Um casal de surdos entrou na Justiça contra o Cineart Multiplex porque não encontrou o filme “Shrek” legendado no cinema do Shopping Cidade, em Belo Horizonte. Os dois alegaram no processo que foram comemorar o aniversário de namoro, em 2010, mas no dia e no horário escolhidos por eles não havia nenhuma sessão legendada do filme.
O juiz Fabrício Simão da Cunha Araújo, do Juizado Especial das Relações de Consumo, condenou a empresa a pagar R$ 10 mil como dano moral à deficiente auditiva e outros R$ 10 mil como parcela pedagógica. O último valor será destinado à Creche Agostinho Cândido de Souza, que fica na capital mineira.
Os dois autores ajuizaram ações separadas, sendo que no caso do deficiente, um juiz julgou improcedente o dano moral, em 2011. Este mês, Cunha Araújo teve um entendimento diferente e condenou o Cineart dando à mulher o direito de indenização. A empresa informou que irá recorrer da decisão, que é de primeira instância.
No processo, a surda juntou a grade exibições da Cineart e fotos dos filmes em cartaz na data em que compareceu ao cinema, comprovando que não havia sessão legendada para o filme escolhido.
Ela e o namorado fizeram um boletim de ocorrência em uma delegacia no dia do ocorrido. O Cineart afirma que havia uma sessão legendada à noite, mas o casal escolheu ir ao cinema à tarde, quando não encontrou o filme do jeito que gostariam.
A empresa de cinema contestou o pedido de indenização alegando que a jovem não provou os danos materiais e morais sofridos. De acordo com o advogado do Cineart, Erasmo Cabral, a ausência do filme com legenda não tem relação com a deficiência do casal, é apenas uma questão de oferta.
Ele explica que havia informações suficientes sobre as sessões, por isso os deficientes não foram enganados. De acordo com o advogado, não está previsto em lei que deve haver sessão legendada em todos horários, dias e salas. O Cineart tentou conciliação oferecendo ingresso em outras sessões para o casal, mas não conseguiu impedir o andamento da ação.
Decisão
O juiz Cunha Araújo argumentou na decisão que é dever das empresas disponibilizar, ainda que em quantidade mínima, salas e filmes legendados, para assegurar o acesso efetivo da totalidade das pessoas, especialmente dos deficientes auditivos. Ele ressaltou que a inexistência de regulamentação específica quanto ao percentual mínimo de filmes legendados não impede a proteção do direito.
O magistrado citou a Constituição e a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência para justificar que "o portador de deficiência auditiva tem direito de acesso à cultura e ao lazer, devendo tal acesso ser interpretado, no que tange à cultura cinematográfica, não só como acesso físico às salas de exibição, mas também como direito de compreensão linguística das interações culturais que ali se realizarem”.
Para o juiz, a surda sofreu com o sentimento de discriminação e descaso. “Bastava ter um pouco mais de atenção, respeito e solidariedade ao consumidor”, disse. Assim, o magistrado fixou indenização.
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