Quando os líderes de uma empresa percebem que ela ou muda ou morre, devem estar preparados para o maior de todos os desafios: confrontar uma cultura estabelecida manipulando o DNA corporativo.
Mudança não é tudo igual não. Há quatro circunstâncias de mudança. Em cada uma se deve usar um tipo de ferramenta diferente para maximizar as chances de sucesso. Se você usar a ferramenta errada para a circunstância em que está, você perde. Veja:
- Quando Bill Gates percebeu, em 1995, que a Microsoft iria perder a guerra da internet, convenceu rapidamente a empresa a mudar de rumo graças a seu carisma e ao respeito que a galera da empresa tinha por ele. Gates usou o que chamamos de ferramenta de carisma para colocar a tropa a seu lado. Acreditaram nele ainda que inseguros quanto aos efeitos da estratégia que ele estava propondo. Churchill, durante a Segunda Guerra conseguiu efeito análogo. (OBS: Gates estava certo. Em pouco tempo a Microsoft matou a Netscape a assumiu a condição de ponto de entrada na rede por meio do Explorer)
- Steve Jobs utilizou o mesmo tipo de ferramenta e mais uma outra, ao voltar para a APPLE em 1996. A empresa estava quebrada após ter tido quatro CEOs em 6 anos. Jobs explorou o DNA que ele mesmo havia criado como fundador para motivar os funcionários a colaborarem com sua nova visão. Ele se apoiou em seu inegável carisma para empregar o que chamamos de ferramentas de cultura: ”Vamos tirar o foco de PCs, pois em PCs nós já perdemos. Vamos lançar outros produtos “insanelly great”, vamos mudar o mundo via dispositivos de mão”. Foi uma apoteose. O DNA da APPLE era o de uma cultura messiânica, épica, quase religiosa. Com base no entendimento disso é que vieram os produtos transformadores – iPod, iPhone, iPad… e o resto vocês já sabem…
- A NOKIA saiu da quase falência em 1992, para o maior valor de mercado da Europa, quinta marca mais valiosa do mundo e líder mundial em telecom em 2000. Para isso, saiu de uma série de negócios que geravam 90% de sua receita até então (até botas de borracha eles fabricavam). Um ambiente altamente turbulento (desregulamentação, privatização, novos entrantes, explosão de demanda, tecnologias digitais, internet em telefones celulares…) não permitia que a empresa soubesse em que estava realmente se metendo ao optar pelo foco em telecom. O CEO da Nokia, Jorma Olila, motivou as pessoas a agirem sem especificar muito o sistema organizacional (não havia sequer um organograma rígido). A Nokia cresceu 30% ao ano no período 1992-2000, com pessoas motivadas pela ideia de não deixar a empresa quebrar e determinadas a preservar o orgulho finlandês. Ferramenta de cultura também.
- Jack Welch mudou a GE nos anos 80 utilizando ferramentas de gestão: metas, indicadores, sistemas de avaliação de desempenho, sistemas gerenciais, planejamento estratégico, incentivos financeiros. Welch liderou uma mudança, não uma revolução, porque não estava pressionado por nenhuma crise iminente. Ele era um insider na GE e sabia que a empresa poderia melhorar muito em eficiência. Para isso introduziu uma séria de ferramentas de gestão. Tinha tempo, coisa que a NOKIA, Microsoft e Apple não tiveram em seus respectivos casos. Por isso pôde usar outro tipo de ferramenta até convencer os acionistas de que estava certo.
- A IBM de Lou Gestner na virada dos anos 80 para os 90 é que fez uma revolução. Todos os analistas diziam que a IBM só se salvaria se desmembrasse suas unidades, transformando-se em várias empresas independentes para extirpar os males do gigantismo. Lembre-se que a velha IBM estava em crise aparentemente terminal, e era considerada um dinossauro centralizado e lento. Gerstner vindo da AMERICAN EXPRESS para comandar a IBM já era um sinal de confronto. Nunca um outsider comandara a empresa. Usou a força de sua autoridade e a ausência de vínculos sentimentais com a organização. Confrontou a cultura na base do “manda quem pode”. Mudou geral, e fez valer a autoridade que lhe fora outorgada .Usou o que chamamos de ferramenta de poder para virar a IBM.
- No caso KODAK/FUJI ,vocês se lembram, estava claro para seus líderes de que tinham de mudar ou morrer, mas a mudança só ocorreu na FUJI, a KODAK não quis confrontar o DNA de sua cultura. Na circunstâncias em que estavam só ferramentas de poder resolvem. O que funciona é poder, força – não é carisma, não é cultura, não é gestão. Ferramentas de poder são usadas quando não há concordância sobre “o que” fazer para mudar, nem sobre “como” mudar. O líder manda e ameaça com retaliação pesada se não for obedecido.
- Repare que eu não disse que as ferramentas de poder devem ser usadas nessas circunstâncias, eu disse que elas têm de ser usadas nessas circunstâncias. O marechal Tito, que liderou a Iugoslávia durante longo período pós Segunda Guerra, era craque no manejo de ferramentas de poder. Ele era o chefe daqueles grupos étnicos disparatados e antagônicos que compunham a península dos Bálcãs, e conseguiu montar uma espécie de “nação artificial” por meio de um discurso assim: “olha, eu não quero saber se vocês concordam comigo, ou se concordam uns com os outros. O que eu quero é que vocês olhem para o cano da minha arma aqui e cooperem uns com os outros”. A Iugoslávia funcionou sob coerção assim durante décadas.
- Claro, na empresa não se trata de ameaçar ninguém de morte. Esse tipo de “ferramenta” é o que deve ser usado em situações típicas como, por exemplo, a da integração entre duas empresas após um processo de fusão ou aquisição. As ferramentas de poder são tipicamente: ameaças de demissão; ”Faça-se”; coerção. Isso quando a situação é tipo “península dos Bálcãs”. Quando há um mínimo de alinhamento nas concordâncias, é possível que ferramentas como negociação, planejamento estratégico e incentivos financeiros possam funcionar. Em ambientes de antagonismo exacerbado, onde ninguém concorda com nada, “planejamento estratégico” não produz nada além de um papel tipo “me engana que eu gosto”.
- A chave para o sucesso no uso de ferramentas de poder é ter autoridade para usá-las. Os gestores, às vezes, se vêem em circunstâncias “balcanizadas” mas não têm poder para usar as únicas ferramentas – as de poder – que produziriam resultados. Isso geralmente ocorre por razões políticas.
Você já entendeu. Na FUJI, um líder usou as ferramentas de poder. O nome dele é Shigetaka Komori, que ganhou carta branca do conselho da empresa para “passar o rodo”, e passou geral. Chegou chamando os gestores anteriores de “irresponsáveis, preguiçosos e medrosos que estavam matando a FUJI”. Não conheço outro líder japonês que tenha agido assim. Não é da cultura deles. Exigiu rapidez. Sacou fora quem não agiu rápido. Comprou empresas e integrou-as à jato. Atirou primeiro e fez pontaria depois.
Na KODAK tentou-se convencer a galera por meio de ferramentas mais soft. O tempo passava, passava… A empresa teve cinco CEOS em seis anos e nada acontecia. Por isso a KODAK se foi. A empresa não era pior que a FUJI, seu estilo de liderança é que era totalmente inadequado. Seu DNA era o de busca de produtos perfeitos, por isso ela pesquisava, refinava, otimizava… E o tempo passava… Enquanto isso, a FUJI atirava primeiro e fazia pontaria depois comandada por Komori e suas ferramentas de poder. De http://colunas.revistaepocanegocios.globo.com/
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