O crescimento do Brasil em ritmo mais lento e as intervenções do governo na economia — como nas margens dos bancos, na valorização do câmbio e na taxação da renda fixa — foram um balde de água fria na euforia dos investidores estrangeiros. Com uma contribuição da crise europeia, o dinheiro trazido por esses investidores — de fundos de investimento e fundos de pensão até fortunas de famílias e de empresas — para a compra de ações e títulos de renda fixa no país encolheu 40% no primeiro semestre, frente ao mesmo período de 2011: de US$ 12,4 bilhões para US$ 7,5 bilhões, segundo dados do Banco Central (BC). Para os grandes bancos de investimento, o Brasil que ilustrou a capa da revista inglesa “The Economist”, em novembro de 2009, com o Cristo Redentor literalmente decolando, ficou sem combustível. Ou “Lento e sem medalhas”, como classificou o banco americano Morgan Stanley em relatório na semana passada. Se havia euforia demais, o pessimismo agora se tornou extremo.
"O investidor está sempre de olho nas regras do jogo. E houve mudança de regra, como na atuação do governo no câmbio, o que corroeu o ganho dos estrangeiros. Isso afeta o humor do mercado", afirma o americano Alexander Gorra, estrategista-chefe do BNY Mellon ARX, a gestora do banco de Nova York. "Quando o estrangeiro olha o Brasil, ele olha de maneira relativa. A curto prazo, o país cresce menos."
E assim, os fundos globais de ações dedicados ao Brasil sofreram saques de US$ 1,5 bilhão neste ano por seus cotistas. Os fundos de ações tiveram resgates de US$ 1,4 bilhão, e os de títulos, de US$ 100 milhões. Os dados são da consultoria americana EPFR Global. Cameron Brandt, analista da consultoria, diz que os investidores têm “agressivamente” sacado do Brasil.
"O país é visto como uma peça da demanda chinesa por produtos básicos. E a economia chinesa está desacelerando", avalia Brandt.
México atrai capital brasileiro
Uma das maiores gestoras globais de recursos, a Franklin Templeton viu investidores sacarem recursos de seus fundos de ações dedicados ao Brasil, oferecidos exclusivamente na Coreia do Sul e Japão, conta Marco Freire, chefe de Investimento da área de renda fixa e multimercados.
"No mercado de ações, essa preocupação tem origem na desaceleração do Brasil e no ceticismo do mercado sobre a intervenção do governo em setores como o bancário e na própria Petrobras, no caso dos combustíveis", diz Freire. "Isso somou-se ao cenário externo ruim, o que afasta investidores de aplicações de risco."
A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) registra saídas de estrangeiros há quatro meses. São R$ 3,6 bilhões a menos na Bolsa brasileira desde maio passado. O Ibovespa, principal índice de ações do país, apresentava na sexta-feira uma queda de 4,15% em dólares no ano.
Segundo gestores de recursos, o temido tsunami monetário não passou pelo Brasil. O capital estrangeiro buscou outros emergentes, que crescem mais. Chamado de “novo Brasil” por uma parte do mercado, o México é um dos destinos desse dinheiro. A Bolsa de Valores mexicana avança 17,03% este ano, em dólares, no embalo do setor manufatureiro e de uma lua de mel entre investidores e o novo governo do país.
O diretor de Pesquisa para Emergentes do banco japonês Nomura, Tony Volpon, diz que clientes americanos e japoneses estão trocando o Brasil por apostas no México.
"O crescimento do Brasil apoiado em commodities valorizadas e aumento de consumo não vai sustentar uma expansão do país em 4% ao ano, como aconteceu na média dos últimos anos. O potencial de crescimento é menor do que se imaginava. É preciso fazer reformas e investir mais", afirma Volpon. "O mercado financeiro segue o sucesso. E, nesse momento, a economia do Brasil tem tudo, menos isso."
Além do México, Indonésia, Coreia do Sul e Turquia também entraram no foco do mercado. E, claro, esses países foram agrupados e ganharam um nome: Mist, algo como “névoa” em inglês. O autor do acrônimo é Jim O’Neill, economista do banco Goldman Sachs que também criou o termo Brics, grupo de emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia e China. A África do Sul foi mais tarde integrada ao grupo.
Volpon frisa, contudo, que o desalento de investidores não se resume ao “B” dos Brics.
"A China vive um processo de desaceleração econômica; a Índia sofreu recentes apagões de energia elétrica; a Rússia passou por eleições questionadas internacionalmente. Os Brics ficaram, em geral, menos atraentes."
Para os ex-presidentes do Banco Central Arminio Fraga e Gustavo Franco, os investidores estrangeiros exageram em suas avaliações. Segundo Arminio, sócio da gestora Gávea Investimentos, o Brasil passa por uma “desaceleração cíclica e influenciada pela crise europeia”. Para ele, no entanto, “nada mudou aqui”.
"O que mudou foi a percepção externa, que foi de muito otimista para muito pessimista", avalia Fraga. "O Brasil vai bem, mas tem desafios para sustentar um crescimento mais elevado: investir mais, educar melhor."
Gustavo Franco, sócio da Rio Bravo, usa a mesma analogia da capa da “Economist” para criticar os excessos.
"O Cristo nunca teve turbinas, jamais decolaria, tampouco se desfaria como no filme “2012”. Nesses termos, a normalidade do ciclo econômico fica parecendo uma alternância esquizofrênica entre céu e inferno", diz.
Nessa esquizofrenia, o Investimento Estrangeiro Direto (IED), destinado à atividade produtiva, caiu 8,5%, para US$ 29,7 bilhões entre os semestres. O fluxo segue acima da média dos últimos anos.
Para o governo, a atração de recursos externos está longe de ser tranquila, mas não se compara com a que o país viveu há quatro anos, quando a crise internacional imobilizou o mercado mundial e estancou os financiamentos para empresa. De acordo com fontes da equipe econômica, as companhias instaladas no país se capitalizaram e fizeram uma programação mais conservadora, que lhes deu mais autonomia em relação aos capitais internacionais.
"A situação é outra: está longe de ser tranquila, porque o mundo vive um momento complicado, mas é outra", diz o técnico.
No BC, a avaliação é que muitas das mudanças no fluxo são fruto da vontade do próprio governo, que mudou a legislação.
"Não há nenhum relato de empresas sem acesso ao mercado internacional", garantiu o chefe-adjunto do Departamento Econômico do BC, Fernando Rocha.
Segundo ele, apesar da queda em alguns fluxos, as contas externas do país estão em situação tranquila por causa do IED, que pode superar a expectativa do BC, de US$ 50 bilhões. De http://www.diariodepernambuco.com.br/
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