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terça-feira, 23 de outubro de 2012

NARRAR FUTEBOL NO RÁDIO

por Edemar Annuseck*
Marca registrada
“O relógio marca”..., abrem-se as cortinas começa o espetáculo, ripa na chulipa, pimba na gorduchinha, bola no barbante de Ado, respeitável público, tremulando, tremulando, tremulando as bandeiras, dez é a camisa dele, indivíduo competente o Zico, passa de passagem, Placar na Suécia, um a zero, o Brasil vence.
Frases famosas criadas por Waldir Amaral, Fiori Giglioti, Osmar Santos, Willy Gonser, Geraldo José de Almeida, Jorge Curi, Edson Leite, nos últimos cinquenta anos.
Elas identificavam os narradores por décadas, no rádio esportivo brasileiro. Era gostoso ouvir Waldir Amaral falar após cada gol: “tem peixe na rede do Vasco”, ou “o relógio marca”.
Jorge Curi com seu vozeirão anunciando o placar do jogo “no P. E (placar eletrônico) do Maraca” ou “passa de passagem”.
Willy Gonser com o seu “tem bola no barbante de Ado”. Osmar Santos gritando “chiruliruli-chirulirulá”.
Oswaldo Moreira, da Tupi do Rio falando “respeitável público”. Fiori Giglioti quando ao apito do árbitro: “abrem-se as cortinas e começa o espetáculo”. Eram marcas registradas desses grandes narradores.
Como surgia
Muitos profissionais contratavam publicitários, tinham colaboradores e amigos, para criar frases. Lembro-me de Antônio Garini, editor-chefe do Jornal da Manhã da Jovem Pan, grande incentivador de Osmar Santos, sempre tinha sugestões. César, jogador do Palmeiras e Estevam Sangirardi também colaboravam. As frases de efeito deram impulso à carreira de Osmar Santos, interrompida na noite de 22 de Dezembro de 1994.
De 1973 a 1977 eu dividia as transmissões esportivas da Jovem Pan com o Osmar.
No início da carreira, Osmar, espelhou-se em consagrados profissionais como Pedro Luís, Edson Leite, Geraldo José de Almeida, Fiori Giglioti, Haroldo Fernandes, Joseval Peixoto e outros. Aos poucos foi criando seu próprio estilo. Infelizmente Osmar Santos já não pode mais ser ouvido nas narrações esportivas.
Carbonos
Mas o Brasil recheou-se de “cópias” de Osmar Santos; suas frases e seu estilo de narrar futebol foram copiados pelos quatro cantos do país. Também Fiori Giglioti é xerocado por dezenas de locutores brasileiros. E antes de Osmar e Fiori, o extraordinário Pedro Luís. Lá por 1973 quando o Pedro Luís começou a ter problemas com a voz, aparecia Marco Antônio Matos, seu espelho, cópia fiel do grande mestre. Pedro teve outros seguidores como Mário Garcia, Wanderlei Ribeiro, Hamilton Galhano no rádio de São Paulo.
Nos estados em que se ouve o futebol do Rio, José Carlos Araújo tem clones e mais clones. O rádio esportivo brasileiro sempre teve muitas cópias; não é grande o número de narradores de ponta, com estilo próprio.
Criatividade
A narração esportiva brasileira pode ser analisada por regiões. No sul, o futebol da Guaíba foi reconhecido a partir da Copa de 1966 na Inglaterra pelo som e transmissões emocionantes de Pedro Carneiro Pereira e Mendes Ribeiro. Depois da morte de Pedro Carneiro Pereira em numa prova de automobilismo (*) no Autódromo de Tarumã em 1973 em Porto Alegre, Armindo Antônio Ranzolin tomou o comando do futebol. No Rio Grande do Sul surgiram muitas cópias de Pedro Carneiro Pereira, Mendes Ribeiro e Armindo Antônio Ranzolin. Aliás, 
(*) Pedro Carneiro Pereira além de extraordinário narrador tinha como grande paixão o automobilismo de competição. Pedro participou de muitas competições até que veio a falecer quando participava de uma prova. 
Haroldo de Souza contratado em 1973 pela Gaúcha inovou no rádio dos pampas misturando o estilo gaúcho com a modernidade de Osmar Santos. No Paraná depois de Willy Gonser e Airton Cordeiro, surgiu Himer Lombardi que virou Lombardi Junior. Esteve conosco durante alguns meses em 1974, na Jovem Pan. Em Curitiba tornou-se o grande nome do rádio esportivo de 1975 a 1994, quando veio a falecer. Inovou utilizando frases e vinhetas da Jovem Pan.
O estilo das transmissões dos grandes narradores paulistanos de outrora se espalharam pelo interior do estado e norte do Paraná. O carioca invadiu Brasília, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, Alagoas, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Manaus e outros estados do norte e nordeste.
