O relator Joaquim Barbosa e o revisor Ricardo Lewandowski não discordaram apenas sobre as condenações dos réus petistas mais importantes do processo do mensalão. Os dois tiveram uma visão diferente, segundo levantamento feito pelo GLOBO, de 46% das decisões que trataram sobre a prática ou não de um determinado crime pelos acusados. As absolvições proferidas nos votos de Lewandowski referentes a José Dirceu - por corrupção ativa -, a José Genoino - por corrupção ativa - e a João Paulo Cunha - por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato -, por exemplo, representam apenas 5 discordâncias entre as 33 ocorridas até aqui. Ao todo, relator e revisor tomaram 71 decisões cada um.
Esse número pode ser ilustrado pelo confronto verbal entre os dois em várias das 35 sessões já realizadas pelo Supremo. Para a advogada e professora de Direito da FGV Rio, Tânia Rangel, a divergência é saudável, e mostra o funcionamento do Direito.
"No Direito, essa discordância é prevista. A grande questão é que o mesmo fato pode dar diversas interpretações. Faz parte do jogo. E, quando vemos isso, vemos o Direito funcionando. Se olharmos para o caso de José Dirceu, por exemplo, observamos que a valoração dos fatos, no caso de Barbosa e Lewandowski, é diferente", diz ela, lembrando a importância dada por Joaquim Barbosa à fala de Roberto Jefferson, réu sem credibilidade para Lewandowski.
Apesar de Joaquim Barbsoa já ter sugerido que Lewandowski fez “vista grossa” diante dos autos, na maioria dos casos, 54% deles, houve concordância. Este fato, junto com o entendimento dos demais ministros, mostra que, em 50 mil páginas, contidas em 233 volumes e 495 apensos, há provas suficientes para incriminar boa parte dos réus. A maioria dos advogados de defesa não conseguiu convencer os ministros de que seus clientes são inocentes. Relator e revisor condenaram, juntos, Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, atestando a existência de dinheiro público no valerioduto; Delúbio Soares, o tesoureiro do partido, indicando sua participação no pagamento a parlamentares; deputados da base aliada por corrupção passiva, como Valdemar da Costa Neto; e os banqueiros Kátia Rabello e José Roberto Salgado por gestão fraudulenta, comprovando os empréstimos simulados às agências de Marcos Valério.
O publicitário, aliás, também foi condenado por ambos, mas com algumas ressalvas. Sobre as acusações de corrupção ativa, eles dicordaram: Levandowski condenou-o pelo crime duas vezes, enquanto Barbosa condenou-o por três vezes. Da mesma forma, os crimes de peculato: três condenações em relação ao crime pelo relator, e apenas duas pelo revisor.
Esses dois casos de discordância não anulam a grande desenvolvoltura constatada pela Corte em relação ao réu, como esclareceu o presidente Carlos Ayres Britto, na 30ª sessão:
- Marcos Valério esteve por oito vezes com dirigentes do Banco Central, simulou empréstimos para suas quatro empresas de publicidade e mediou contatos profissionais com o Banco de Minas Gerais, Banco Mercantil, Telemig, Bônus Banval, Natimar, assim como esteve pessoal e reiteradamente com a mais alta cúpula do Partido dos Trabalhadores.
Lewandowski discordou de Barbosa com mais frequência quando se deparou com as condenações por lavagem de dinheiro. Pelos votos, pode-se perceber que ambos têm interpretações diferentes sobre a aplicação lei. Lewandowski tem a mesma interpretação de Marco Aurélio e de Cézar Peluso, segundo a qual a ocultação do dinheiro oriundo da corrupção é característica inerente ao crime de corrupção, e não pode ser usada também para caracterizar a lavagem de dinheiro.
Ao todo, foram 16 casos de discordância sobre lavagem de dinheiro. Rogério Tolentino, Geiza Dias, Vinicius Samarane, João Paulo Cunha, Pedro Corrêa, Pedro Henry, João Claudio Genu, Breno Fischberg, Bispo Rodrigues, Roberto Jefferson, Emerson Palmiere, Romeu Queiroz, José Borba, Paulo Rocha, João Magno e Anderson Adauto, todos condenados pela prática do crime por Barbosa, foram absolvidos por Lewandowski.
Sobre outras condenações de alguns desses réus dadas por Barbosa, Lewandowski também bateu de frente: absolveu também João Paulo Cunha por corrupção passiva e dois peculatos; Breno Fischberg por formação de quadrilha; Vinicius Samarane por gestão fraudulenta; Rogério Tolentino por corrupção ativa; e Pedro Henry por corrupção passiva e formação de quadrilha.
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