Miriam Leitão
O PT não se deu conta do risco fiscal que o país corre e, por isso, vai bombardear a única ponte que pode nos levar para fora desse precipício. Ter quase 7% de déficit nominal, ter déficit primário e uma dívida bruta que subiu 10 pontos percentuais em quatro anos é uma calamidade. Para corrigir o que fez, a presidente Dilma não tem o apoio sequer da sua ex-chefe da Casa Civil.
A senadora Gleisi Hoffmann quer impedir a reformulação do cálculo das pensões de viúvos e viúvas jovens. Ela devia fazer um favor a si mesma: ligar para o ministro Nelson Barbosa, do Planejamento, e perguntar quantas pessoas passaram a ter direito a pensão vitalícia com 20 anos ou menos no ano passado.
A resposta, 1.609. Depois, quantas, de 22 a 27 anos? 5.944. Essas pessoas não ficarão desamparadas. Pela proposta do governo, ao qual a senadora pertence, se o pensionista tiver até 21 anos, receberá auxílio por três anos; se tiver até 27 anos, receberá por seis anos. Quem, com esse prazo, não tem tempo de se inserir no mercado de trabalho e deixar de depender da ajuda do Estado?
Em seguida, ela deveria procurar saber como países ricos regulam as pensões por morte. Eles raciocinam o seguinte: se a pessoa é jovem e sem filhos, poderá trabalhar. Então, a pensão é temporária. Se tem filho menor, o tratamento é diferente, como na proposta feita pelo governo brasileiro. Não faz sentido algum que o Estado pague a essa pessoa, a vida inteira, uma pensão. Ela está em idade produtiva. Alemanha, Estados Unidos, Reino Unido. Nenhum país aceita a regra que está em vigor no Brasil atualmente: se uma pessoa, aos 80 anos, casar com uma pessoa de 20 anos, pagar um mês pelo teto e, em seguida, morrer, o cônjuge poderá receber pensão vitalícia pelo teto.
Deve também a ex-chefe da Casa Civil, que, de resto, já deveria saber isso, perguntar ao Ministério da Previdência qual é o déficit da previdência do setor público e dos trabalhadores do setor privado. A medida significará uma economia para este ano e para as próximas décadas. Ajudará o país a dar um passo, tímido que seja, na necessária atualização das regras de pensões e aposentadorias. O deputado Vicentinho, que é pessoa estudiosa, deveria fazer o mesmo e assim ilustrar seu pensamento, ainda prisioneiro da ideia sindicalista de que dinheiro público é um bem elástico. Não é não. Ou sai do nosso bolso, ou vira dívida que pagaremos. Nos casos extremos, como agora, a gastança sem lastro coloca o país na rota da recessão, inflação e da crise.
A presidente Dilma tem perdido força, como se viu neste começo de legislatura. E isso costuma dispersar apoios políticos, inclusive da base parlamentar. Quando o PMDB se afasta, é até compreensível. Há muito tempo ele virou um pêndulo que se deixa atrair pelo poder forte. O que há de mais espantoso é que os parlamentares do PT se rebelaram contra uma proposta feita pela presidente da República, filiada ao PT, para começar a corrigir a bagunça fiscal que o PT fez no mandato passado. O PCdoB fechou questão contra o ajuste. Deveria entregar então os cargos que tem no governo, a começar pelo de ministro da Ciência e Tecnologia. E, se assim o fizesse, estaria o partido fazendo um bem à ciência e à tecnologia, dado que a pessoa que ocupa o posto não é muito afeita a inovações.
A presidente Dilma perdeu rapidamente a popularidade desde as eleições. Para resolver o problema, ela quer chamar de novo o marketing. Devia começar a dizer a verdade sobre as contas públicas e o período de dificuldade que enfrentaremos. A fantasia do marketing já fez muito mal ao país durante a campanha eleitoral.
Não será fácil o ano de 2015. Por isso, a presidente deveria convencer a sua base de apoio da necessidade das medidas que está tomando. Ela terá que dizer que o Brasil precisa de um sério ajuste fiscal e que, quando disse que não precisava, era porque o marqueteiro João Santana mandou. Mas, agora, é a hora de olhar o tamanho do rombo nas contas públicas. Se cada proposta for bombardeada, o país terá mais inflação, o que elevará a rejeição ao governo. Se os déficits não foram enfrentados, o país deixará de ser considerado um bom pagador, o que reduzirá a capacidade de se financiar. E isso é um perigo, porque o déficit em conta-corrente está em 4% do PIB.
Rombos fiscais e briga entre Dilma e PT tiram confiança na economia
Com os resultados do primeiro mandato de Dilma, um ajuste nas contas é inadiável. Mas o próprio partido da presidente, que está com a popularidade muito baixa, ataca as medidas do governo pedindo coerência. E, de fato, Dilma passou a campanha negando o ajuste que hoje tenta implantar. O problema maior é que, com ou sem contradições, o ajuste é necessário. A discórdia tem feito o medo em relação ao Brasil aumentar.
A direção do PT pede que a presidente seja coerente com sua promessa de campanha de não mexer nos direitos de trabalhadores. A falta de coerência estaria em duas propostas que mudarão as regras no futuro.
Para iniciar o ajuste fiscal, o governo propôs ampliar o período mínimo de contribuição necessário para o trabalhador ter acesso ao seguro-desemprego, e o fim da pensão vitalícia para viúvas e viúvos jovens. São propostas suaves, não retroativas, para evitar absurdos como a explosão de pagamentos do seguro no período em que o desemprego diminuiu, ou as 1.609 pensões vitalícias concedidas em 2014 para menores de 20 anos que perderam seus cônjuges.
A estratégia é evitar os casos de empregados que contribuem por apenas seis meses, entram em acordo para serem demitidos e passam outros seis meses recebendo o seguro. Para o viúvo receber a pensão vitalícia, basta que o cônjuge tenha contribuído com o teto da Previdência por um mês, algo que nenhum outro país permite. A proposta prevê que a pensão para jovens (até 43 anos), em plena idade produtiva, passe a ter prazo e que o tempo de contribuição do empregado aumente.
É importante fazer o equilíbrio da Previdência, cuja conta fica mais pesada a cada ano, com o envelhecimento da população.
Quem já recebe está imune e quem precisar desses benefícios no futuro não ficará desamparado, porque eles não foram abolidos. Não há, portanto, rasgação de direitos trabalhistas ou previdenciários.
O país precisa de ajustes. Quem conviveu com a hiperinflação sabe o perigo enorme da receita do primeiro governo Dilma: déficit nominal de quase 7% do PIB, mais o déficit externo de 4% do PIB com a dívida bruta saindo de 53% para 63% do PIB. As contas estão desajustadas.
O dólar sobe em relação ao real nos últimos dias impulsionado por essa desarrumação. Nos últimos 10 dias, a moeda brasileira se desvalorizou quase 10%, enquanto outras divisas chegaram a se valorizar, como o rublo da Rússia.
Outro indicador da degradação das contas públicas brasileiras é o custo do CDS, o seguro contra calote. O investidor compra esses títulos para se defender de maus pagadores. Mesmo com a certeza de que o país pagará suas dívidas, o custo do CDS brasileiro acompanhou a desconfiança com o cenário econômico e subiu 16% desde o início de 2015.
Há um medo maior em relação ao Brasil porque o governo, enfraquecido, é pressionado até pelo seu próprio partido a recuar de medidas tímidas de ajuste fiscal, que serviriam apenas para iniciar o ajuste. É necessário muito mais, mas a base do governo parece não ter noção do perigo fiscal que o país enfrenta hoje.
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