Por
Humberto Pinho da Silva
Nem sempre o anexim é exacto,
quantas vezes, por muito trabucar, é que nunca se passa, como diz o povo: da
cepa torta.
Convivi, nos meus tempos
liceais, com filho de modesto lavrador, que em menino, todos os dias - fizesse
sol ou chuva, - acompanhava os irmãos, nas tarefas campestres.
Enquanto rasgavam sucos na
terra parda, para a água irrigar a viçosa horta, o preguiçoso, permanecia,
cantarolando, de papo para o ar, apanhando sol ou jogando pedrinhas.
Bem lhe ralhava, o pai,
ameaçando-o com severos castigos, e não poucas vezes, pedia auxilio à sibata e
ao cinto de celeiro, na esperança que fossem milagreiros.
Desesperado, após confidenciar
com a mulher, assentou enviá-lo para a cidade, como marçano, na lojinha do
primo.
Poucos dias decorreram, quando
recebeu carta, dizendo que o mocinho era desobediente e nada queria fazer.
Lembraram-se, a conselho do Sr.
Abade, matricula-lo no liceu. Ao interrogá-lo, respondeu: que sim, se não
houvesse a palmatória, que tanto trabalhara na “primária”.
Preguiçando, estudando em cima
dos exames, copiando e colando aqui e ali, completou o curso.
Tornou-se abastado advogado,
enquanto os irmãos, por serem trabalhadores, terminaram a velhice a labutar a
terra, como modestíssimos agricultores.
Outro assunto; mesmo tema:
Nos anos cinquenta, meu pai,
conheceu religiosa, muito risonha, de olhinhos vivos e gaiatos, que
cavaqueando, confidenciou-lhe:
- “ Fui mulher de limpeza num
hospital dirigido pelas Irmãs Hospitaleiras. Diziam-me: “ Altina, limpe aqui!
Altina, precisa de ter mais cuidado! Os médicos eram mais duros: “ Altina,
parece que tem ovos debaixo dos braços! Altina, quer que me queixe à madre
superiora!? Agora, que sou freira, tratam-me carinhosamente por irmã, e até o
Sr. director, beija-me respeitosamente, a mão!”
Outra história, não menos
curiosa:
Décadas a traz, havia em terras
transmontanas, freira que passava as férias na aldeia natal. Ao perguntarem-lhe
se gostava da vida religiosa, prontamente respondia, muito espevitada:
- “Aqui na aldeia tinha que
levantar-me de madrugada para apanhar azeitona, em pleno Inverno. Mondava até
quebrar a espinha e ceifava até o suor cair em bica. Agora tenho criadas para
os serviços pesados…”
Mais outra, não menos
interessante:
Com a chegada da democracia a
Portugal, chegaram pastores evangélicos, com mulher e filhos.
Quase todos levavam vida
folgada. Os crentes murmuravam, em surdina, que auferiam salários principescos.
Jovens, constatando que era
menos penoso ser pastor do que padre, tiveram súbitas “ conversões” e
“vocações”, na esperança de vida melhor, do que lavrar terra e trabalhar na
oficina.
Pobre diabo – salvo seja! - de
S. Mamede Infestas, que percorreu seis denominações e terminara em pequeníssima
garagem, com meia dúzia de fieis, lamentava-se, com pontinha de inveja, que
cozinheiro afortunado, tornou-se pastor e ganhava seis contos mensais! - e com
largo gesto desanimador, rematou: limpinhos! …limpinhos! …
Com isto termino, dizendo,
embora pareça paradoxo, que quem muito se afadiga, nem sempre tem sorte, já que
esta permeia, quantas vezes, quem não gosta de trabucar.
Bem diz o nosso povo: ninguém
chega a rico, trabalhando..
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