Bebê com mutação genética rara é tratado com terapia Crispr personalizada nos EUA. Técnica corrige enzima do fígado e evita transplante
Por Ana Luiza Figueiredo, editado por Bruno Capozzi
K.J. Muldoon foi o primeiro paciente do mundo a ser tratado com um tipo inovador de terapia genética (Imagem: Hospital Infantil da Filadélfia)

K.J. Muldoon nasceu prematuramente e, apenas dois dias após o parto, começou a apresentar sinais preocupantes: sono excessivo e dificuldades para se alimentar. Exames detalhados levaram a um diagnóstico grave — uma deficiência severa de CPS1 (carbamoil fosfato sintetase 1), condição metabólica causada por uma mutação genética que impede o corpo de eliminar adequadamente o excesso de amônia.
Edição genética personalizada salvou o bebê de um transplante de fígadoA ausência da enzima CPS1 no fígado de K.J. impedia a conversão da amônia, resultante da quebra de proteínas, em ureia.
Isso provocava um acúmulo tóxico de amônia no organismo, afetando órgãos vitais como o cérebro e o fígado.
Sem intervenção, o único caminho seria um transplante de fígado.
Mas K.J. teve sorte. A médica Rebecca Ahrens-Nicklas, responsável pelo seu caso, e o professor Kiran Musunuru, da Penn Medicine, já desenvolviam pesquisas com terapias Crispr aplicadas a mutações genéticas raras.
Em tempo recorde — cerca de seis meses — a equipe conseguiu criar e obter aprovação regulatória para um tratamento sob medida, algo que normalmente levaria anos.
Terapia foi aplicada em três doses com nanopartículas lipídicas
Entre fevereiro e abril, o bebê recebeu três doses da nova terapia, administradas por meio de nanopartículas lipídicas diretamente no fígado. A técnica corrigiu a mutação causadora da doença. Ainda é cedo para falar em cura definitiva, mas os sinais de melhora são evidentes: K.J. passou de um peso muito abaixo da média para a faixa entre o 35º e o 40º percentil e agora consegue ingerir mais proteínas.

KJ passou de um bebê muito doente para relativamente saudável após a terapia, e pode ir para casa em breve (Imagem: Hospital Infantil da Filadélfia)
O sucesso da terapia com K.J. pode servir de modelo para o desenvolvimento rápido de tratamentos personalizados para outras condições genéticas raras, segundo Musunuru. “Esse é o futuro da medicina”, afirmou o pesquisador, chamando o caso de “primeiro passo rumo ao uso de terapias de edição genética para tratar uma ampla variedade de doenças raras”.
O avanço também foi reconhecido por especialistas de fora da equipe. “É algo muito importante”, disse o médico Timothy Yu, do Hospital Infantil de Boston, que não participou do caso, mas acompanha os avanços na área.
K.J., como destacam os pais, sempre demonstrou força: “Ele levantava o punho como se dissesse que ia lutar”, contou o pai, Kyle Muldoon. “Sempre senti que ele estava aqui por um motivo e que seria especial.”
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