Maria com o namorado e a filha dele, em foto tirada este ano – Reprodução
Tudo que Maria Fernandes queria era tirar um cochilo.
A garçonete, de 32 anos, que se dividia em três empregos na rede mundial de cafeterias Dunkin’ Donuts, em Nova Jersey, foi protagonista de uma tragédia que virou símbolo da precarização e sofrimento dos trabalhadores americanos de meio período e baixa remuneração.
Maria utilizava o trajeto entre as cidades de Newark, Linden e Harrison, onde ficava cada uma das lojas em que era garçonete, para tirar pequenos cochilos dentro do seu automóvel, um Kia Sportage 2001. Na manhã de 25 de agosto, após sair do turno da noite, às 6 horas da manhã, e estacionar o carro na loja de conveniência da rede Wawa para tirar alguns poucos minutos de soneca, Maria não acordou.
Seu corpo foi encontrado à tarde por um funcionário da loja. Aparentemente, a garçonete morreu intoxicada com monóxido de carbono e outros gases gerados pelo galão de gasolina que costumava carregar na mala do carro para evitar deixar o tanque no vermelho. A morte de Maria se tornou um ícone das dificuldades enfrentadas pelo “exército” de trabalhadores de redes de fast-food nos EUA, que convivem com salários baixíssimos e precisam trabalhar por longas jornadas para fechar as contas do mês. Segundo seus amigos, Maria ganhava pouco mais de US$ 8,25 por hora — o salário mínimo em Nova Jersey — e passava dias e noites trabalhando sem parar. Às tardes, era possível encontrá-la em Newark; à noite, ela estava sempre em Linden; nos fins de semana, ela batia ponto em Harrison.
Filha de imigrantes portugueses Maria trabalhava na rede Dunkin’ Donuts há quatro anos. A garçonete, que nunca frequentou a faculdade e não conseguiu realizar o desejo de se tornar esteticista e cabeleireira porque não tinha dinheiro para pagar o curso, começou a acumular as duas jornadas há um ano e meio. A proprietária do imóvel que Maria alugava, na periferia de Newark, chegou a relatar que a moça atrasou algumas vezes o aluguel de US$ 550 do pequeno apartamento.
Michelle King, porta-voz da Dunkin’ Brands (dona da Dunkin’ Donuts), declarou em comunicado oficial que os gerentes dos restaurantes em que Maria trabalhava a descrevem como empregada-modelo — embora tenha dito que não poderia informar detalhes sobre os turnos de Maria porque essas informações só eram conhecidas pelas franquias, cujos contatos Michelle recusou-se a fornecer.
Grande parte da indústria de fast-food, em particular, foi construída sobre a percepção ultrapassada de que os empregos de meio período são apenas para estudantes universitários e de ensino médio que querem ganhar uns trocados. A realidade, entretanto, é bem diferente. Em 2013, 4,7 milhões de trabalhadores norte-americanos de meio período tinham mais de 25 anos de idade e um milhão deles possuíam mais de 55 anos.
O aumento do trabalho em meio período deve-se principalmente à crise econômica, porém, os empregadores começaram a perceber os benefícios de empregar grande parte dos trabalhadores nesse regime de contratação. Ao contar com força de trabalho em meio período, os empregadores podem evitar o pagamento de horas extras e benefícios como assistência médica. Embora Maria fosse descrita por seus gestores como uma empregada modelo, eles não quiseram contratá-la em tempo integral quando ela pediu. Fontes: New York Times e The Guardian
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