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segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

'Caixa' de assessores para políticos é prática condenável, mas amplamente utilizada

por Fernando Duarte
Flávio, Lúcio e Roberto Carlos | Foto: Montagem/ Bahia Notícias
As denúncias de que ex-assessores do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) alimentariam uma espécie de “caixa obscuro” por meio de um homem de confiança da família ecoam na imprensa, porém não reverberam com a mesma frequência no meio político. Mesmo os adversários do clã evitam tratar diretamente do eventual repasse de parte dos salários de cargos de confiança por um motivo simples: boa parte da classe política faz uso do artifício e o telhado de vidro impede que sejam arremessadas pedras.

As lendas sobre situações similares são repetidas exaustivamente por quem acompanha o dia a dia da política. Porém poucas são as vezes que os casos ganham repercussão judicial. Em um passado recente, a família Vieira Lima foi alvo de uma denúncia da Procuradoria-Geral da República por peculato, por se apropriar de recursos de assessores desde o final da década de 1980, quando o patriarca Afrísio Vieira Lima ainda era deputado federal. Ou seja, há pelo menos 30 anos existe registro de que a prática de recolher “doações” de funcionários faz parte da rotina de agentes políticos no Brasil.

Na Bahia, uma operação da Polícia Federal, há seis anos, também investigou eventuais irregularidades comandadas por deputados estaduais. Conhecida como “Operação Detalhes”, o principal alvo da investigação foi o deputado estadual Roberto Carlos (PDT), porém outros 16 integrantes da Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA) foram citados nas apurações. O caso, que tramitou durante muito tempo em segredo de justiça, gira em torno da rubrica “crimes contra a ordem tributária” e até o momento nenhum dos envolvidos foi punido. Nesse caso, percebe-se que, para além do corporativismo parlamentar, há certa anuência do Judiciário...

Muitos parlamentares não enxergam problema em receber “de volta” parte dos salários de assessores. Às vezes, o mecanismo funciona como o explicitado nas investigações envolvendo Flávio Bolsonaro, quando o recurso era sacado e depositado na conta de um único funcionário – geralmente de confiança. Em outras situações, doações eleitorais registradas, “esquentando” o recurso, aparecem como uma forma de legalizar a transferência de valores para os “padrinhos” de indicação para os cargos.

Logicamente, nenhum dos indicados impelidos a fazer as doações – de maneira obscura ou de maneira legal – vê problema no repasse de parte do salário para os detentores de mandato – e das “canetas” que geram cargos. É um jogo de interesses que torna um esquema simples em uma estratégia sofisticada de financiamento de projetos políticos e enriquecimento de “representantes do povo”. Ao invés de meros apadrinhados, esses assessores se tornam cúmplices, o que dificulta que as pontas dos novelos fiquem à mostra.

Os casos dos Bolsonaro, dos Vieira Lima e também dos deputados estaduais da Bahia mostram que existe um problema sistêmico e que se retroalimenta, reduzindo as chances de novos atores aparecerem. A corrupção parece tão impregnada na máquina pública que o desafio não é meramente mudar a política. É formatar o sistema e tentar começar do zero uma nova lógica de construção do Estado. Pena que os principais agentes desse processo não parecem estar dispostos a fazê-lo.

Este texto integra o comentário desta segunda-feira (17) para a RBN Digital, veiculado às 7h e às 12h30, e para as rádios Excelsior, Irecê Líder FM, Clube FM e RB FM.

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