Para dimensionar o peso desses símbolos, a reportagem do Correio ouviu policiais penais, que convivem diariamente com detentos ligados às facções
Imagem: Correio/imagem gerada por inteligência artificial através do Adobe Firefly
Sinais com os dedos das mãos evidenciando os números ‘2’ ou ‘3’ que, antes, serviam como composição em uma pose descontraída na Bahia e, sobretudo, em Salvador, ganharam uma roupagem perigosa. Enquanto alguém usa os dois dedos para, por exemplo, fazer o símbolo da ‘paz e amor’ em um gesto, a interpretação está aberta para um apoio ao CV, uma das facções atuantes no estado.
Para quem é roqueiro, por outro lado, o sinal que levanta três dedos, principalmente de forma lateral, pode ser visto como uma saudação para integrantes do BDM. Em um cenário de guerra entre as duas facções no estado, fazer qualquer um dos dois pode levar alguém à morte. Símbolos com dedos, desenhos e listras no cabelo podem ser interpretados como apoio a grupos criminosos.
A execução a tiros dos irmãos Daniel Natividade, de 24 anos, e Gustavo Natividade, de 15, vítimas de traficantes do Comando Vermelho (CV), surpreendeu a todos. Os dois, que eram músicos do bloco afro Malê Debalê e não tinham qualquer envolvimento com o crime, foram mortos horas depois de posarem para uma foto durante um passeio em Emissário de Arembepe, área turística de Camaçari, na Região Metropolitana de Salvador (RMS).
Nas mãos, as vítimas e outras duas pessoas faziam o ‘sinal do 3’, o que, para seus assassinos, saudava a facção rival Bonde do Maluco (BDM). A polícia diz que identificou os suspeitos, mas não detalhou as investigações.
Para dimensionar o peso desses símbolos nas organizações criminosas, a reportagem do Correio ouviu policiais penais, que convivem diariamente com detentos ligados às facções e que se utilizam desses gestos como um marco identificador. Um policial, que prefere não se identificar, explica a dinâmica que evidencia o peso dos símbolos já na chegada dos presos nas penitenciárias que, atualmente, alocam membros de facções rivais em pavilhões diferentes. Todos são submetidos a uma espécie de ‘acareação’.
“A gente percebe [o uso dos sinais] assim que recebemos os presos. Quando eles adentram o pavilhão, os outros detentos começam com algumas perguntas, alguns linguajares e gestos para eles se identificarem, para verificar se eles realmente são de determinada facção. E vou mais além: não é só gestos, não. A depender, até próprias figuras em camisas, tipo Mickey e outras coisas mais significam que são de certa facção”, explica o policial, que ainda alerta para o uso de tatuagens que, de um tempo para cá, foram apropriadas pelas facções criminosas.
Sobre as tatuagens, um outro policial penal, que também não se identifica, cita alguns exemplos de símbolos presentes nos corpos de preso para mostrar pertencimento. “Apesar de hoje se falar sempre de BDM e CV, temos outras facções. Existe a Katiara, que é de Valéria e faz o uso do pentagrama em tatuagens para membros. No caso de membros do CV, que antes era o Comando da Paz (CP), é comum ver escorpiões tatuados. Na PM, existia até uma cartilha para alertar os policiais sobre isso”, relata a reportagem do Correio.
A cartilha citada já foi tema de reportagem do Correio que entrevistou o seu autor, Alden José Lázaro da Silva, que, na época, era Capitão da Polícia Militar da Bahia (PM-BA) e fazia parte do Departamento de Polícia Comunitária e Direitos Humanos.
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