Um detalhe interessante; 90% dos narradores esportivos das grandes rádios de São Paulo vieram do interior ou de outros estados brasileiros para se consagrar na maior cidade da América do Sul.
Ser narrador esportivo
O narrador esportivo é um “vendedor de ilusões”. Cabe ao narrador esportivo descrever o que ocorre num jogo de futebol, com precisão, e, detalhes. Ao contrário dos locutores esportivos que estão mais preocupados com vinhetas, abraços, piadas, reverberações exageradas, pornografia e poesias.
Sou fã dos narradores que me fazem “ver o jogo” sem estar no estádio ou na frente da tevê. Narrador esportivo descreve os lances de uma partida de futebol mostrando quem está com a bola, para quem foi passada, qual a posição em que o lance ocorreu, sempre anunciando o placar e o tempo de jogo. Essa é a função do narrador; as dúvidas ocorridas no desfecho de um lance devem ser esclarecidas pelo repórter colocado atrás do gol ou na lateral do gramado. Ao comentarista cabe comentar o jogo. Hoje poucos descrevem o jogo; preferem interferir na seara do comentarista, dando sua opinião e esquecendo-se de narrar. Alguns pela rapidez que querem dar a transmissão engolem palavras; outros narram na base do - cruzou o zagueiro, cortou o zagueiro, defendeu o goleirão. Quem cruzou. De onde cruzou. Para onde cruzou. Quem cortou. Como é o nome do goleiro. Não dá nome aos atletas. Algumas transmissões são completamente lineares; cobrança do tiro de meta e jogada que se estende até a linha intermediária (entre meio de campo e grande área adversária) deve ser narrado com um tom mais coloquial; um chute a gol ou jogadas que se sucedem dentro das áreas devem conter a vibração que o futebol exige. Hoje em cada 10 narradores, cinco gritam aos quatro ventos: “pro gooooollllll... para fora”. É uma forma de aumentar a emoção de uma jogada de ataque. Porém 95% desses lances não resultam em absolutamente nada. Pura enganação. E você ainda ouve os surrados - a bola passa raspando a trave, tirando tinta do poste – (a tevê mostra que passou dois metros do poste), ou – balão de couro – (a bola de hoje é fabricada com material sintético e balão é outra coisa), ou ainda – um escanteio de mangas curtas -. E tem aquela do – estamos no intervalo do primeiro para o segundo tempo -. Um jogo de futebol tem apenas um intervalo, logo...
Um pedido 
Completei em Abril deste ano (2012) 48 anos no jornalismo esportivo; não quero com este comentário ensinar a ninguém o “pai nosso”, mas, gostaria que os jovens, os que estão ingressando nesta profissão levem isso como uma colaboração de quem também cometeu muitos erros. Escrevo a título de colaboração para que os futuros narradores sejam realmente narradores, que o rádio seja sério, moderno, informativo, prestador de serviço, feito com muito amor, sem palavrões e pornografia. O rádio precisa resgatar qualidade e dignidade, que muitos jogaram na lata de lixo. Chega de baixaria, chega de terceirização, chega de incompetência. O rádio precisa dar um basta a tudo isso.
A falta de qualidade do rádio de hoje contribui decisivamente para a queda de sua audiência e por extensão diminuição das verbas publicitárias. Que se dê qualidade ao rádio esportivo e tenham a certeza que a audiência voltará a crescer e as verbas publicitárias voltarão naturalmente.
Falecidos
Este artigo serve para lembrar e homenagear aqueles que já nos deixaram e marcaram época no rádio esportivo brasileiro como Pedro Luís, Edson Leite, Fiori Giglioti, Geraldo José de Almeida, Raul Tabajara, Waldir Amaral, Jorge Curi, Doalcei Bueno de Camargo, Clóvis Filho, Oswaldo Moreira, Orlando Batista, Pedro Carneiro Pereira, Mendes Ribeiro, Vilibaldo Alves, Humberto Mendonça, Mário Garcia, José Italiano, Milton Peruzzi, Marco Antônio Matos, Hamilton Galhano, Walter Fonseca, Antônio Rangel, César Bruno, Jairo Anatólio Lima, Jaime Cisneros, Adilson Couto, Lombardi Jr., Machado Neto, Vinícius Coelho, Lauro Soncini, Aldo Pires de Godoy, Rodolfo Sestrem, Lourival Budal e Célio Marinho. 
*Edemar Annuseck é jornalista
Fonte: www.edemarannuseck.blogspot.com.br/

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