Presos enviaram cartas à Defensoria Pública relatando que diretores de cadeia terceirizada recebiam dinheiro para beneficiar facções criminosas
Divulgação/Umanizzare
Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), no Amazonas, é administrado pela empresa terceirizada Umanizzare
Pouco antes da chacina que deixou 56 presos mortos no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus (AM), dois internos haviam enviado cartas ao Poder Judiciário do Amazonas com denúncias sobre casos de corrupção envolvendo diretores do presídio. O massacre ocorreu entre os dias 1º e 2 de janeiro e durou cerca de 17 horas.
As denúncias, feitas por meio de cartas assinadas pelos presos Alcinei Gomes da Silveira e Gezildo Nunes da Silva foram entregues à Defensoria Pública do Amazonas no dia 10 de dezembro. Nos materiais, os detentos afirmam que diretores da unidade penitenciária recebiam dinheiro de facções criminosas e, em troca, liberavam a entrada de armas, drogas e celulares na prisão.
Conforme a Defensoria, os manuscritos foram entregues ao juiz Luis Carlos Valois, titular da Vara de Execuções Penais. Os documentos foram anexados ao processo de Gezildo no dia 14 de dezembro.
Os presos relatam nas cartas que estavam sendo ameaçados de morte por saberem do esquema de corrupção. Em um dos trechos, Alcinei diz: “eles [diretores] são corruptos e recebem dinheiro da facção criminosa facilitando a entrada de drogas e celulares e [também] a última fuga no Compaj”.
Na página do Tribunal de Justiça do Estado na internet, há registro de uma petição protocolada às 12h36 de 14 de dezembro, que foi reunida ao processo. Os detalhes não podem ser acessados eletronicamente. Entretanto, de acordo com o defensor público Arthur Sant’anna Ferreira Macedo, que defendia Gezildo, trata-se de um pedido para que a Justiça determinasse que as denúncias fossem apuradas e que o detento fosse transferido para o Centro de Detenção Provisória (CDP) como forma de protegê-lo e assegurar sua integridade física.
O Poder Judiciário entrou em recesso seis dias depois dos registros, no dia 20 de dezembro, e os pedidos do defensor público não chegaram a ser analisados. Gezildo (que cumpria pena por furto) e Alcinei (condenado a 60 anos de prisão por matar a própria mãe, um irmão e tentar assassinar o pai) foram mortos na rebelião ocorrida entre os dias 1º e 2 de janeiro.
Responsabilidades
A administração do Compaj é de responsabilidade da empresa terceirizada Umanizzare, que administra outros cinco estabelecimentos prisionais no Estado e mais dois em Tocantins. Por meio de nota enviada à imprensa, informou que o comando das unidades cabe a servidores públicos indicados pela Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap). Em 2016, o governo amazonense pagou R$ 302,2 milhões à Umanizzare pela gestão do complexo.
Na última quinta-feira (5), depois de uma vistoria em Manaus, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, declarou que a “responsabilidade visível e imediata” do massacre ocorrido no Compaj é da Umanizzare. “Basta verificar os fatos para ver que houve falha da empresa. Não é possível que entrem armas brancas e armas de fogo, e que todos saibam antes, pela internet, por meio de selfies de presos. Quem tinha a responsabilidade imediata para verificar essa entrada e a festa de final de ano é a empresa que faz a segurança.” Imagens divulgadas após a barbárie mostram presos com armas e aparelhos telefônicos.
A assessoria do Tribunal de Justiça informou que o juiz Luís Carlos Valois não recebeu em mãos o pedido da Defensoria Pública e os documentos citados, e nem sequer foi procurado pela defesa dos presos para tratar do assunto.
“A Vara de Execuções Penais recebe centenas de documentos diariamente, inclusive de forma eletrônica e, no caso de informações sobre risco de vida de detentos, estes documentos são encaminhados pela Justiça também ao Ministério Público para ciência e manifestação, bem como à Secretaria de Administração Penitenciária do Estado, visando a obtenção de dados relacionados ao apenado. O trâmite jurídico segue o que determina a Lei de Execução Penal”, afirma o juiz por meio de nota.
A Presidência do Tribunal de Justiça do Amazonas determinou que os fatos sejam apurados pela Corregedoria-Geral de Justiça, que instaurou procedimento nesta terça-feira (10). A Secretaria Estadual de Administração Penitenciária e a Umanizzare ainda não se manifestaram. * Com informações da Agência Brasil
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