Desde o início de 2016 tem sido cogitado o adiamento dos Jogos Olímpicos de 2016, em decorrência da dimensão assumida pela epidemia de zika na cidade sede do evento. Até o início de maio foram confirmados quase 50 mil casos no país, com uma das maiores incidências acontecendo no Rio de Janeiro. Por apresentar um quadro clínico mais leve que a dengue e a chikungunya e raríssimas mortes, a preocupação com a zika tem se centrado nos casos de microcefalia, decorrentes da infecção pelo vírus durante a gestação.
Até o início de maio foram confirmados quase 3 mil casos de zika em gestantes, passando de mil os recém nascidos com microcefalia. Mas como o Brasil nunca teve estatísticas dessa malformação, não é possível saber quantos desses nascimentos foram decorrentes da infecção pelo vírus.
O certo é que a ciência hoje acumula mais dúvidas que certezas a respeito do zika vírus. Algumas delas dizem respeito a aspectos básicos, como o período de reprodução do vírus no mosquito e o tempo de incubação no ser humano; a importância da transmissão sexual na veiculação da doença; e as chances de ocorrência de outras complicações neurológicas além da Síndrome de Guillain-Barré, bem como de malformações congênitas que não a microcefalia.
Apesar de haver registros de casos há décadas principalmente na Oceania, a zika só foi declarada emergência mundial em 2016, quando tornou-se uma epidemia no Brasil e foi confirmada a sua associação com a microcefalia. Até o momento foram registrados casos de microcefalia associada ao vírus em 8 países.
Alguns especialistas, com o apoio da Organização Mundial da Saúde, posicionam-se contra o adiamento dos Jogos Olímpicos, argumentando que, caso o evento seja realizado após agosto, a situação será pior, porquê o mosquito transmissor da doença se reproduz mais rapidamente a partir de outubro, quando o clima torna-se mais quente e úmido. Acreditam que o fluxo de turistas para o Brasil causará pouco impacto na disseminação da doença, já que ela está presente em 60 países e atualmente 20% da população mundial vive em áreas afetadas pela zika.
Do outro lado, estão os que defendem o adiamento dos jogos, lembrando que ainda sabemos muito pouco sobre a doença. Para eles é possível que a cepa do vírus que ocorre no Brasil seja uma variante mais grave que a encontrada no restante do mundo. A entrada dos 500 mil visitantes estrangeiros esperados no evento poderá favorecer a disseminação dessa cepa viral pelo hemisfério norte, onde se esperam surtos de zika a partir do verão e primavera de 2016. Acreditam, também, que é temerário contar com a proteção contra o Aedes aegypti representada pelo frio e secura do inverno do Rio de Janeiro. Pode haver imprevistos em relação à previsão do tempo para os próximos meses e, o calor e a chuva adiantando-se, os casos se multiplicariam durante as Olimpíadas.
O ponto em comum entre os dois grupos de especialistas diz respeito às mulheres grávidas: elas não devem vir ao Rio de Janeiro durante a Olimpíada!
O certo é que as medidas governamentais tomadas para conter o Aedes aegypti, mosquito vetor da zika, dengue e chikungunya, tem sido pouco eficazes em todo o país, mas suficientes para limitar os casos dessas doenças durante os Jogos Olímpicos. A aplicação de veneno para matar os mosquitos adultos tem sido regular e estão previstas até duas aplicações diárias nas instalações olímpicas. É uma medida eficaz, mas de curta duração, pois atua apenas sobre os mosquitos adultos, sem alterar a sua dinâmica da reprodução, que requer a eliminação dos criadouros. Também estão previstas campanhas educativas orientando o uso de vestimentas que cubram uma maior superfície do corpo, bem como a aplicação de repelentes nas áreas descobertas. Não está descartada a distribuição gratuita de preservativos, para reduzir a chance da propagação sexual da zika.
Autoridades da Organização Mundial da Saúde tem tranquilizado a população mundial quanto ao risco da zika para os que vierem ao Brasil durante os jogos. O certo é que as Olimpíadas ocorrerão durante o inverno e nessa época a natureza dá conta do que a imprudência e a falta de iniciativas regulares das autoridades sanitárias não deram conta; o Aedes estará controlado.
O certo também é que, passados as Olimpíadas e retornando o tempo das chuvas e do calor, a partir de outubro, a população do Rio de Janeiro voltará a enfrentar os mosquitos e, com eles, as três pestes por eles transmitidas, zika, dengue e chikungunya. As epidemias de 2017 são geradas na ausência de medidas consistentes de combate à doença no inverno de 2016.
Rodolpho Telarolli Jr. é médico, doutor em Saúde Coletiva e professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Unesp em Araraquara.
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