Por
Humberto Pinho da Silva
Um belo dia bateu à porta o
carteiro. Era portador de carta registada. A Ilda, a empregada, que era tratada
como se da família fosse, correu a recebe-la.
Tratava-se de aviso da Câmara
Municipal, intimando meu pai a destruir prédio barroco, que ameaçava desabar,
sob a ameaça do Município fazê-lo, imputando o custo ao proprietário.
Afligiu-se grandemente:
realizar a demolição era dispendioso e não tinha possibilidade, a não ser que
empenhasse a casa onde vivia. Deixar a Câmara fazer, seria o mesmo.
Não encontrou outro remédio se
não consultar advogado, suplicando - quase de mãos postas, - que encontrasse
solução para o intrincado problema.
Aconselhou o jurista que
escrevesse carta à edilidade, narrando a situação, recordando que se tratava de
bela casa barroca, património que devia ser preservado. Acrescentando que
estava disposto a vendê-la a preço acessível.
Decorridas semanas, recebeu
intimação: davam-lhe apenas três meses para arrasar o prédio. Seguiam as
habituais ameaças, caso não cumprisse a ordem
Tornou a escrever, requerendo
tempo para vender a casa. A resposta foi sóbria e ríspida: só tinha três meses:
nada mais!
Por essa época andava enfermo,
vítima de doença que havia de o levar à morte. O resultado dessa troca de
correspondência, foi agravar-lhe o mal, a ponto do médico recear morte
repentina.
Certo é, que posto à venda, a
preço de saldo, apareceu advogado, que regateando a quantia, adquiriu o prédio
por tuta-e meia.
Agravada a doença, meu pai
faleceu. Feito partilhas, decorreram anos que não transitei pela parte
histórica da cidade
Certa vez, por curiosidade, não
tendo itinerário, passei pela velha casa barroca, e, para meu espanto,
encontrei-a restaurada, brilhando como nova.
Avizinhei-me e verifiquei que
havia placa de bronze, indicando: “Propriedade Municipal”
Entrei numa mereceria, meio
tasco, e interroguei mulher que servia de mangas arregaçadas, vinho a copo.
Fiquei a saber que pouco depois
da morte de meu pai, o prédio foi adquirido pela Câmara Municipal, por ser casa
de valor histórico.
Lição da história: leiras ao
luar e casas barrocas, valem consoante o proprietário.
Na mão de meu pai, nada valia e
deveria ser demolida em três meses, sendo um belo exemplar da arquitetura
barroca; na posse do jurista, o Município, para não a destruir, pagou, por
certo, bom preço.
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