Foto: Zanone Fraissat/Folhapress
Pode-se ser favorável às reformas e, eventualmente, simpático ao governo, mas é necessário admitir o óbvio: nesta sexta-feira, o país parou. Por meio de sindicatos, os contrários às reformas acionaram os mecanismos que controlam e fizeram a paralisação que, de fato, teve feitio de Greve — que, se não foi Geral, tampouco foi localizada. Não há eufemismo possível: o país parou e mandou um recado claro: mudar o status quo não vai ser tão simples quanto o governo e o mercado querem crer.
A adesão dos trabalhadores dos meios de transporte coletivo viabiliza a greve; limita-se, no entanto, a greve a isto? Não. A paralisação do transporte é uma fundamental mão na roda: como percorrer as longas distâncias nas grandes cidades e chegar até o trabalho sem a condução? Mas, não foi apenas isso: professores, mesmo das escolas particulares, aderiram e já haviam antecipado a suspensão das aulas; em todo o país, bispos da Igreja Católica (CNBB) deram apoio; outras categorias também pararam.
Em várias cidades, a sexta-feira pareceu, então, um feriado chocho, vazios e sem festa. Em São Paulo, foi o início de um feriadão frio: casa, cobertor, TV e pipoca. Mas, também não foi só isso: em vários cantos do país — São Paulo, inclusive — os manifestantes se impuseram, a polícia reagiu: o pau comeu e a borracha cantou, revelando que não se fará reformas sem política ou sem conflito. Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper.
Verdade, não se saberá ao certo se as pessoas não foram ao trabalho exatamente porque aderiram ao protesto contra as reformas do governo ou simplesmente porque não tinham como ir. A opinião pública sobre as reformas seria mais bem percebida houvesse manifestações pelas ruas, daquelas que se contam pela quantidade de quarteirões da Av. Paulista, por exemplo.
Mas, de todo modo, pesquisas afiançam que ninguém tem muita simpatia pelas reformas. Quem, afinal, teria simpatia por quem propõe a extração de dentes? Em situações como esta, o máximo que se pode pretender é fazer compreender a inevitabilidade do processo.
Tanto faz se por desculpa, omissão ou adesão, o fato é que o país parou e em alguns lugares houve confronto com a polícia. O ambiente está mais quente: junte-se o descrédito resultante da Operação Lava Jato com um governo que tem o passivo do impeachment e reformas que ferem interesses e será muito difícil estabelecer harmonia. Parlamentares, desde sempre reticentes com as reformas, sabem que agora terão mais argumentos e desculpas: o medo da sociedade, a necessidade e abrandar as medidas. No mínimo, a negociação por parte do governo será muito mais custosa.
Naturalmente, o governo procura diminuir o impacto da paralisação; o discurso oficial, no entanto, não inova; é pura tergiversação. O presidente da República se esquiva; surge na tela da TV, no principal telejornal do país, apenas o ministro da Justiça: diz que a população manifestou seu apoio às reformas. Onde? Por nota oficial, Michel Temer afirma acreditar na força da unidade do país. Que unidade?
Na guerra das reformas, a comunicação parece batalha perdida: objetivamente, o governo não soube explicar sua necessidade. Menos ainda, convencer que o Congresso é — com todos seus problemas — o meio que se tem para conduzir o debate. Entre o descrédito político e a modificação do status quo de vários grupos de interesses não consegue esclarecer qual, afinal, é o “interesse geral”.
Fruto do Parlamento — de seus vícios e suas taras —, o governo olha, exclusivamente, para o Congresso. E se dedica aos mais que manjados mecanismos de “convencimento parlamentar”: a cooptação e o fisiologismo. Não bastam. Esquece-se da sociedade ou, antes, limita a sociedade aos ciclos, fóruns e reuniões empresariais. Acredita fazer sucesso, sem saber que, na verdade, prega a convertidos. Política de massas é ação mais ampla e complexa; requer comunicação, convencimento, atração de lideranças. O amassar barro, criar consensos; minimizar inimigos, jamais fortalece-los. Tudo em http://carlosmelo.blogosfera.uol.com.br
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