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quarta-feira, 19 de junho de 2013

Uma criança morre de fome a cada dez segundos?


O uso de um chamativo slogan em uma campanha de ONGs na Grã-Bretanha para destacar a gravidade da situação vivida por crianças com desnutrição %u2500 o de que uma criança morre de fome a cada dez segundos %u2500 gerou críticas por parte do próprio Programa de Alimentação da ONU (WFP, na sigla em inglês).
O slogan foi adotado pela campanha Enough Food for Everyone If no dia 6 de junho, atualizando outro que vinha sendo usado, o de uma morte a cada 15 segundos. A campanha visa pressionar os líderes do G8, que estão reunidos na Irlanda do Norte, a adotar medidas para combater o problema.
A organização diz que o slogan ajuda as pessoas entenderem o problema e o "humanizam". Por sua vez, o WFP, órgão que procura justamente combater a fome no mundo, argumenta que os números podem ser enganadores e podem causar confusão.
Mas qual é a verdade por trás do slogan? E será que o debate se justifica?

Frase 'acessível'
Estatísticas a respeito de mortes causadas pela fome em curtos períodos de tempo são usadas há anos.
Esta última é baseada em uma fonte de respeito, a publicação científica The Lancet, um veículo de fama internacional que, recentemente, publicou um relatório afirmando que mais de 3 milhões de crianças morreram de subnutrição em 2011.
Para conseguir a estatística para o slogan, os responsáveis pela campanha da If dividiram o número de segundos em um ano inteiro pelo total de mortes, três milhões.
E, de acordo com o porta-voz da campanha, Jack Lundie, esta operação aproxima mais as pessoas da questão."Números grandes são difíceis de visualizar, especialmente quando você fala de milhões", afirma.
"Também queremos nos concentrar no indivíduo, e estas expressões ajudam a humanizar o problema."
"Então precisamos de uma frase curta, acessível que, em um período curto de tempo vai transmitir o impacto emocional do problema que estamos tratando, mas também dará um sentido de proporção e urgência que vai precipitar algum tipo de ação", acrescentou.

Mudança de rumo
Para o WFP, por outro lado, "existe uma tentação real de usar este tipo de estatística pois elas realmente conseguem chegar às manchetes, você não pode ignorar isto pois é uma imagem horrível", disse Jane Howard, representante do WFP.
Mas, de acordo com ela, estes números são um pouco "enganadores".
O próprio WFP costumava alegar que uma crianças morria de fome a cada seis segundos, mas parou de usar esta frase por volta de 2008.
Os números podem mudar de ano para ano, de acordo com Howard, tudo depende da pesquisa mais recente, e "fica muito confuso, pois os números antigos acabam ficando na internet".
E, mais importante, de acordo com a representante do WFP, "a ciência está dizendo algo muito diferente, na verdade".
"Com certeza existem circunstâncias extremas, nas quais crianças morrem de fome, e lembro da fome recente em algumas partes da Somália. 
Mas a verdade é que a grande maioria daqueles números sobre os quuais estamos falando se referem a crianças que, por não terem tido a nutrição correta no começo da vida, são muito, muito suscetíveis a doenças infecciosas, como sarampo", afirmou Howard.
"Uma criança que teve uma boa nutrição simplesmente vai superar (as doenças), mas, no caso de uma criança muito frágil e com um sistema imunológico comprometido, (a doença) ameaçará sua vida", acrescentou.
E o fato de uma nutrição deficiente ser identificada como causa subjacente de morte significa que também há uma contagem dupla. Quando se ouve que uma criança morre a cada poucos segundos devido a doenças relacionadas à água não tratada ou devido à pobreza, por exemplo, algumas destas crianças vão ser as mesmas que estariam morrendo a cada poucos segundos de fome.

Complexidade
A maioria das mortes relacionadas a problemas de nutrição ocorrem em países que não estão sofrendo com conflitos ou fome, segundo o professor Robert Black, da Escola de Saúde Pública Johns Hopkins Bloomberg, nos Estados Unidos.
"Estes não são os países mais pobres do mundo. São países como a Índia ou a Nigéria ou muitos outros países na Ásia ou África que realmente poderiam se sair melhor, que têm os recursos para alimentar as crianças", afirmou.
"Certamente os mais pobres têm os maiores problemas com subnutrição, mas mesmo assim há comida o suficiente para alimentar as crianças. 
A dificuldade é alcançar uma dieta de qualidade, uma dieta que é dominada por cereais ou amido não será uma dieta com a qualidade necessária para os dois primeiros anos de vida", disse.
Foi Black que calculou que 3 milhões de crianças morreram em decorrência da subnutrição em 2011, divulgando o número na The Lancet. Ele afirma que, na maioria dos casos, o problema pode ser resolvido por meio da educação.
Por exemplo, ele explica que um quarto das mortes pode ser atribuido a uma amamentação não adequada, com muitas famílias não percebendo que até os seis meses de idade os bebês precisam exclusivamente de leite materno, e esta alimentação os protege de comida contaminada.
Então, tudo indica que os fatos são mais complicados do que o slogan. Mas, de acordo com Jack Lundie, porta-voz da If, é preciso simplificar para conseguir a atenção das pessoas.
Lundie admite que pode ser que as pessoas não consigam toda a informação sobre o problema com o slogan mais chamativo das mortes em poucos segundos, mas ele não acredita que "seria realista" esperar algo assim apenas com um slogan.
"Em termos que criar uma conversa na qual as pessoas podem ser informadas, você primeiro precisa conseguir a atenção delas, a atenção emocional. As pessoas são muito ocupadas então você precisa uma compreensão instantânea para iniciar uma conversa", disse.
A subnutrição é um problema grave, e as 3 milhões de crianças que teriam morrido por esta causa em 2011 representam quase metade de todas as mortes infantis. Mas há sinais de avanços.
"Há uma queda no número excessivo de mortes, não muito grande, mas é um avanço desde a última vez que estudamos isto (em 2008), e a atenção dada a estas questões de nutrição em países de baixa renda e de renda média, realmente aumentou muito nos últimos cinco anos", disse Black.

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