionais que ali atuam. "Muitos já estão aposentados, já saíram de seus postos", observou. O levantamento do CFM, porém, não traz dados sobre ausência de profissionais no local de trabalho.
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